Acusado de omissão, o ex-secretário de Segurança Pública do DF e ex-ministro da Justiça Anderson Torres prestou depoimento, nesta terça-feira (8/8), à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) a que investiga a invasão às sedes dos Três Poderes em 8 de janeiro.
A audiência com Torres teve início às 9h24 e acabou por volta das 17h50. Ele foi questionado sobre as acusações de omissão e conivência com os atos supostamente golpistas.
O ex-ministro utilizou a ocasião para se defender sobre a minuta do golpe: “Em 10 de janeiro, durante uma busca e apreensão em minha casa, a polícia encontrou um texto apócrifo, sem data, uma fantasiosa minuta que vai para a coleção de absurdos, que, constantemente, chegam aos detentores de cargos públicos. Vários documentos vinham de diversas fontes para que fossem submetidos ao ministro”, afirmou.
De acordo com Torres, a proposta era uma “aberração jurídica” e “imprestável para qualquer fim”. O ex-secretário de Justiça também negou ter encaminhado o documento para alguma outra autoridade.
Sem protocolo
Questionado sobre os golpistas que ficaram acampados em frente ao QG do Exército, Torres declarou que “nunca houve omissão ou leniência” enquanto era ministro da Justiça sobre. Ele ainda afirmou que sua primeira ação como secretário de Segurança do DF foi tratar do “desmonte” do acampamento.
Anderson Torres também afirmou que, “se o protocolo [PAI] fosse seguido à risca, seríamos poupados dos lamentáveis atos de 8 de janeiro”.
O procedimento ao qual Anderson Torres se refere é o Protocolo de Ações Integradas (PAI), que contempla ações coordenadas de segurança para a manutenção da ordem pública. “O documento previa o fechamento da Esplanada (dos Ministérios). Posso afirmar que houve falha grave na execução do PAI. Se tivessem seguido à risca, os atos não teriam sido consumados”, alegou.
A deputados e senadores Torres alegou, ainda, que não foi alertado sobre os atos antidemocráticos em Brasília. Às vésperas dos ataques às sedes dos Três Poderes, ele viajou para Orlando, nos Estados Unidos, com a família.
“Se eu tivesse recebido qualquer alerta ou informe de inteligência indicando o risco iminente de violência e o vandalismo não teria viajado”, argumentou. Torres embarcou com a família para os Estados Unidos na noite da sexta-feira (6/1) e chegou àquele país na manhã do sábado (7/1).
Segundo o ex-ministro, “nunca questionei o resultado das eleições. Fui o primeiro ministro a receber a equipe de transição, no meu caso, Flávio Dino, que seria meu sucessor. Entreguei relatórios, agi de forma transparente e sempre no sentido de facilitar”.
Neste momento, Torres é questionado pelos membros da CPI, como a senadora Eliziane Gama (PSD-MA), relatora da comissão.
Tornozeleira
Na oitiva, um detalhe chamou a atenção: Torres usa tornozeleira eletrônica, uma das medidas restritivas e cautelares estabelecidas pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), para permitir que o ex-ministro cumpra prisão domiciliar.
Torres foi preso em 14 de janeiro no bojo das investigações sobre possíveis omissões de autoridades durante os atos golpistas ocorridos em Brasília, no dia 8 de janeiro. Ele chefiava a Segurança Pública do DF quando ocorreram as invasões golpistas nas sedes do Congresso, Sumpremo Tribunal Federal (STF) e Palácio do Planalto, mas, na data, estava em viagem de férias aos EUA. Anderson Torres cumpriu a prisão no 4º Batalhão da Polícia Militar, no Guará (DF).
No dia 11 de maio, Moraes concedeu liberdade provisória ao ex-ministro, em decisão tomada após o advogado de defesa de Torres, Eumar Novacki, reiterar o pedido de “revogação da prisão preventiva” ou, “ao menos, substituí-la por uma das cautelares elencadas no art. 319 do CPP ou pela prisão domiciliar”.
A prisão foi substituída por monitoração eletrônica, com proibição de ausentar-se do Distrito Federal; proibição de manter contato com os demais investigados; proibição de usar redes sociais; e afastamento do cargo da Polícia Federal. O descumprimento de qualquer uma das medidas alternativas implicará na revogação da medida e decretação de nova prisão.
“Sextou”
Em depoimento, Torres foi confrotado sobre possível omissão aos atos antidemocráticos ocorridos em Brasília. Dois dias antes dos ataques às sedes dos Três Poderes, o ex-ministro embarcou para Orlando, nos Estados Unidos, com a família.
Confrontado pelo deputado Rogério Correia (PT-MG), ele foi acusado de “sextar”. O parlamentar apresentou um documento encaminhado à SSP-DF em 6/1, quando Torres ainda não tinha saído de férias.
“O documento foi feito pela sua subsecretaria. O senhor vai me dizer se teve ou não conhecimento desse documento. Veja bem: ‘greve geral”. O documento é sigiloso e qualquer membro da CPMI pode ter acesso. No dia 6 de janeiro, esse documento alertava o que o senhor disse que não sabia, e viajou. A minha conclusão é que o senhor não viajou, o senhor sextou e foi embora lá para Orlando em dois dias. O senhor sextou para lá”, disse o petista.
Apoio de aliados
Durante a sessão, a senadora Damares Alves e o deputado Eduardo Bolsonaro demonstraram apoio ao depoente, que classificaram como “herói”.
“O senhor foi um herói enquanto ministro da Justiça. Seria com certeza o melhor secretário de Segurança do Distrito Federal. Que Deus te abençoe. Preciso dizer uma coisa. Não consegui te visitar, você não sabe o quanto foi difícil para mim não poder te visitar. Eu não tinha em você um companheiro, tinha um amigo, um homem comprometido com as crianças”, disse a senadora.
A senadora também fugiu da temática da CPI dos atos golpistas, e elogiou a atuação do ex-secretário de segurança do DF e afirmou que Torres é odiado pelo crime organizado: “Inúmeras crianças e mulheres desse país são gratas ao seu trabalho. Infelizmente vejo o senhor sentado aí, acusado, num lugar de bandidos, acusado de terrorista muitas vezes. (…) O senhor é odiado pelo crime organizado, que incomodou muita gente. (…) Nós faríamos juntos o melhor lugar do mundo para criança nascer, para ser mulher, porque os estupros no DF despencou”, afirmou.
O filho 03 do ex-presidente Jair Bolsonaro também elogiou a postura do depoente e saudou o amigo.
“Primeiro, satisfação de encontrar o amigo, em que pese o delicado momento, mas pode ter certeza de que não são só elogios dos Parlamentares aqui não, o senhor tem total condição de andar de cabeça erguida pela rua, porque certamente não é nenhum bandido, e todo mundo está vendo a injustiça que está sendo feita. Uma coisa é um bandido que sabe a regra do jogo e, quando a polícia pega, ele vai puxar a cadeia dele; outra coisa bem diferente é quando pegam uma pessoa honesta, tacam dentro de uma cadeia, ainda mais nas circunstâncias que foram”, disse.
Mais cedo, o deputado Marco Feliciano (PL-SP) lamentou a postura em que o ex-ministro foi colocado e reforçou a fala de Damares: “Fico constrangido em vê-lo sentado aí, em um banco, como se o senhor fosse um réu, quando, na verdade, depois de ouvir o que o senhor falou e o que a Ministra Damares aqui contou para nós, o senhor é um herói brasileiro, e isso jamais vai sair da mente das pessoas de bem”.
“É constrangedor ver o senhor sentado nessa cadeira. Um dia, se Deus quiser, a história vai agir. E, se não acontecer aqui nesse plano, na eternidade, Deus vai tratar com cada um daqueles que foram cruéis e maldosos com o senhor, com o Brasil e com o nosso futuro. Deus abençoe a todos”, disse.