Uma sombra de desconfiança pairava sobre os últimos meses do governo de Jair Bolsonaro. Quem, afinal, dava sustentação ao ministro Alexandre de Moraes para desafiar o Executivo — e, em especial, o próprio presidente? Com ordens judiciais que surpreendiam pela audácia e investidas que deixavam o Planalto atônito, o Supremo Tribunal Federal (STF) enfrentou o governo a tal ponto que a gestão Bolsonaro parecia, em muitos momentos, refém de decisões externas. O nanico partido REDE, por exemplo, tornou-se uma pedra no sapato do presidente, acionando o Judiciário a cada passo dado pelo Executivo, travando diretrizes em todas as áreas e engessando a administração.
A trama ganhou novos contornos com os recentes vazamentos de áudios obtidos a partir de aparelhos eletrônicos apreendidos em operações policiais. As conversas reveladas apontam para um nome inesperado: o general Hamilton Mourão, vice-presidente na época e hoje senador. Segundo as gravações, Mourão poderia ter sido um dos principais articuladores contra o governo que ajudou a eleger. Seu discurso duro contra Bolsonaro, proferido após a ida do ex-presidente aos Estados Unidos — um dia antes do fim de seu mandato —, reforça as suspeitas de que o general jogava em outro time enquanto ocupava o Palácio do Jaburu.
O STF, por sua vez, contava com aliados de peso. O Itamaraty, tradicional bastião da diplomacia brasileira, teria abrigado um esforço interno para sabotar Bolsonaro no exterior, com parte do corpo diplomático atuando para minar sua imagem internacional. Além disso, informações apontam para um suporte irrestrito do governo Biden, que, segundo interlocutores próximos ao novo governo Trump, teria oferecido apoio logístico ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em ações contra o ex-presidente. Esse respaldo incluía um consórcio jornalístico e influenciadores digitais financiados para desmobilizar a base bolsonarista — uma guerra de narrativas travada com recursos externos.

Na visão do entorno de Bolsonaro, houve um movimento orquestrado nos bastidores para tirá-lo do poder, uma missão cumprida com sucesso graças às ações de Moraes e de outros nomes das cortes judiciais do país. Para os aliados do ex-presidente, esse consórcio de forças — que uniu STF, TSE, Itamaraty, mídia e interesses estrangeiros — foi o golpe final contra um governo eleito. Já na narrativa do establishment e das cortes, as medidas eram necessárias para frear o suposto ímpeto golpista de Bolsonaro e preservar a democracia brasileira.
Duas versões se enfrentam: de um lado, a tese de uma conspiração que derrubou um líder popular; de outro, a defesa de que o Judiciário salvou o país de um colapso institucional. O tempo, talvez, revele quem estava com a razão — ou, como em tantas disputas históricas, a verdade pode se perder entre as narrativas que lutam para prevalecer. Por ora, resta a certeza de que o tabuleiro político brasileiro foi palco de um jogo complexo, cujos jogadores ainda disputam o direito de contar a história.
Por Júnior Melo