O PSOL solicitou ao Supremo Tribunal Federal (STF) a interrupção da lei que criou o programa de escolas cívico-militares em São Paulo, alegando inconstitucionalidade. A petição, protocolada na sexta-feira, 31, argumenta que a lei, sancionada pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), viola a Constituição Federal, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) e os Planos Nacional e Estadual de Educação.
A ação, uma iniciativa do deputado estadual Carlos Giannazi, da deputada federal Luciene Cavalcante e do vereador Celso Giannazi, todos do PSOL de São Paulo, e do coletivo Educação em Primeiro Lugar, busca uma liminar para suspender imediatamente o programa das escolas cívico-militares e a declaração de inconstitucionalidade da lei. Carlos expressou sua expectativa de que o STF conceda a liminar nos próximos dias. Segundo informações do Estadão, ele disse: “Temos a expectativa de que a lei seja derrubada. Seria muito difícil o STF não dar uma liminar”.
O deputado estadual critica o programa por seu caráter doutrinador e domesticador. Ele acredita que o ensino nessas escolas não respeita diferentes visões de mundo e a individualidade dos alunos. “O programa vai doutrinar um exército de pessoas para entrar na extrema-direita”, opinou Giannazi.
Questionada sobre a ação de inconstitucionalidade, a Secretaria da Educação defendeu que o programa foi elaborado a partir de proposições de grupos de trabalho e estudos técnicos conjuntos das Secretarias de Estado da Educação e da Segurança Pública. A pasta afirma que o modelo de ensino segue os princípios da LDB e dos Planos Nacional e Estadual de Educação.
A Secretaria da Educação reiterou que o modelo não será imposto e que uma consulta pública definirá a implantação de toda escola cívico-militar a ser estabelecida no Estado de São Paulo.
A lei que institui as escolas cívico-militares no Estado foi aprovada na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) no dia 21, apesar de protestos de estudantes. O governo espera implementar entre 50 e 100 escolas no novo modelo em 2025. O programa direciona ao menos um policial militar da reserva para cada escola selecionada, com prioridade para unidades com rendimento inferior à média e em situação de vulnerabilidade social.
A responsabilidade das escolas no novo modelo é compartilhada entre as Secretarias da Educação e da Segurança Pública. A adoção desse tipo de escola deve ser aprovada por consultas públicas à comunidade escolar.
As escolas seguem um modelo implementado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que foi revogado na gestão Lula. A Secretaria da Educação paulista afirma que o objetivo do programa é o desenvolvimento de um ambiente escolar que promova avanço no processo de ensino-aprendizagem, a gestão de excelência dos processos educacionais, pedagógicos e administrativos e o fortalecimento de valores humanos e cívicos.
No entanto, especialistas em educação e segurança pública questionam a eficiência dessa nova abordagem no desempenho acadêmico. Outro alvo de críticas é o salário dos monitores militares, cujo piso é maior que o dos professores. O orçamento para a remuneração dos monitores é de R$ 7,2 milhões por ano, provenientes dos recursos da Secretaria de Educação.
A ação enviada ao STF afirma que a lei que institui as escolas cívico-militares usurpa a competência privativa da União para legislar sobre educação. O artigo 22 da Constituição Federal afirma que apenas o governo federal pode legislar sobre as diretrizes da educação nacional. Para os autores da petição, a lei paulista não institui apenas um modelo de gestão da educação, mas cria um novo modelo educacional, com orientação pedagógica cívico-militar.
Outro argumento listado pelo PSOL é que o programa desrespeita as funções já definidas da Polícia Militar. Na Constituição, no artigo 144, a definição é que os policiais têm o papel de polícia ostensiva e a preservação da ordem pública. Os autores da ação de inconstitucionalidade afirmam que a lei afronta esse princípio ao atribuir funções pedagógicas a militares da reserva.
A petição afirma que esse aspecto também viola a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), que define, no artigo 83, que o ensino militar deve ser regulado em uma lei específica. “Os dois modelos de educação são segregados pela LDB justamente porque não são compatíveis entre si. Muito pelo contrário: não há caminho do meio entre a educação civil e a militar”, afirma o documento do PSOL.
Outra inconstitucionalidade, segundo a petição, é que a lei afronta os princípios constitucionais da valorização dos profissionais da educação escolar, da gestão democrática e do planejamento escolar. Esses princípios estão nos artigos 206 e 214 da Constituição. Como dito anteriormente, o salário previsto para os monitores militares é maior que o piso de professores, e os selecionados não passam por concurso público para exercer a nova função. Além disso, para os autores, a presença de um núcleo militar na gestão de escolas faz com que pais, professores, estudantes e funcionários deixem de participar efetivamente na organização do ensino.
A petição também argumenta que o novo modelo impõe militarização precoce aos jovens. Segundo o documento, a Constituição Federal assegura a todo cidadão o direito de passar sua vida à margem da ordem militar, o que seria impossível para os estudantes de áreas que adotassem o ensino misto.
Por fim, os autores da ação destacam que a lei destina vultoso recurso público ao programa flagrantemente inconstitucional sem que tenha sido realizado qualquer estudo de impacto financeiro e orçamentário. A petição argumenta que, segundo a LDB, profissionais de segurança pública não podem ser remunerados com recursos da Secretaria da Educação.
A Secretaria da Segurança Pública foi procurada, mas não respondeu até a publicação.