No final de setembro de 2023, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) tomou uma decisão significativa que impacta diretamente o mercado imobiliário brasileiro e, mais especificamente, as relações entre compradores e construtoras.

Qual foi a decisão do STJ?
O Tribunal determinou que, em casos de distrato, as incorporadoras não podem reter mais de 25% do valor já pago pelos compradores. Além disso, a devolução desse montante deve ocorrer de maneira imediata, contrariando a regra anterior que permitia a devolução somente ao final da obra, conforme estabelecia a Lei dos Distratos (Lei nº 13.786/2018).
Essa decisão é vista como uma vitória para os consumidores e gera um precedente importante para casos semelhantes, mesmo que não tenha efeito vinculante. O STJ, ao aplicar essa determinação, reforça a ideia de que o Código de Defesa do Consumidor (CDC) deve prevalecer sobre a Lei do Distrato, um ponto defendido por muitos especialistas em Direito Imobiliário, como Marcelo Tapai.
De acordo com Tapai, esse novo entendimento corrige um desequilíbrio que vinha prejudicando os consumidores, que, ao adquirir imóveis na planta, não possuem um bem imediato, mas acabam por financiar a construção com seus próprios recursos.
Qual o impacto da retenção de valores nas relações de distrato?
Antes dessa decisão, a Lei dos Distratos permitia que as construtoras retivessem até 50% do valor pago em caso de desistência, uma prática que rapidamente se tornou padrão no mercado, independentemente das circunstâncias individuais de cada distrato.
Isso frequentemente levava a situações em que os consumidores brasileiros perdiam não só metade do que tinham pagado, mas em alguns casos até mais devido a outros custos associados, como a taxa de corretagem. Esse cenário criava um ambiente significativamente favorável para as incorporadoras, possivelmente vendendo o mesmo imóvel mais de uma vez, enquanto retinham uma quantia substancial dos compradores iniciais.
Como a decisão do STJ beneficia os consumidores?
A decisão proferida pelo STJ busca reequilibrar essas relações, assegurando que os consumidores não sofram perdas injustas e desproporcionais. A ideia central é que a proteção ao consumidor deve ser priorizada, um princípio consagrado tanto no CDC quanto na Constituição Federal. Esse julgamento implica que, em eventual desistência, o comprador deve receber ao menos 75% do que pagou, e isso de forma imediata. Para muitos compradores, essa mudança significa uma proteção significativa em situações de risco ou dificuldade financeira imprevista.
Importante notar que o STJ também destacou que a devolução imediata não impede a cobrança de despesas efetivamente comprovadas pela construtora, como possíveis danos causados pelo comprador ou por outros compromissos assumidos devidamente documentados. No entanto, a retenção superior a 25% perde a validade, reforçando a segurança jurídica para o consumidor.
Quais são as implicações futuras para o mercado imobiliário?
Para o setor da construção civil, essa mudança cria um novo desafio no que tange à gestão financeira e de fluxo de caixa, uma vez que as incorporadoras terão que ajustar suas estratégias para acomodar essa nova realidade.
No entanto, muitos analistas, incluindo Tapai, argumentam que o impacto não será tão significativo, considerando que as incorporadoras continuam a ter a propriedade do bem, o qual pode ser revendida muitas vezes por um valor ainda maior. Além disso, essa decisão pode implicar em uma redução de litígios judiciais, proporcionando um ambiente mais seguro e previsível tanto para os consumidores quanto para os negócios.
Em resumo, a recente decisão da corte superior é considerada um marco para a proteção dos direitos dos consumidores no mercado imobiliário. Ela não apenas reforça o equilíbrio nas relações contratuais, mas também promove uma prática de negócios mais justa e transparente, desestimulando práticas arbitrárias previamente abusivas por parte das construtoras.
(FAQ) Decisão do STJ sobre distrato e retenção de valores
- O que é distrato imobiliário? É o desligamento contratual entre comprador e construtora/incorporadora antes da entrega definitiva do imóvel, mediante devolução de valores pagos e possíveis retenções contratuais.
- Qual o limite de retenção após a decisão do STJ? O STJ determinou o limite máximo de 25% de retenção sobre os valores pagos pelo consumidor. Valores superiores a isso, geralmente, são considerados abusivos.
- A decisão é automaticamente aplicada a todos os casos? Apesar de criar forte precedente, a decisão do STJ não tem efeito vinculante imediato para todos os tribunais. Entretanto, serve como referência importante para julgamentos em todo o país.
- Existem exceções para o percentual de retenção? Em casos excepcionais e devidamente comprovados, pode-se discutir a retensão de despesas extraordinárias que tragam prejuízo efetivo à construtora, mas nunca acima de 25% do total pago.
- O comprador pode exigir a devolução imediata dos valores? Sim. Segundo o STJ, a devolução deve ser imediata, salvo exceções muito específicas devidamente fundamentadas e comprovadas em juízo.
- O que acontece com valores de corretagem? A taxa de corretagem pode ser descontada do valor devolvido, desde que esteja prevista de forma clara no contrato e não represente retenção superior ao limite legal.
- E se a construtora se recusar a devolver a quantia? O consumidor pode buscar os seus direitos junto aos órgãos de defesa do consumidor, Procon ou ingressar com ação judicial para garantir a devolução nos termos determinados pela Justiça.