Foto: Rafa Neddermeyer/Agência Brasil
Na próxima quarta-feira, o submarino Tonelero (S42) será batizado e lançado ao mar em Itaguaí, no Rio de Janeiro, em um evento que terá a presença do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e do presidente francês Emmanuel Macron. O Tonelero faz parte do Programa de Desenvolvimento de Submarinos (Prosub), fruto de uma parceria entre o Brasil e a França firmada em 2008, cujo orçamento é de cerca de R$ 40 bilhões.
O novo submarino será equipado com mísseis, torpedos e sensores modernos, segundo a Marinha do Brasil. Após ser colocado na água, ele deverá ainda passar por uma fase de testes para avaliar os sistemas de combate e navegação, bem como a sua estabilidade no mar. O plano inicial previa que o Tonelero entraria em operação já em 2020.
O Tonelero é equipado com seis turbos de armas capazes de lançar torpedos, mísseis antinavio e minas. O Sistema de Combate do submarino tem ainda sensores acústicos, eletro-ópticos e óticos, além de equipamentos de guerra eletrônica.
Seguindo uma tradição naval, a primeira-dama Janja será a madrinha do submarino no evento da próxima quarta-feira. Em dezembro de 2018, no lançamento ao mar do Riachuelo, a ex-primeira-dama Marcela Temer cumpriu o mesmo papel, assim como, em 2020, fez Adelaide Chaves Azevedo e Silva, mulher do então ministro da Defesa, Fernando Azevedo.
O Prosub prevê a transferência de tecnologia francesa para a construção de embarcações nacionais. Por isso, o Tonelero guarda semelhanças com os submarinos da classe Scorpène. O modelo brasileiro, no entanto, é maior que o francês, tendo 71 metros de comprimento e um deslocamento submerso de 1.870 toneladas. Dotado de quatro motores a diesel e um elétrico, ele tem uma autonomia de mais de 70 dias, podendo atingir mais de 250 metros de profundidade. A tripulação do Tonelero será composta de oito oficiais, 35 militares e 27 praças.
O Tonelero é um dos quatro submarinos movidos a propulsão convencional desenvolvidos no âmbito do Prosub. Outros dois já foram concluídos e entregues: o Humaitá, em janeiro deste ano, e o Riachuelo, incorporado à esquadra da Marinha em setembro de 2022. O último desses novos submarinos convencionais é o Angostura, ainda em fabricação. No entanto, a principal embarcação militar desenvolvida dentro do programa é o Álvaro Alberto, o submarino de propulsão nuclear da Marinha, previsto para ser concluído no final da década, após diversos atrasos.
— É possível utilizá-los (os submarinos convencionais) em patrulhas, normalmente são mais silenciosos e furtivos. Entretanto, necessitam de emergir para o carregamento das baterias, reduzindo a sua autonomia e alcance operacional. Já os submarinos de propulsão nuclear possuem maior autonomia, podem submergir em águas mais profundas e ampliam o horizonte do emprego estratégico desse armamento — explica o professor Augusto Teixeira, do curso de Relações Internacionais da UFPB.
No momento, apenas seis países detém a tecnologia de propulsão nuclear: Estados Unidos, Rússia, China, Índia, Reino Unido e França. A Austrália deverá ser o próximo a entrar nesse seleto grupo através de uma aliança feita com Reino Unido e EUA, em um raro caso de transferência da tecnologia nuclear, segundo Teixeira. Em comparação, a parceria entre França e o Brasil mostra-se mais restrita:
— Apesar da cooperação com a França, existem limites claros em relação às tecnologias que o Brasil tem acesso. No caso do submarino de propulsão nuclear, muito da cooperação consiste em conhecimentos sobre o casco, mas não sobre a miniaturização do reator, por exemplo. Assim, a Marinha tem, além da questão orçamentária, o desafio de dar saltos tecnológicos no contexto de uma base industrial de defesa devastada pela crise econômica da década passada — diz o professor, que também é coordenador do Grupos de Pesquisa em Estudos Estratégicos e Segurança Internacional (GEESI).Submarino Tonelero será lançado ao mar ainda em março — Foto: Divulgação
A Marinha justifica o investimento bilionário na nova frota de submarinos como um meio de garantir o que chamam de “negação do uso do mar” — ou seja, a proteção dos mares brasileiros de forças inimigas, segundo a Estratégia Nacional de Defesa (END) de 2020. O objetivo é a proteção da chamada Amazônia Azul, área de 5,7 milhões de km² que inclui o mar territorial e a Zona Econômica Exclusiva do Brasil. Segundo Teixeira, a frota de submarinos nacional é pequena se comparada a de países com uma costa extensa como a brasileira — caso dos EUA, China e Índia.
Marcado por atrasos, o Prosub implica em uma concentração de recursos que pode prejudicar outros elementos da esquadra brasileira, caso dos navios, na avaliação do professor.
— Os atrasos na entrega dos submarinos no Brasil, sejam os convencionais como o de propulsão nuclear, se devem tanto a questões orçamentárias como aos desafios tecnológicos. No Prosub, a Marinha e instituições correlatas criaram estruturas físicas, empresas e formaram pessoal para o Projeto. Tudo isso envolve recursos, tempo e prioridades. No contexto de um orçamento de defesa em que mais de 90% vai para pagamento de pessoal, os recursos para investimento e custeio são parcos diante da grandiosidade do objetivo.
Origem do nome
O Tonelero faz menção a uma ação naval concluída pela Marinha Imperial durante a Guerra do Prata, ocorrida entre 1851 e 1852. Na operação, as embarcações da esquadra brasileira atravessaram, sob fogo do Exército da Confederação Argentina, o Passo de Tonelero, levando tropas brasileiras até a província de Entre-Rios, onde desembarcaram.
O S42, no entanto, não é o primeiro a levar esse nome. Em 2000, o Tonelero S-2, de fabricação britânica, foi palco de um dos mais graves acidentes em um submarino da história do Brasil. Fundeado no cais do arsenal da Marinha do Rio, ele estava passando por reparos quando sofreu com um alagamento causado por falhas em válvulas do sistema hidráulico. O submarino, na época avaliado em US$ 150 milhões, foi a pique, mas os nove militares em seu interior conseguiram escapar. Içado e trazido de volta à superfície, acabou aposentado.
Os demais submarinos convencionais desenvolvidos no Prosub levam também nomes de batalhas e ações navais importantes. O Riachuelo, por exemplo, tem o mesmo nome de um afluente do rio Paraná, na província de Corrientes, na Argentina. Em 1865, o local foi palco de um conflito decisivo na Guerra do Paraguai, vencido pelas forças brasileiras. Outra operação naval, que levou à captura da fortaleza paraguaia do Humaitá, batizou o submarino incorporado à Marinha em janeiro.
O Globo