Costumo dizer que em um mundo ideal todas as empresas, privadas ou estatais, com capital aberto ou fechado, devem ser geridas com base nos mais atualizados conceitos de governança corporativa. Não é assim como sabemos, porém, é normal acreditarmos que, pelo menos, as companhias que abriram o capital e operam na Bolsa de Valores têm a governança como principal preocupação em termos de gestão. O objetivo final é a geração de valor e ela está atrelada à solidez da empresa, tanto em termos financeiros quanto de imagem.
Novamente afirmo que, infelizmente, não é assim. Empresas listadas na Bolsa também “pecam”. A verdadeira governança garante informações transparentes para os acionistas. Todos eles, majoritários e minoritários. Não dá para investir às escuras sob o risco de ser enganado. Mas não é o que vimos no caso da Light, que reportou rombo de R$ 5,6 bilhões em 2022, montante este escandaloso. Pior ainda o caso da Americanas, cujo rombo ultrapassou os R$ 40 bilhões. Como um elefante deste tamanho passou por todo mundo sem que ninguém tenha visto? É escandaloso, mas tão escandaloso quanto é a ineficiência das entidades fiscalizadoras, sejam públicas ou privadas.
Agora, nos deparamos com a notícia de que o Instituto Empresa, uma entidade que atua na proteção dos direitos dos acionistas minoritários, entrou com pedido na Bolsa-Brasil-Balcão (B3), a Bolsa de Valores do Brasil, para suspender o Magazine Luiza do Novo Mercado, pois a varejista cometeu erros contábeis referente ao balanço do terceiro trimestre do ano passado. Na ocasião, a empresa informou ao mercado prejuízo de R$ 166,8 milhões. Recentemente, ela fez a revisão e assumiu que o prejuízo era maior, de R$ 190,9 milhões.
Acontece que os investidores, antes de aportarem recursos nas ações de qualquer empresa, avaliam a saúde financeira delas por meio dos balanços. A proporção dívida versus valor de mercado se soma a outras variáveis que determinarão se aquele investidor deve ou não arriscar naquele ativo. Mesmo que a diferença de R$ 24,1 milhões possa parecer pequena, o erro é grande e pode ter prejudicado os acionistas. Vale ressaltar que o Novo Mercado é considerado o mais alto nível de governança da Bolsa. Se isso passa despercebido no mais seguro, imaginemos o que não pode ocorrer nas empresas integrantes por exemplo no mercado básico, denominado tradicional.
O caso Magalu e o andar da Bolsa de Valores
O caso do Magalu merece atenção da B3. É preciso avaliar o impacto que a informação errada teve na precificação das ações e, consequentemente, no bolso dos investidores. Até os procedimentos de controle adotados pela B3 e pela Comissão de Valores Mobiliários devem ser reavaliados. Fraude ou acidente, tem acontecido muita coisa negativa no que diz respeito à contabilidade das empresas listadas na Bolsa de Valores.
Costumamos afirmar que os brasileiros sabem pouco sobre o mercado de capitais e que pela população que temos, 5 milhões de CPFs cadastrados na Bolsa é um número pífio. Tudo bem, é verdade que nossa população não é devidamente educada para cuidar das finanças e sabe pouco ou nada sobre Bolsa de Valores. Mas se fraudes e erros grosseiros como os que citamos continuarem a acontecer, esse percentual de entrantes continuará pequeno por muitos anos ainda.
Se existem erros e fraudes que só aparecem depois de terem causado prejuízos a investidores, e que jamais serão ressarcidos, é natural que as pessoas fiquem arredias e mantenham distância do mercado. No caso do Magazine Luiza, haverá uma arbitragem entre investidores e a companhia para resolver o caso.
O fato é que negociações foram feitas com base em números falsos. Isso mostra que o processo de governança da varejista é falho, mas entendo que a B3 também tem de reavaliar seus procedimentos de controle e punição porque eles estão se mostrando ineficientes. Isso é ruim para a Magazine Luiza, para o varejo e principalmente para o ambiente de negociações na B3, pois a conversa de que é preciso atender a duros requisitos para operar no ambiente da Bolsa pode não convencer mais ninguém.
Créditos: Revista Oeste.