Na quarta-feira 29, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que veículos jornalísticos podem ser condenados por realizarem entrevistas, caso haja “indícios concretos” de falsidade de acusação por seus entrevistados. A tese é do ministro Alexandre de Moraes.
Nem mesmo setores da imprensa tradicional, outrora simpáticos às decisões de Moraes, concordaram com sua mais recente determinação. Em artigo publicado na Folha de S.Paulo, por exemplo, o colunista Luís Francisco Carvalho Filho afirma que a tese de Moraes é um “desatino”, que pode conduzir o país a tempos “obscurantistas”.
“Agora, o STF pretende estabelecer um regime político de intangibilidade da honra de personalidades e políticos, inclusive corruptos e pilantras”, escreveu Carvalho Filho. “Nem a ditadura foi tão ambiciosa.”
De acordo com o colunista, a decisão da Suprema Corte pretende fazer da profissão jornalística “uma instância cartorial, burocrática”. Para Carvalho Filho, a ideia do STF é inviável especialmente nos casos de entrevistas ao vivo, porque haveria a necessidade de, previamente, entrevistados e entrevistadores receberem alguma determinação daquilo que poderia ser dito.
Carvalho Filho menciona também o que chama de “escorregadela tirânica” do ministro Cristiano Zanin. Este último salientou que a Justiça pode terminar a remoção do conteúdo “com informações comprovadamente injuriosas, difamantes, caluniosas, mentirosas”. Segundo o colunista, tal medida causaria inveja aos “juristas” do regime militar.
Os efeitos da decisão do STF
Caso a determinação do STF siga adiante, diz o colunista da Folha, declarações dos próprios ministros da Suprema Corte se tornariam alvo de possíveis punições.
“Se o ministro Gilmar Mendes repetir hoje para um repórter o que disse em 2015, que o PT instalou no país ‘um modelo de governança corrupta’, algo que mereceria o nome de ‘cleptocracia’, o órgão de imprensa poderia ser responsabilizado civilmente, muito embora o ministro tenha capacidade financeira e idoneidade moral para responder por seus atos e opiniões”, escreveu o colunista.
Ao contrário do que alega o presidente do STF, Luís Roberto Barroso, a decisão contra a imprensa não se refere apenas aos casos de “negligência grosseira”. Carvalho Filho lembra que a tese do Supremo prevê a aplicação da nova regra em pelo menos 119 casos “que aguardam a manifestação preguiçosa e temerária do tribunal”.
O colunista da Folha afirma que a decisão do STF incentiva a autocensura e estimula o “juiz da esquina” a punir veículo de comunicação que não “verificar a veracidade dos fatos” antes da publicação da entrevista.
Para Carvalho Filho, a nova determinação do Supremo criará desconforto para a atividade jornalística, que é capaz de incomodar “governantes e pilantras”.