O Ministério dos Povos Indígenas (MPI) já gastou R$ 720.925,84 em 39 viagens internacionais até 10 de outubro de 2023. Somente a ministra Sonia Guajajara, que comanda a pasta, usou de cerca de R$ 82,5 mil em viagens internacionais nos primeiros 9 meses de governo. Dentre os objetivos mencionados pelo ministério para justificar as viagens, o que recebe destaque é o de contribuir para o “reposicionamento internacional do país”. No pano de fundo, estão também as questões ambientais e a busca do governo por holofotes diante do objetivo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) de buscar protagonismo na comunidade internacional.
Por ter sido criado por Lula em 2023, o Ministério não teve recursos destinados para suas ações no orçamento elaborado em 2022, ainda no governo de Jair Bolsonaro (PL). Sendo assim, a ação orçamentária do MPI em 2023 vem do desmembramento do antigo Ministério da Economia. “A partir disso, foi destinado orçamento para gestão e manutenção deste inédito Ministério dos Povos Indígenas, assegurando assim sua estruturação e funcionamento neste primeiro ano”, informou a assessoria do MPI por meio de nota.
Diante do desmembramento do orçamento, foram destinados pouco mais de R$ 816 milhões em recursos para manutenção do MPI. Mesmo diante deste cenário de recurso “fatiado”, o ministério é o 12º ministério com maior gasto com viagens internacionais e nacionais, de acordo com o Painel de Viagens do governo federal – o primeiro lugar é do Ministério da Educação.
O total de gastos com viagens no ministério comandado por Sônia Guajajara nos primeiros nove meses de governo é de R$ 18 milhões. Os gastos com viagens da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) também estão vinculados ao MPI, de acordo com o Painel do governo.
Nova York e Genebra são destinos mais frequentes, mas agendas não são divulgadas
Das 39 viagens internacionais realizadas por membros do MPI, 15 tinham como origem ou destino a cidade de Nova York, nos Estados Unidos. Outras 15 tiveram Genebra, na Suíça, como ponto de chegada ou partida.
Por meio de nota, o MPI afirmou que os servidores que se deslocam em viagens internacionais são obrigados a apresentar relatórios sobre suas atividades exercidas no exterior, dentro do prazo de trinta dias. No entanto, esses relatórios não são disponibilizados ao público de forma espontânea, eles precisam ser solicitados por meio dos canais oficiais de acesso à informação, regido pela Lei 12.527/2011. A Gazeta do Povo requisitou a informação e aguarda uma resposta.
No site do Ministério dos Povos Indígenas, a agenda oficial da ministra só passou a ser publicada após 23 de maio. Neste período, a ministra já havia realizado três viagens ao exterior. Já no caso do secretário executivo da pasta, Eloy Terena não há informações sobre qualquer agenda cumprida antes de setembro de 2023. Até o momento, Terena viajou quatro vezes ao exterior, somente uma delas após o início da divulgação das agendas.
Ministra Sonia fez 6 viagens ao exterior esse ano
Os gastos da ministra Sonia Guajajara nos primeiros nove meses de 2023 somaram R$ 82,5 mil. Em sua última viagem, em setembro, a ministra ficou pelo menos sete dias fora do país, recebendo diárias. A viagem para Nova York foi registrada na agenda oficial com uma série de eventos.
No entanto, chama a atenção uma passagem comprada de Nova York para Londres que não consta na agenda oficial. Há o registro feito pelo jornal britânico The Gardian que menciona a passagem da ministra pelos seus escritórios após a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o marco temporal para demarcação de terras indígenas.
Em maio, a ministra esteve na França. Na agenda oficial, os compromissos passaram a ser lançados somente após o dia 24 de maio, após o retorno da viagem. Na rede social X (antigo Twitter), Sonia disse estar na França e ter sido agraciada com um prêmio da Amazônia Fund Alliance Program, durante o Festival de Cannes. Guajajara também se encontrou com o ator Leonardo DiCaprio no país. O momento também foi registrado pelo ator em seu perfil na rede social. Na publicação, DiCaprio menciona o lançamento de um filme que trata do tema indígena nos Estados Unidos e destaca que o evento teve como “objetivo apoiar os povos indígenas que lideram a conservação da floresta amazônica”.
Informações sobre as viagens são divulgadas nas redes sociais
Entre 25 de setembro e 1º de outubro a agenda do secretário-executivo aponta que ele foi substituído pela sua chefe de gabinete, Elaine Jácome dos Santos Labes. Elaine já foi colega de Terena enquanto ambos atuavam na Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e posteriormente na equipe de transição de Lula.
Embora não haja informações oficiais sobre as agendas, o secretário executivo do MPI tem apostado na divulgação de fotos e vídeos sobre a sua atuação nas redes sociais. Em meio a fotos do passaporte diplomático, pequenos vídeos de paisagens e selfies ou fotos descontraídas, em uma das viagens mais recentes, Eloy Terena afirma ter cumprido duas agendas importantes em Genebra. A participação no painel anual de direitos dos povos indígenas e na revisão periódica do Pacto Internacional de Direito Econômico, Social e Cultural foram evidenciadas por Terena em publicações no Instagram pessoal.
Retornando da mais recente viagem para Genebra, Terena gravou um vídeo, onde prestou contas de sua viagem. No vídeo, publicado também no perfil do MPI, ele enfatiza que foi uma “oportunidade de demonstrar para a comunidade internacional que o Brasil tem um novo governo, que valoriza os povos indígenas”. Ele disse ainda que prestou contas da gestão do MPI nos eventos.
Primeiro escalão do MPI é formado por lideranças internacionalmente reconhecidas
A ministra Sonia Guajajara e o secretário executivo Eloy Terena são figuras carimbadas em fóruns e encontros internacionais. Mesmo antes de assumirem os cargos no atual governo, ambos já colecionavam viagens internacionais enquanto atuaram juntos na Articulação de Povos Indígenas do Brasil (Apib).
Em novembro de 2021, por exemplo, Eloy Terena registrou em suas redes sociais a participação, junto de Sonia Guajajara, na Conferências Mundiais do Clima (COP) 26, que ocorreu em Glasgow, na Escócia. Sonia, enquanto coordenadora executiva da organização, fez parte da delegação oficial da Apib. A participação da Apib na Cop 26 tinha como lema “Demarcação Já: Não existe solução para crise climática sem Terras e Povos Indígenas”.
Em seu perfil, mantido no site da Apib, Sonia é mencionada como liderança que “tem voz no Conselho de Direitos Humanos da ONU” e que durante pelo menos dez anos levou denúncias às Conferências Mundiais do Clima (COP), entre 2009 a 2019, além do Parlamento Europeu, entre outros órgãos e instâncias internacionais.
Gazeta do Povo