Após o arquivamento dos inquéritos na Operação Lava Jato e a poucos meses do fim do primeiro ano de mandato de seu pai, Fábio Luis Lula da Silva, o Lulinha, começou a preparar terreno para sua volta ao mundo dos negócios.
Para tanto, tirou da gaveta uma das empresas que usou para prestar serviços à Oi e para receber pagamentos do Instituto Lula. O novo endereço de sua sede fica em uma sala que está há anos bloqueada na Justiça por ter pertencido a um chefão do tráfico internacional de drogas. As informações são do Metrópoles.
A empresa em questão é a G4 Entretenimento Digital, em sociedade com Fernando Bittar, filho do ex-prefeito de Campinas Jacó Bittar (PT) – falecido em maio de 2022 – e ex-proprietário do Sítio Santa Bárbara, em Atibaia, que era frequentado pelo petista. Irmão de Fernando, Kalil Bittar deixou a sociedade na G4. Ele transferiu as suas cotas de R$ 25 mil, meio a meio, para Lulinha e Fernando.
Em busca de CEO
Segundo fontes próximas, o modelo do negócio ainda não está fechado, e Lulinha ainda não firmou parceria com outros empresários. A interlocutores o filho de Lula tem dito que mantém o interesse na área de games, que era parte da programação da PlayTV.
O canal pertencia ao Grupo Bandeirantes e mantinha um contrato com a Gamecorp, da qual Lulinha era sócio, para exibição de videoclipes e programas sobre jogos eletrônicos. A participação de Lulinha na Gamecorp foi vendida ao filho do locutor esportivo Walter Abrahão, que depois a repassou a um advogado que já era seu parceiro no negócio. Até hoje, o filho de Lula tem recebido créditos dessa venda.
Recentemente, Lulinha passou a buscar um CEO e funcionários. O filho do presidente tem amigos na área técnica de operação de TV e mantém conversas com eles, daquelas mais informais e pessoais àquelas sobre o mercado. Uma dessas amizades é com Wanderley Abreu Jr, dono do Grupo Storm, que presta serviços na área de TI para a plataforma GloboPlay, da Rede Globo.
“Eu não fui cogitado para CEO da empresa, sou amigo dele, mas só muito amigo. Até por isso, ele não me escolheria para CEO. Talvez, se fosse sócio, se chamasse, eu aceitaria, mas também não me cogitou. Normalmente, ele só me procura para tomar chopp e olhe lá”, diz Wanderley.
Ele ficou conhecido aos 19 anos, quando invadiu um computador da Nasa. À época, seu codinome de hacker era “Storm”. Depois, deu palestra na própria agência espacial e chegou a ajudar o Ministério Público brasileiro em uma operação contra pedofilia on-line. Walderley também é dono de empresas de games e criptomoedas.
A G4 é uma das quatro empresas de Lulinha. Era sócia da Br4 Paticipações, que, por sua vez, estava nos quadros de controladoras da Gamecorp. Essas empresas foram todas devassadas pela Operação Lava Jato, que investigou repasses da Oi para a Gamecorp. O caso acabou transferido para São Paulo, e o Ministério Público Federal (MPF) pediu seu arquivamento.
Os inquéritos não resultaram no indiciamento ou em denúncia contra Lulinha. Entre 2004 e 2014, na condição de sócio, o filho do presidente recebeu R$ 3,4 milhões em lucros provenientes da G4. Somente em 2011, o Instituto Lula pagou R$ 1,3 milhão à empresa.
Depois da Lava Jato, Lulinha submergiu e deixou suas empresas fora de operação. No ano passado, reativou apenas uma delas, de consultoria, sediada no apartamento em que mora, em Moema, zona sul de São Paulo.
A sala bloqueada
Até meados deste ano, a G4 tinha apenas um endereço: o escritório do seu contador, João Muniz Leite. Homem de confiança de Roberto Teixeira, compadre de Lula, João Muniz era o guardião da contabilidade do presidente e chegou a depor na Lava Jato.
No dia 10 de agosto, Lulinha registrou o novo endereço da G4 em uma sala de 34 metros quadrados de um edifício comercial na região da Avenida Engenheiro Luís Carlos Berrini, no Brooklin, polo empresarial na zona sul de São Paulo. O pagamento dos aluguéis e a ocupação da sala começam neste mês.
A sala tem uma história enrolada e está bloqueada pela Justiça. No registro público de imóveis, pertence à empresa Marysol, ligada a Gustavo Bautista, um conhecido chefão do tráfico internacional de drogas que está preso no Uruguai e foi investigado por atuar também no Brasil.
Bautista foi preso em 2001, no Brasil, quando uma inspeção do Ministério Público do Trabalho apurou a suposta exploração de trabalho escravo em uma de suas fazendas na Bahia.
Na diligência, que era acompanhada pela Polícia Federal (PF), acabaram sendo encontradas caixas de frutas com fundo falso recheadas de cocaína. Uma juíza mandou soltar Bautista e acabou aposentada compulsoriamente pelo Conselho Nacional de Justiça por ter amizade e familiares fazendo negócios com ele.
Anos depois, Bautista foi preso novamente, no Uruguai, sob acusação de ser um megatraficante de cocaína, proprietário de fazendas e aviões. Ele era ligado ao traficante Juan Carlos Abadia, que chegou a ser o segundo mais procurado na lista da Interpool, atrás apenas de Osama Bin Laden.
Fora dos cartórios
Da Marysol são sócias a empresa do hangar dos aviões de Bautista e a esposa dele, que também foi denunciada por envolvimento com o tráfico. Bloqueada judicialmente, a sala não pode ter sua venda registrada em cartório, mas a família de Bautista firmou um contrato privado há 13 anos com o empresário José Roberto Barbour, segundo afirmam a defesa de Bautista e o filho de José Roberto.
Dono de uma revendedora de veículos de luxo, Barbour também tem problemas com a Justiça. Foi acusado pelo MP de estelionato após denúncias de clientes que se disseram enganados por ele na compra e venda dos carros. A ação ainda não foi julgada. De outra denúncia semelhante, ele foi absolvido.
Portas fechadas e interfone
Barbour locou a sala para uma consultoria empresarial de nome Best In Class. O filho de Wladimir Palermo, dono da Best In Class, é amigo de Lulinha e ofereceu a sublocação da sala ao filho do presidente, segundo afirmam os proprietários da sala.
O Metrópoles foi ao local e não encontrou ninguém. Apenas a porta fechada da empresa e um interfone antigo em sua lateral. Na portaria do prédio, recepcionistas ainda reconhecem o endereço como sendo da Best In Class.
Palermo afirmou ao Metrópoles que a Best In Class está lá desde 2021, mas, como os projetos da empresa são fora de São Paulo, a sala ficou em desuso. Segundo ele, seu filho, que é amigo há mais de 20 anos de Lulinha, foi quem combinou para que a sala fosse locada à G4.
Fontes próximas a Lulinha afirmam que ele estava prestes a pagar a primeira mensalidade do aluguel neste mês. Depois do contato da reportagem do Metrópoles, contudo, a história do proprietário da sala o teria assustado. Ele pode, agora, procurar outro lugar para ser endereço da sua empresa, segundo afirmam as mesmas fontes.
Metrópoles