Além da esfera judicial, os atos de invasão e depredação das sedes dos Três Poderes em Brasília (DF), em 8 de janeiro de 2023, motivaram investigações parlamentares tanto no Congresso Nacional quanto na Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF).
Os trabalhos foram simultâneos em quase todo o tempo e tiveram conclusões semelhantes no sentido de isenção de responsabilidade ao governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Houve, contudo, discordância quanto a apontamentos ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e sua gestão.
Os relatórios finais aprovados foram entregues para órgãos da Justiça que possuem competência para prosseguir nos indiciamentos, se julgarem cabíveis. Até agora, porém, não houve responsabilização com base nesses documentos. Relembre abaixo como foram e quais os resultados dessas duas comissões de inquérito:
CPMI do 8 de janeiro
No Congresso Nacional, funcionou entre maio e outubro a Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) sobre o 8 de janeiro, composta por deputados e senadores. Ela nasceu a pedido da oposição, que tinha a intenção de culpar o ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino, por suposta omissão durante a invasão e depredação do Congresso Nacional, do Palácio do Planalto e do Supremo Tribunal Federal (STF).
O principal argumento da oposição foi o de que Dino sabia do risco dos ataques e não agiu para impedir. Alvo de vários pedidos de convocação, ele se livrou de ter que comparecer à comissão por articulação de governistas. Parlamentares que inflamavam discursos contra o ministro acusaram a relatora da CPMI, senadora Eliziane Gama (PSD-MA), de blindar Dino, pela relação de amizade que possuem. Ela, no entanto, negou agir de forma parcial.
Livre de convocações, o futuro ministro do STF não conseguiu se esquivar de pedidos de informações. Um deles, sobre as imagens do circuito interno do Ministério da Justiça no dia dos atos, gerou embates. Isso porque a pasta disponibilizou apenas parte do conteúdo, justificando que havia imagens em inquérito policial e outras que foram apagadas pela ausência de registros significativos.
Ao contrário de Dino, Bolsonaro foi alvo de pedido de indiciamento mesmo sem comparecer à CPMI. Ele foi apontado por quatro crimes: associação criminosa, violência política, abolição violenta do Estado Democrático de Direito e golpe de Estado. A relatora afirmou que diferentes fatos mostram “exaustivamente” que o ex-presidente “foi autor, seja intelectual, seja moral, dos ataques perpetrados contra as instituições, que culminou no dia 8 de janeiro de 2023”.
Bolsonaro se defendeu e disse, na época, receber o relatório com “indignação”. Por meio de uma nota, sua defesa alegou o apontamento de crimes para os quais Bolsonaro “jamais concorreu ou minimamente participou”. Para os advogados, a proposta de indiciamento mostrou-se “parcial, tendenciosa e totalmente pavimentada por viés político e não jurídico”. Eles citaram que o ex-presidente fez “ostensiva crítica”, nas redes sociais, em relação aos atos de vandalismo feitos no dia 8 de janeiro.
O relatório de Eliziane, aprovado com um placar de 20 x 11, pediu ainda o indiciamento de outras 60 pessoas. O entorno de Bolsonaro, como ministros e auxiliares, estava na lista. Também constaram nomes da Secretaria de Segurança Pública do DF e da Polícia Militar (PMDF). O documento de mais de 1,3 mil páginas foi entregue a órgãos como o Supremo Tribunal Federal (STF), a Procuradoria-Geral da República (PGR) e a Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).
Insatisfeitos com o desfecho dos trabalhos, parlamentares da oposição apresentaram um voto em separado, que é uma espécie de relatório paralelo. Eles pediram o indiciamento do presidente Lula pelos crimes de prevaricação (quando um agente público se omite ou deixa de denunciar uma ilegalidade), deterioração de patrimônio público e dano qualificado. Com a aprovação do parecer de Eliziane, esse sequer foi votado, assim como outro do senador Izalci Lucas (PSDB-DF).
CPI dos Atos Antidemocráticos
Na CLDF, a comissão que investigou os ataques foi nomeada de “CPI dos Atos Antidemocráticos”. Ela funcionou por nove meses e foi encerrada em novembro, com a aprovação do relatório final por 6 x 1, e 135 pedidos de indiciamento. Da mesma forma que a CPMI do Congresso, esta livrou o governo Lula ao excluir, de última hora, o nome do ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Gonçalves Dias, da lista de responsabilizados.
GDias, como era chamado do chefe do GSI, foi nomeado pelo governo do petista e estava à frente do órgão que protege o Palácio do Planalto. Ele deixou o governo após imagens do circuito interno mostrarem a presença dele no prédio que é sede do Executivo federal em meio à destruição.
Para o relator da CPI, deputado distrital Hermeto (MDB), o militar deveria responder por abolição violenta do Estado Democrático de Direito e golpe de Estado. A retirada do nome do general, no entanto, foi pedida pelo presidente da comissão, deputado Chico Vigilante (PT), e aprovada com quatro votos favoráveis e três contrários.
Em sentido contrário à CPMI do Congresso, que tinha Eliziane como aliada do governo Lula, a CPI da CLDF teve como relator um integrante da base do governador Ibaneis Rocha (MDB), que declarou apoio a Bolsonaro. Hermeto citou o nome do ex-presidente dezenas de vezes no relatório final, mas não pediu seu indiciamento por entender que não foram encontradas evidências sólidas ou informações concretas para incriminá-lo.
Hermeto também não listou o ex-secretário de Segurança Pública do DF, Anderson Torres, que foi ministro da Justiça do governo Bolsonaro. No 8 de janeiro de 2023, ele estava de férias nos Estados Unidos e chegou a ser preso na volta ao Brasil. Já seu interino na época, Fernando Souza de Oliveira, foi responsabilizado pela CLDF.
Policial militar de carreira, Hermeto poupou a cúpula da PMDF de eventuais punições. Também foram alvos de pedidos de indiciamento pela CPI da CLDF integrantes da PMDF do GSI, além de financiadores dos atos. Esse relatório já foi entregue ao Tribunal de Justiça do DF. Antes da votação, o deputado Fábio Felix (PSOL) apresentou um relatório paralelo em contraponto ao oficial, mas o documento não teve análise.
Fonte: O Tempo.