Lançado em 2020, o Pix virou o principal meio para transações bancárias no Brasil, o que atraiu os olhares de cibercriminosos. Dados da Silverguard, empresa de segurança financeira no mundo digital, apontam que 4 em cada 10 brasileiros já sofreram tentativa do golpe que usava o Pix —dos atingidos, 22% já perderam dinheiro.
Um dado chama ainda mais atenção: 9 em cada 10 não sabem como recuperar o valor perdido. Mas será que dá mesmo?
O desconhecimento sobre o que fazer depois de sofrer um golpe com Pix é enorme. Mesmo quem já sofreu algum golpe com Pix não conhece o MED [Mecanismo Especial de Devolução], evidenciando falhas de conhecimento e de comunicação sobre o assunto nas instituições financeiras. (Marcia Netto, CEO da Silverguard)
O que é o ‘golpe do Pix’ e como ele acontece
O golpe do Pix é uma modalidade de fraude financeira se usufrui do desconhecimento ou da vulnerabilidade digital da vítima para roubar dinheiro dela por meio das transferências bancárias.
Nada mais é do que explorar o erro humano através da falta de conhecimento, confiança, manipulações de informações e sistema. Isso leva a vítima a acreditar que as informações ali apresentadas são verdadeiras Diego Marcos Moreira, diretor de Segurança da Informação, do IDCiber (Instituto de Defesa Cibernética)
Há vários tipos de golpes que recorrem ao Pix. Segundo a Silverguard e o IDCiber, os principais são os seguintes:
Golpe do produto ou loja falsa: depois de criar um perfil na rede social de uma loja que não existe, os cibercriminosos anunciam um produto, recebem o Pix, mas não entregam a mercadoria ou enviam outra diferente;
Golpe da compra de loja com rede social hackeada: A conta usada é de um estabelecimento que, de fato, existe. Mas os cibercriminosos clonam ou fazem o hackeamento do perfil na rede social;
Golpe do parente pedindo dinheiro: um dos mais comuns, consiste em clonar o WhatsApp de uma pessoa e pedir dinheiro a um parente dela ao simular uma história urgente ou dramática;
Golpe da oportunidade de investimento ou para multiplicar dinheiro: após prometer retornos financeiros irreais, o golpista pede transferências via Pix, mas nunca distribui os ganhos do suposto investimento;
Golpe da central de atendimento: um falso funcionário do banco liga ou envia mensagem pedindo transferência para liberar algum serviço ou evitar algum bloqueio;
Golpe do comprovante falso: nesse caso, a vítima é quem deveria receber o Pix. O golpista compra algo, mas envia um comprovante falsificado ao vendedor. Enganado, o vendedor envia o produto. O truque dá certo quando a vítima não tem acesso imediato à conta bancária.
São histórias altamente elaboradas e convincentes, adaptadas ao contexto da vítima e que se renovam frequentemente. Os golpistas personalizam seus esquemas utilizando fotos e informações da vítima, obtidas de redes sociais, de celulares roubados ou até mesmo de listas de dados sensíveis adquiridas ilegalmente na dark web. Marcia Netto, da Silverguard
Como recuperar o dinheiro do golpe do Pix
Tempo é dinheiro quando se trata do golpe do Pix. Quanto mais rápido a vítima tomar medidas para recuperar o valor enviado aos golpistas, maiores são as chances de obter o dinheiro de volta, apontam especialistas em cibersegurança ouvidos por Tilt.
- 1) Interrompa a comunicação com o golpista
Ao perceber que foi vítima do golpe, interrompa a comunicação com o cibercriminoso e acione imediatamente o seu banco.
- 2) Documente o golpe
Registre capturas da tela do celular, número de contato do golpista, chave Pix para a qual o valor foi enviado, número da transação e conversas de WhatsApp. Tudo deve ser guardado e informado aos bancos.
Contudo, se a conversa do golpe foi via WhatsApp, não bloqueie o contato, pois isso poderá ocultar a conversa e impedir que você faça a captura de tela.
- 3) Acione o MED
Entre em contato imediatamente com o banco para acionar o Mecanismo Especial de Devolução, sistema criado pelo Banco Central para recuperação do dinheiro. Quanto mais rápido o acionamento, melhor, embora o sistema permita abertura de reclamações em até 80 dias após o golpe.
Ao ser acionado, o banco do golpista bloqueia o valor e ambas as instituições (da vítima e do suspeito) analisam o caso a partir do perfil e alegações de cada uma das partes, em um prazo de 7 dias.
Se comprovado o golpe, o dinheiro sai da conta do golpista para a da vítima em até 96 horas. Isso vale obviamente se os recursos não tiverem sido sacados.
Caso a conta do golpista esteja vazia, a instituição financeira dele deve monitorar as transações por até 90 dias para que todo o dinheiro seja repassado à vítima até que o valor seja integralmente devolvido.
Em nenhum dos casos, o banco tira dinheiro do próprio bolso para ressarcir a vítima.
- 4) Faça um boletim de ocorrência
O registro de boletim de ocorrência também é imprescindível para recuperar o dinheiro e eventualmente chegar ao cibercriminoso. E nem precisa sair de casa.
É importante, contudo, que a vítima detalhe o ocorrido ao máximo. É crucial ter: data, hora, meio pelo qual o golpista entrou em contato, explicação esmiuçada sobre as trocas de mensagens ou da ligação, chave Pix do suspeito, códigos de transações e o número de contato usado pelo golpista.
Como acionar o meu banco após o golpe do Pix?
Os bancos possuem canais de atendimento ao cliente pelos quais é possível acionar o MED.
- Banco do Brasil
O Banco do Brasil informa que o pedido de devolução por golpe funciona via App BB e Central de Atendimento (4004-0001), 24 horas por dia, além de atendimento nas agências em todo o país, em horário comercial.
“Os processos de contestação são analisados por área técnica que define as responsabilidades das partes, cliente e banco, na ocorrência, após avaliação de cada caso”, explicou.
- Bradesco
O MED pode ser acionado via canais digitais ou pela rede de atendimento de agências bancárias.
A instituição informa que “o cliente responderá questionário para auxiliar no uso correto da ferramenta. O Boletim de Ocorrência é solicitado. No entanto, para não impactar na agilidade da tentativa de recuperação do valor, pode ser apresentado posteriormente”.
- Caixa
Na Caixa, o banco informou que o MED pode ser acionado através do SAC CAIXA, que funciona 24 horas por dia, por meio do 0800 726 0101; e em qualquer agência da Caixa.”Para o registro de contestações de fraudes ou golpes, não há exigência de comprovação da ocorrência pelo cliente, mas apenas o seu relato, que contribui para a análise pela Caixa do pedido de ressarcimento ou devolução dos valores movimentados indevidamente”, esclareceu.
- Itaú
O Itaú disponibiliza para recuperação do valor os seguintes números: 4004 4828 (capitais e regiões metropolitanas) e 0800 970 4828 (demais localidades).
- Santander
O MED pode ser acionar via telefone 0800 762 7777 (capitais e regiões metropolitanas) e +55 11 3012 3336 (no exterior e ligação a cobrar).
Não consegui recuperar meu dinheiro do golpe do Pix, e agora?
Seguiu todos os passos e, ainda assim, a devolução foi negada? Saiba que isso é possível e até comum. Em 2022, só 1 de cada 10 vítimas que acionaram o Mecanismo Especial de Devolução teve seu dinheiro devolvido, aponta a pesquisa da Silverguard.
Isso ocorre pela falta de detalhamento da vítima sobre o golpe e pela demora do próprio banco em acionar. Além disso, o Mecanismo de Devolução não pode ser usado para:
- Reembolso de valores por digitação errada das chaves
- Reembolso por valores transferidos acima
- Reembolso quando há controvérsias ou contradições da vítima sobre o golpe
A recuperação do dinheiro depende da situação específica e da rapidez com que a vítima notifica o banco. É importante agir rapidamente, pois isso aumenta as chances de recuperação do dinheiro. Alexander Coelho, especialista em Direito Digital e sócio do Godke Advogados
O advogado frisa que não é possível a vítima acessar dados cadastrais da conta para a qual enviou o valor do golpe, o que torna necessário o registro de boletim de ocorrência para a Polícia Civil solicitar via autorização judicial, ou por pedido direto na Justiça.
O Banco Central orienta ainda que a vítima acione o Procon ou que entre na Justiça.
Os golpistas podem ser enquadrados em crimes de estelionato, furto e fraude eletrônica.
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