Um estudo divulgado na revista Scientific Reports indica que modelos baseados em inteligência artificial são capazes de predizer com quase 80% de exatidão as taxas de morte e sobrevida de pacientes com câncer colorretal. Segundo os autores, os resultados evidenciam que essas ferramentas podem ser úteis para o planejamento e a avaliação dos serviços de saúde, bem como para orientar protocolos de encaminhamento.
O tumor colorretal é um dos tipos de câncer mais incidentes no mundo, com quase 2 milhões de novos casos ao ano e tendência de aumento nesse número. No Brasil, dados do Inca (Instituto Nacional de Câncer) indicam o surgimento de 44.000 novos casos anuais, sendo 70% nas regiões Sudeste e Sul.
Técnicas de aprendizado de máquina baseadas em inteligência artificial vêm sendo cada vez mais utilizadas para prever taxas de mortalidade e sobrevivência por sua capacidade de se aprimorar automaticamente, sem a necessidade de programações constantes –diferentemente dos modelos estatísticos utilizados em estudos epidemiológicos que, à medida que a realidade se transforma, vão se tornando obsoletos e menos precisos.
O estudo é apoiado pela Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) por meio do projeto “Controle do Câncer no Estado de São Paulo: do conhecimento à ação”, que projeta estratégias para controlar a doença em curto espaço de tempo. O trabalho foi um dos primeiros a realizar a predição da sobrevida de pacientes com câncer com base em um grande banco de dados usando IA e a verificar a validade desses modelos no Brasil.
A pesquisa envolveu grupos da Fosp (Fundação Oncocentro do Estado de São Paulo), da Faculdade de Saúde Pública da USP (Universidade de São Paulo), do Hospital A.C. Camargo e do IMT (Instituto Mauá de Tecnologia).
As informações não identificadas sobre condição socioeconômica, características clínicas e de atendimento e sobrevida de 31.916 pacientes de câncer colorretal atendidos em mais de 70 hospitais do Estado de São Paulo de 2000 a 2021 pertencem ao Registro Hospitalar de Câncer do Estado de São Paulo, administrado pela Fosp.
Os pesquisadores avaliaram e compararam a validade na predição de 3 algoritmos de IA: Random Forest, Naive Bayes e XGBoost. Este último apresentou o melhor resultado, predizendo corretamente 77% das mortes e 77% da sobrevida (em 1, 3 e 5 anos a partir do diagnóstico do tumor).
“O desempenho dos 3 modelos mostrou uma taxa de acertos de 76% a 77%”, diz Lucas Buk Cardoso, pesquisador do NSEE (Núcleo de Sistemas Eletrônicos Embarcados) do Instituto Mauá de Tecnologia e 1º autor do estudo. “Além disso, foi possível obter os dados dos pacientes mais importantes para as previsões – colocados como entradas para a IA –, permitindo um melhor entendimento do tamanho do impacto dessas informações e a validação com o conhecimento já difundido na área”.
A entrada mais importante em todos os modelos foi o estadiamento clínico do câncer, que contém a informação sobre o grau da doença –quanto mais avançada, mais decisiva para a predição de morte. Outras informações importantes foram as relacionadas ao tratamento realizado, como cirurgia, radioterapia e quimioterapia, além da presença de recidiva, indicando se o câncer voltou ou não, idade do paciente e ano do diagnóstico da doença.
Já as variáveis que melhor predisseram a sobrevida no XGBoost foram estágio clínico, cirurgia realizada, tratamento hospitalar, idade e ano de diagnóstico.
Avanços práticos e metodológicos
De acordo com os autores, o estudo tem potencial para ser o 1º de muitos que permitirão a simulação de cenários e impactos na sobrevida de pacientes de câncer. Com as informações obtidas, melhores decisões clínicas e de gestão em saúde pública poderão ser tomadas.
“Esse tipo de avaliação pode indicar modelos que servirão como instrumentos para a tomada de decisão dos gestores em momentos de potencial disrupção nos serviços de saúde, como acontece em pandemias, por exemplo”, diz Tatiana Toporcov, professora da Faculdade de Saúde Pública da USP e coautora do artigo.
Vanderlei Cunha Parro, professor do Instituto Mauá de Tecnologia, destaca o caráter de avaliação das fronteiras entre os métodos estatísticos e os que utilizam aprendizado de máquina.
“Tal investigação pode dar origem também a uma revisão metodológica, com novos dados a serem incluídos e outros a serem excluídos.”
Créditos: Poder 360, com informações de Agência Fapesp.