Com três protestos marcados para os dias 8 e 12 de outubro e 15 de novembro, manifestantes de direita tentam se organizar para voltar às ruas contra os julgamentos iniciados pelo Supremo Tribunal Federal (STF) que podem liberar o aborto até 12° semana de gravidez e descriminalizar o porte de drogas. Até o momento, não se sabe se o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) irá participar diretamente em algum desses atos, mas ele já deu apoio pelo menos a um dos protestos.
“No próximo dia 12, em todo o Brasil, Movimento em Defesa da Vida e Contra o Aborto. Nós respeitamos a vida desde a sua concepção. Não ao aborto!”, disse o ex-presidente em vídeo ao lado do senador Jaime Bagattoli (PL-RO).
Após perder a eleição para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Bolsonaro submergiu dos holofotes e passou três meses nos Estados Unidos. Ao voltar ao Brasil, em 30 de março deste ano, concentrou sua agenda em organizar a política interna do Partido Liberal, comandado por Valdemar da Costa Neto. O presidente procurou manter a unidade da sigla em votações importantes do Legislativo, como foi o caso da Reforma Tributária na Câmara dos Deputados.
Além disso, Bolsonaro apoiou aliados no lançamento de candidaturas para as eleições municipais. O ex-ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, deve disputar a prefeitura de João Pessoa, na Paraíba. Já o deputado federal André Fernandes (PL-CE) irá disputar a prefeitura de Fortaleza.
Bolsonaro ainda possui poder de mobilizar manifestações
Uma carreata ocorrida na última sexta-feira (29), em Fortaleza, mostrou que o ex-presidente ainda tem força em reunir apoiadores. Ao chegar na capital do Ceará para participar de um evento do partido, ele foi recebido por uma multidão de apoiadores que gritavam “Lula Ladrão”.
“O que aconteceu ano passado só Deus explica, mas o futuro está em nossas mãos. Nós continuaremos fazendo história no Brasil”, disse Bolsonaro.
Para o cientista político Elton Gomes, professor na Universidade Federal do Piauí (UFPI), caso haja a participação de Bolsonaro nas ruas, as manifestações programadas para o dia 12 serão uma oportunidade para o ex-mandatário testar sua popularidade.
“Essas manifestações do dia 12 têm um peso simbólico muito grande, já que serão realizadas no dia de Nossa Senhora Aparecida, a padroeira do Brasil. Você pode ter efetivamente alguns resultados: Bolsonaro pode evitar se comprometer com questões político-partidárias ou, por outro lado, ele pode aproveitar essa manifestação para mostrar seu poder e influência”, disse o professor.
De acordo com Gomes, apesar de Bolsonaro estar inelegível, sua participação pode mostrar que ainda tem muito capital político junto ao eleitorado. “Isso pode se traduzir em poder de barganha no mundo político”, afirmou.
O ex-chefe do Executivo se notabilizou por encher as ruas em manifestações ao longo de seu governo, como foi o caso do 7 de setembro de 2022. As motociatas promovidas nos Estados também davam grande destaque ao presidente e mostravam a força do ex-mandatário em mobilizar seus apoiadores. De acordo com registros de pedágios da Rodovia dos Bandeirantes, na motociata de 15 de abril do ano passado, foram registradas 3.703 motos.
Segundo o cientista político Antonio Henrique Lucena, docente na Universidade Católica de Pernambuco (Unicap), a falta de uma liderança eleitoral na direita, gerada pela inelegibilidade do Bolsonaro, pode ser um fator de impacto para as manifestações.
“Desde a saída antecipada de Bolsonaro para os Estados Unidos, no final de dezembro do ano passado, a direita ficou um pouco perdida. Principalmente depois da inelegibilidade do ex-presidente. Isso termina gerando, obviamente, um determinado vácuo. A direita não conseguiu se articular em torno de um novo nome. Não se sabe se o nome de Tarcísio, governador de São Paulo, ou de outra pessoa específica irá se consolidar”, disse Lucena.
Manifestações são da sociedade e dão ênfase a patriotismo
Nas redes sociais, crescem as convocações para os atos do dia 12 de outubro. Movimentos como o “Nas Ruas” publicam constantemente comunicados chamando os seguidores a protestarem contra aborto e legalização de porte de drogas. Analistas ouvidos pela reportagem reconhecem a importância de Bolsonaro para a alavancar as manifestações, mas ressaltam que o foco dessa vez será a própria sociedade.
O deputado Diego Garcia (Republicanos – PR), vice-presidente da Frente Parlamentar Mista em Defesa da Família e Apoio à Vida, comenta que as manifestações do dia 12 são fruto da mobilização da sociedade civil devido às decisões do STF.
“As manifestações só acontecem diante desse atropelo que vem acontecendo por conta do Supremo Tribunal Federal às pautas que têm sido amplamente debatidas dentro do Congresso Nacional. Elas estão surgindo neste momento na sociedade civil organizada por conta das pautas em debate. É o medo que assola a sociedade de se cogitar a possibilidade de ter um cidadão na porta da escola dos nossos filhos, por exemplo, fumando e vendendo maconha.”
A avaliação do parlamentar também é compartilhada pelo cientista político Adriano Cerqueira, do Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (Ibmec). Para o docente, as manifestações são um movimento natural da sociedade.
“Essa mobilização é independente de Bolsonaro. O ex-presidente soube captar o sentimento conservador que estava em crescimento no Brasil, antes da sua eleição, e soube ser uma espécie de representante desse movimento conservador. Por outro lado, Bolsonaro não é a causa desse movimento, ele é uma consequência. Com ou sem ele, essas manifestações vão acontecer”, disse Adriano.
Repercussões do 8/1 ainda assombram parlamentares de direita
Diferentemente das manifestações do ano passado, parlamentares de direita próximos a Bolsonaro não tem demonstrado explicitamente que vão participar dos atos convocados. Como o aborto é um tema que está sendo discutido no Supremo, a leitura é que as críticas feitas pelos manifestantes no dia 12 possam ser alvo de retaliações do ministro Alexandre de Moraes.
Em reserva, um parlamentar o PL avaliou que o momento pede “cautela” por parte dos manifestantes e dos deputados de direita. Com o julgamento dos réus do 8 de janeiro, que resultou em altas penas de prisão, a avaliação é que qualquer manifestação contrária ao Supremo seja tomada como “ataque à democracia” e resultar em processo e eventual prisão.
Gazeta do Povo