Após o Congresso Nacional decidir recriar a Funasa (Fundação Nacional de Saúde), a reestruturação do órgão tem patinado no governo e irritado partidos políticos que o cobiçam.
Segundo parlamentares, durante as tratativas da reforma ministerial, o presidente Lula (PT) sinalizou que pretendia dar o comando da fundação ao Republicanos. O PSD, porém, também pleiteou a Funasa, e o Planalto avalia agora dividir a gestão entre os dois partidos. As informações são da Folha de SP.
A decisão dependerá, porém, do tamanho que terá a fundação após ser reformulada. Uma ala do governo quer que ela seja enxuta, enquanto congressistas pretendem turbiná-la.
Depois que o Congresso resolveu recriar o órgão, o governo estabeleceu um grupo de trabalho em julho com integrantes do Executivo e do Parlamento para recompor a Funasa. O grupo é responsável por definir o orçamento e sob qual ministério ela ficará atrelada.
O prazo para o fim dos trabalhos era 14 de agosto, porém, em meio a divergências internas, a reestruturação atrasou. O prazo foi prorrogado até 15 de setembro, mas ainda não houve uma conclusão.
Integrantes do governo envolvidos no tema querem resolver a questão e editar o ato definindo a nova Funasa nesta semana. A expectativa é que o governo ceda à pressão de parlamentares e coloque o órgão no Ministério da Saúde.
A Funasa teve orçamento de R$ 3,4 bilhões em 2022, último ano do governo Jair Bolsonaro (PL), com estruturas distribuídas pelas 27 unidades da federação.
Interlocutores de Lula dizem que o grande interesse da classe política na recriação está ligado ao fato de o órgão ter contratos de alto valor que estão sob risco de perda de validade, além de possuir emendas parlamentares de governos anteriores que precisam ser quitadas.
Em recente entrevista à Folha, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), disse que os cargos da Funasa devem ser indicados por integrantes do Republicanos, como parte do acordo político que levou o partido e o PP ao primeiro escalão do governo Lula.
No entanto, auxiliares do petista e membros do Congresso afirmam que está em construção um entendimento entre Republicanos e PSD para que as indicações sejam divididas entre as duas siglas.
O PSD tem três ministérios no governo Lula, mas a bancada da Câmara pede mais espaço —os senadores do partido ocupam duas pastas.
Enquanto o Republicanos negociava a reforma ministerial com o Planalto, o PSD enviou uma carta para ministros palacianos reforçando a indicação do nome do ex-vice-governador do Ceará Domingos Filho para chefiar a Funasa. O documento foi assinado pelos líderes do partido na Câmara, Antonio Brito (BA), e no Senado, Otto Alencar (BA).
O ministro Alexandre Padilha (Relações Institucionais) disse nesta quarta-feira (27) que ainda não há definição sobre o modelo que terá o órgão.
“A bancada do PSD, como outros partidos, pleiteiam o tema da Funasa há muito tempo, a bancada do PSD já formalizou isso inclusive, outros também. Só disse para eles que ainda não tem definição ainda por parte do governo de como é o modelo da estrutura da Funasa. Assim que tiver, vamos discutir”, disse.
A tensão entre o PSD e o governo ficou evidente nesta terça (26) quando um grupo de parlamentares da sigla emparedou Padilha após um evento no Planalto.
Pelo menos três parlamentares, entre eles o líder da bancada na Câmara, cercaram o responsável pela articulação política do governo e, com gestos ríspidos, cobraram a liberação de recursos na área da saúde.
A deputada Laura Carneiro (PSD-BA) era a mais eloquente. Em determinado momento, a parlamentar chegou a ameaçar a ministra Nísia Trindade, da Saúde. “Se a gente dançar, a ministra vai dançar também”, afirmou, segundo áudio captado pela rádio CBN.
Após o episódio, Padilha saiu do local brincando que tinha sofrido um “baculejo”.
Nesta quarta, o ministro foi falar com jornalistas no Palácio do Planalto abraçado com o líder do PSD na Câmara, brincando com o “baculejo” da véspera. “Agora, vocês não têm ideia do que eles fazem comigo a portas fechadas”, disse.
Apesar de negar que a insatisfação tenha relação com a liberação de emendas, o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE), sinalizou que a “burocracia” do governo estaria atrapalhando.
“Não diria que está lenta [a liberação de recursos na saúde]. Tem decisão política? Tem. Tem orçamento? Tem. Não justifica a burocracia atrapalhar isso”, disse.
“Defendo é a rapidez nessas decisões, na área política do governo. É rapidez para um lado ou para o outro. Não pode ficar demorando tanto. Tem que decidir”, completou.
A Funasa é também alvo de divergência entre a Casa Civil e o centrão a respeito do futuro do órgão.
O ministro Rui Costa (Casa Civil) e aliados defendem que a estrutura seja reduzida e vinculada ao Ministério das Cidades. Já os parlamentares querem que ela seja mantida no porte atual.
À época da criação do grupo de trabalho, parlamentares e integrantes da ala política do governo argumentaram que uma lei complementar incluiu os serviços de saneamento na conta do piso da saúde —mínimo previsto na Constituição para aplicação na área. Por isso, dizem, o órgão precisa ser vinculado à pasta.
Além disso, um orçamento robusto para a Funasa é desejado pelos partidos pelo volume de novas emendas que os deputados pretendem empenhar no órgão.
Integrantes da outra ala do Palácio do Planalto, no entanto, dizem que a lei que reorganizou a Esplanada dos Ministérios define que a “promoção de ações e de programas de urbanização, de habitação e de saneamento básico e ambiental, incluída a zona rural” são competência do Ministério das Cidades. Por essa razão, afirmam, a Funasa deveria ficar sob a responsabilidade dessa pasta.
Em julho, o governo prorrogou convênios para evitar que municípios perdessem mais de R$ 1,2 bilhão em gastos previstos em contratos com a Funasa que venciam naquele mês. Havia 811 convênios para vencer de 20 de julho a setembro. A prorrogação vale até o fim do ano.
Folha de SP