Um nigeriano trabalhava como cozinheiro a bordo de um rebocador (um barco que auxilia as manobras de navios e outras embarcações na área portuária de forma segura) chamado Jascon 4, que estava a cerca de 32 quilômetros da costa da Nigéria, quando naufragou devido a uma falha súbita.
“Eu tinha acabado de ir ao banheiro. Fechei a porta e estava sentado no vaso sanitário quando o barco virou para o lado esquerdo”, lembrou Harrison Okene em uma recente entrevista ao programa de rádio BBC Outlook.
Harrison Okene não esquecerá o momento em que o barco em que navegava começou a afundar — Foto: DCN Global
O naufrágio foi tão rápido que nenhum dos 13 tripulantes conseguiu chegar à superfície antes de o navio se encher de água.
“A próxima coisa que vi foi o vaso sanitário sobre o qual estava sentado, que de repente estava sobre minha cabeça”, narrou Harrison. “A luz se apagou e eu ouvi as pessoas gritando. Consegui abrir a porta e sair, mas não consegui encontrar ninguém. A força da água me empurrou para uma das cabines e fiquei preso lá”.
O que ele nunca imaginou naquele momento de pânico foi que aquele jato de água seria também uma sorte.
Isso o empurrou em direção a uma bolha de ar, um oásis de oxigênio que lhe permitiria realizar uma façanha impensável: sobreviver por quase 3 dias no fundo do mar. Um naufrágio que custaria a vida de toda a equipe do Jascon 4 naquele fatídico 26 de maio de 2013.
Marinheiro inexperiente
Diferentemente de muitos de seus colegas, Harrison não tinha muita experiência como marinheiro.
O cozinheiro compartilhou com o Outlook que, na verdade, “nunca tinha colocado os pés em um navio” antes de conseguir um emprego a bordo de uma embarcação em 2010.
Harrison havia sido o chef de cozinha de um hotel, o que o permitia sustentar sua esposa e filhos.
No entanto, à medida que o boom petrolífero offshore cresceu em seu estado natal, Delta State, ele percebeu que poderia ganhar muito mais dinheiro sendo chef a bordo de um dos muitos navios envolvidos na extração de petróleo do fundo do mar.
Ele lembra que sua primeira experiência não foi muito auspiciosa. “Embora eu gostasse da água, desde o momento em que entrei no navio, tive enjoo e passei três dias rastejando pelo chão, vomitando e cozinhando ao mesmo tempo”, relatou. “Mas depois de três dias, já estava perfeitamente bem, e desde então nunca mais sofri com o enjoo no oceano.”
Após esse pequeno contratempo, descobriu que era muito mais feliz trabalhando em um navio, onde só precisava servir a 12 pessoas, em vez das centenas a que estava acostumado no hotel. Além disso, o emprego marítimo tinha outras vantagens.
“Quanto mais longa é a viagem, mais você é pago, e você não gasta, não tem como gastar. Então, quando volta à terra, tem todo esse dinheiro disponível. Portanto, estava aproveitando o trabalho”, afirmou.
A perfuração de petróleo no Atlântico, ao largo da costa onde Harrison vive, oferece empregos lucrativos para os habitantes locais. — Foto: Reprodução
Apesar de sua falta de experiência, Harrison não tinha medo de viver sobre o mar.
“Eu me sentia muito bem porque gosto do ambiente, é muito tranquilo, silencioso, não há barulhos, a única coisa que você sente é o balanço do navio”, descreve.
Ele até se acostumou a amarrar todas as suas panelas e frigideiras com cordas, para que não caíssem com a maré.
Nem mesmo um pesadelo que teve, no qual seu barco afundava, conseguiu deixá-lo nervoso.
“Eu ri quando acordei, pensei: ‘Não foi real'”, contou, esclarecendo que “no sonho não morria”.
O afundamento do Jascon 4
Em maio de 2013, Harrison começou a trabalhar no Jascon 4. Embora não conhecesse o navio, ele já havia navegado anteriormente com o resto da tripulação.
“Éramos amigos, éramos muito próximos”, relata, dizendo que muitos “me tratavam como uma mãe, compartilhando comigo suas ideias e suas tristezas. Eu dava os poucos conselhos que podia para ajudá-los”.
Em 25 de maio, o rebocador havia trabalhado duro, estabilizando um petroleiro em uma plataforma da Chevron em meio a um mar agitado por uma tempestade.
Naquela madrugada, Harrison acordou e foi para a cozinha preparar as coisas, como de costume. Até que ele foi ao banheiro e de repente tudo mudou.
Ele lembra de sentir o navio afundando. “Estava afundando rapidamente. Eu estava em pânico. Ouvi as pessoas gritando, chorando. Eram cinco para as dez da manhã, então alguns dos meus colegas ainda estavam dormindo. Eles gritavam por socorro. Você podia ouvir a água borbulhando enquanto entrava nos diferentes compartimentos e depois, silêncio”.
Quando o navio finalmente encalhou no fundo do mar, a cerca de 30 metros da superfície, Harrison era o único sobrevivente. Ele estava preso em um espaço pequeno, com água até a cintura. Estava escuro e frio.
Naquele momento, ele pensou que alguém viria resgatá-lo, mas dois dias se passaram e nada aconteceu.
Ele conseguiu encontrar uma lanterna presa a um colete salva-vidas. Desesperado para escapar, nadou através de uma porta submersa até a próxima cabine em busca de uma saída. Mas não encontrou nada. Em seguida, sua lanterna se apagou e ele ficou na escuridão completa.
Ele lembra de sentir peixes comendo sua pele ferida pelos golpes durante o naufrágio. “Eu estava vestido apenas com cuecas”, explica.
“Pensei na minha esposa, na minha mãe. Passei o tempo cantando louvores”, lembra.
Foi assim por 60 horas. Sem comida nem bebida, e ciente de que o oxigênio em sua milagrosa bolha de ar estava se esgotando.
G1