Que se esperava um orçamento “inspirado em fatos reais” como se diz nos roteiros de cinema, para apartar algumas histórias de outras “baseadas” em acontecimentos verídicos, ninguém duvidava. O matemágico e ministro da Fazenda, Fernando Haddad, não poderia deixar de surpreender a audiência.
A ministra do Planejamento, Simone Tebet, vaticinou, em audiência na Comissão Mista de Orçamento realizada ontem. “Nós fizemos o encontro de contas e vimos que precisamos de R$ 168 bilhões de receita para zerar o déficit”, mas garantiu. “Eu recebi receitas suficientes para zerar o déficit fiscal, sejam já realizadas ou que estão por vir”.
Mas, mesmo lá, entre as tentativas de convencimento da platéia sobre o inacreditável déficit zero em 2024, estava a espera por um milagre. “O futuro a Deus pertence, nós não sabemos diante do imponderável. Mas tem que ser algo imponderável”, falou.
Eis que Haddad não decepcionou. Durante todo o ano, o governo sustentou que o texto que devolvia o voto de qualidade ao Carf (Conselho Administrativo de Recursos Fiscais) deveria gerar R$ 59 bilhões em receitas – corrigidos hoje no PLOA (Projeto de Lei Orçamentária Anual) para pouco mais de R$ 54 milhões.
Com a medida aprovada ontem, no entanto, Haddad tirou da cartola R$ 43 bilhões a mais. De acordo com o PLOA, a expectativa de arrecadação do tribunal administrativo deve resultar em mais de R$ 97 bilhões em 2024.
O truque? O novo relacionamento da Receita Federal do Brasil com os contribuintes. A medida aprovada ontem também flexibilizou as regras de transação (acordos entre a RFB e o contribuinte para solucionar controvérsias tributárias) e autorizou maiores descontos em casos de contencioso tributário de “relevante e disseminada controvérsia jurídica”.
E assim, o governo fez as contas fecharem e garantiu o déficit primário zero no ano que vem. Dos R$ 168 bilhões, necessários R$ 97 bilhões, ou 58% do total, depende de contribuintes se voluntariando a pagar impostos discutíveis sem levar o contencioso à Justiça comum.
Não à toa, levantamento, que circulou pela Faria Lima nesta tarde, com cálculos produzidos por uma grande corretora nacional estima que, dos R$ 43 bilhões esperados das negociações dos auditores-fiscais, zero (nada) deve entrar nos cofres do governo.
Como diria a ministra Tebet, que é a pessoa responsável pelo planejamento nacional: “o futuro a Deus pertence“.
Créditos: O Antagonista.