Empresa se tornou potência da tecnologia de internet via satélite, o que vem gerando preocupação em todo o mundo
3.ago.2023 às 7h00
Em 17 de março, o general Mark Milley, chefe do Estado-Maior Conjunto das Forças Armadas americanas, e o general Valeriy Zaluzhnyi, líder das forças armadas da Ucrânia, conversaram por telefone para discutir a invasão da Ucrânia pela Rússia. Por meio de uma linha segura, os dois líderes militares falaram sobre sistemas de defesa aérea e avaliações do campo de batalha em tempo real, e compartilharam informações sobre as perdas militares da Rússia.
Também falaram sobre Elon Musk.
Zaluzhnyi levantou o tópico do Starlink, uma tecnologia de internet via satélite desenvolvida pela SpaceX, a empresa de foguetes de Musk, disseram três pessoas informadas sobre a conversa. As decisões da Ucrânia no campo de batalha dependiam do uso contínuo do Starlink para comunicações, disse Zaluzhnyi, e seu país queria garantir o acesso ao sistema e discutir como cobrir o custo do serviço.
Zaluzhnyi também perguntou se os Estados Unidos tinham uma avaliação de Musk, que tem amplos interesses comerciais e uma posição política obscura –uma pergunta que as autoridades americanas não responderam.
Musk, que lidera a SpaceX, a Tesla e o Twitter, se tornou o protagonista mais dominante na luta pelo controle do espaço porque vem acumulando poder de forma constante no campo da internet via satélite, estrategicamente significativo. No entanto, diante da falta de regulamentação e fiscalização, seu estilo errático e orientado pela personalidade vem preocupando cada vez mais os militares e líderes políticos em todo o mundo, já que o bilionário da tecnologia às vezes exerce sua autoridade de maneiras imprevisíveis.
Desde 2019, Musk envia foguetes da SpaceX ao espaço quase toda semana, e eles colocam em órbita dezenas de satélites do tamanho de um sofá. Os satélites se comunicam com terminais na Terra, para que possam transmitir internet de alta velocidade para quase todos os cantos do planeta. Atualmente, mais de 4,5 mil satélites Starlink estão nos céus, representando mais de 50% de todos os satélites ativos. Eles já começaram a mudar a aparência do céu noturno, mesmo se não levarmos em conta os planos de Musk de ter até 42 mil satélites em órbita nos próximos anos.
O poder da tecnologia, que ajudou a elevar o valor da SpaceX, uma empresa de capital fechado, para quase US$ 140 bilhões, está apenas começando a se fazer sentir.
O Starlink geralmente é a única maneira de obter acesso à internet em zonas de guerra, áreas remotas e locais atingidos por desastres naturais. Ele é usado na Ucrânia para coordenar ataques de drones e coleta de informações. Ativistas no Irã e na Turquia tentaram usar o serviço como proteção contra controles governamentais. O Departamento de Defesa dos Estados Unidos é grande cliente do Starlink, enquanto outras forças armadas, como as do Japão, estão testando a tecnologia.
Mas o controle quase total de Musk, 52, sobre a internet via satélite gerou preocupações.
As lealdades do empresário são confusas, e ele têm uma personalidade explosiva. Embora Musk seja aclamado como um gênio inovador, cabe exclusivamente a ele decidir se um cliente ou país terá acesso ao Starlink, e o empreendedor tem a capacidade de aproveitar as informações confidenciais que o serviço coleta. Essas preocupações cresceram porque nenhuma empresa ou governo chegou perto de igualar o que ele construiu.
Na Ucrânia, alguns desses temores foram concretizados. Musk restringiu o acesso ao Starlink diversas vezes, durante a guerra, segundo pessoas informadas sobre a situação. Em um determinado momento, ele negou o pedido dos militares ucranianos para acionar o Starlink perto da Crimeia, um território controlado pela Rússia, afetando a estratégia no campo de batalha. No ano passado, ele apresentou publicamente um “plano de paz” para a guerra que parecia estar alinhado com os interesses russos.
Às vezes, Musk se vangloria abertamente dos recursos do Starlink. “Entre Tesla, Starlink e Twitter, talvez eu disponha de mais dados econômicos mundiais em tempo real em uma única cabeça do que qualquer outra pessoa”, ele tuitou em abril.
Musk não respondeu a pedidos de comentários. A SpaceX não quis comentar.
Preocupadas com a dependência excessiva da tecnologia de Musk, as autoridades ucranianas conversaram com outros provedores de internet via satélite, embora tenham reconhecido que nenhum deles se compara ao alcance do Starlink.
“O Starlink é de fato o sangue de toda a nossa infraestrutura de comunicação, agora”, disse Mykhailo Fedorov, ministro digital da Ucrânia, em uma entrevista.
Pelo menos nove países –alguns deles na Europa e no Oriente Médio— também conversaram com as autoridades americanas sobre o Starlink nos últimos 18 meses, e alguns questionaram o poder de Musk sobre a tecnologia, disseram dois funcionários dos serviços de inteligência americanos informados sobre as discussões. Poucas nações falarão publicamente sobre suas preocupações, por medo de alienar Musk, disseram autoridades de inteligência e segurança cibernética informadas sobre as conversas.
As autoridades americanas pouco disseram publicamente sobre o Starlink, enquanto tentam equilibrar as prioridades domésticas e geopolíticas relacionadas a Musk, porque é inevitável usar sua tecnologia, ainda que ele tenha criticado o presidente Joe Biden.
O governo federal é um dos maiores clientes da SpaceX, usando seus foguetes para missões da Nasa e para lançar satélites de vigilância militar. Altos funcionários do Pentágono tentaram mediar questões envolvendo o Starlink, especialmente na Ucrânia, disse uma pessoa informada sobre as discussões.
O Departamento de Defesa confirmou que tem contratos com o Starlink, mas não quis entrar em detalhes, citando “a natureza essencial desses sistemas”.
Outros governos estão cautelosos. Taiwan, que tem uma infraestrutura de internet que poderia ficar vulnerável no caso de uma invasão chinesa, reluta em usar o serviço, em parte por causa dos vínculos comerciais de Musk com a China, disseram autoridades taiwanesas e americanas.
A China tem suas próprias preocupações. Musk disse no ano passado que Pequim buscou garantias de que ele não ativaria o Starlink dentro do país, onde a internet é controlada e censurada pelo Estado. Em 2020, a China se registrou em um órgão internacional para lançar 13 mil satélites de internet.
A União Europeia, em parte motivada por dúvidas sobre o Starlink e Musk, também destinou 2,4 bilhões de euros, ou US$ 2,6 bilhões, no ano passado à construção de uma constelação de satélites para uso civil e militar.
“Não se trata de uma empresa só, mas de uma pessoa só”, Dmitri Alperovitch, especialista em segurança cibernética e um dos fundadores do instituto de pesquisa Silverado Policy Accelerator, e consultor de governos sobre internet via satélite. “Você fica completamente submisso aos caprichos e desejos dele”.
Alcançando os céus
Sir Martin Sweeting, engenheiro britânico que fundou a empresa de design e fabricação de satélites Surrey Satellite Technology, foi incentivado por um colega de trabalho em 2001 a se encontrar com um “cara que quer colocar uma estufa em Marte”. O sujeito em questão era Musk.
Logo depois, Sweeting e Musk se encontraram para tomar café da manhã em uma conferência espacial no Colorado, onde o empresário de tecnologia criticou a Nasa e falou sobre a criação de uma frota espacial privada.
“O foco dele era esse”, disse Sweeting, cuja empresa posteriormente recebeu um investimento de Musk e o teve como parte de seu conselho de administração antes de ser vendida para a Airbus em 2009.
Musk também estava interessado em um campo emergente de pesquisa, que envolvia pequenos satélites colocados no céu algumas centenas de quilômetros acima do nível do mar, uma área conhecida como “órbita baixa da Terra”, disse Sweeting.
O trabalho conjunto deles foi um dos primeiros exemplos do foco de Musk em uma tecnologia que ajudaria a sustentar o Starlink. Os satélites que datam da década de 1960 são geralmente maiores —muitas vezes do tamanho de ônibus escolares— e estão localizados em uma posição mais alta no espaço, no que é conhecido como “órbita geossíncrona”, o que limita sua capacidade de comunicação. Os satélites menores podem orbitar em uma altitude mais baixa, permitindo que se conectem a terminais na Terra para transmitir serviços de internet de alta velocidade a locais distantes.
São necessários muitos satélites pequenos para que o sistema funcione. Isso porque, à medida que um satélite se move por sobre de um terminal Starlink em terra, ele passa o sinal de internet para o satélite seguinte na cadeia, a fim de manter um fluxo único e ininterrupto para os usuários lá embaixo.
Musk colocou em órbita seus primeiros satélites Starlink em 2019. Na época, a internet via satélite era vista como uma empreitada absurda. Nas décadas de 1990 e 2000, outras empresas buscaram criar satélites de comunicação de baixa órbita com pouco sucesso, devido às despesas e às dificuldades técnicas de colocá-los no espaço.
Mas Musk tinha uma vantagem. Os foguetes da SpaceX retornam à Terra após uma viagem ao espaço e são parcialmente reutilizáveis. Isso efetivamente lhe deu o controle de um trem expresso capaz de entregar satélites ao espaço constantemente, às vezes dezenas deles de cada vez.
Agora, quase toda semana, um foguete SpaceX carregado com satélites Starlink é lançado da Califórnia ou da Flórida. Cada satélite foi projetado para funcionar por cerca de 3,5 anos. Há tantos em órbita que muitas vezes são confundidos com estrelas cadentes. Os astrônomos documentaram de que maneira os dispositivos interferem com telescópios de pesquisa e alertaram sobre o risco de colisões.
“O céu noturno é um dos espetáculos mais gloriosos que a natureza oferece e os seres humanos o estão mudando para sempre”, disse Patrick Seitzer, astrônomo da Universidade de Michigan que estuda os detritos orbitais.
O Starlink oferece velocidades de download de internet normalmente em torno de 100 megabits por segundo, comparáveis a muitos serviços a cabo. A SpaceX geralmente cobra dos clientes individuais cerca de US$ 600 por terminal que receba uma conexão do espaço, além de uma taxa de serviço mensal de cerca de US$ 75, com custos mais altos para empresas e governos. A empresa conhece a localização, o movimento e a altitude de cada terminal Starlink, segundo especialistas.
O serviço, que estreou oficialmente em 2021 em alguns países, agora está disponível em mais de 50 países e territórios, incluindo os Estados Unidos, Japão, grande parte da Europa e partes da América Latina. Na África, onde o acesso à internet está atrasado com relação ao resto do planeta, o Starlink está disponível na Nigéria, Moçambique e Ruanda, com mais de uma dúzia de outros países na fila para receber o serviço até o final de 2024, de acordo com o site da Starlink.
“Todos os lugares da Terra terão internet de alta velocidade e baixa latência”, previu Musk no podcast de Joe Rogan em 2020.
Forças armadas, empresas de telecomunicações, companhias de aviação, linhas de navios de cruzeiro e transportadores marítimos migraram para o Starlink, que afirmou ter mais de 1,5 milhão de assinantes.
Os rivais enfrentam dificuldades, embora a concorrência esteja crescendo. A OneWeb, uma empresa britânica, passou por tantas dificuldades financeiras que teve de ser socorrida pelo governo britânico e vendida a um grupo de investidores. A Amazon, fundada por Jeff Bezos, proprietário da empresa de foguetes Blue Origin, planeja um concorrente para o Starlink, o Projeto Kuiper, mas ainda não conseguiu colocar um satélite no espaço.
Salvando vidas no campo de batalha
Nenhum evento demonstrou mais o poder da Starlink —e a influência de Musk— do que a guerra na Ucrânia.
Mais de 42 mil terminais Starlink estão sendo usados na Ucrânia por forças armadas, hospitais, empresas e organizações assistenciais. Durante as campanhas de bombardeio russas no ano passado, que causaram apagões generalizados, os órgãos públicos da Ucrânia recorreram ao Starlink para permanecer online.
“Sem o Starlink, não podemos voar, não podemos nos comunicar”, disse um vice-comandante ucraniano que atende pelo apelido de Zub, ou Dente, e que falou sob condição de que seu nome não fosse revelado por motivos de segurança.
O Starlink entrou na Ucrânia em fevereiro de 2022, quando a Rússia invadiu o país e um ataque cibernético —posteriormente atribuído à Rússia— derrubou um sistema de satélite operado pela empresa de comunicações de alta velocidade Viasat que estava sendo usado pelos militares ucranianos. Com as tropas e os comandantes fora do ar, Fedorov, o ministro digital, postou um pedido de ajuda a Musk.
Em poucas horas, Musk entrou em contato com Fedorov para dizer que o Starlink havia sido ativado na Ucrânia. Dias depois, os terminais Starlink chegaram.
A tecnologia —encontrada em florestas, campos, vilarejos e montada nos tetos de veículos militares— deu ao exército ucraniano uma grande vantagem sobre as forças russas. Ela permitiu que equipes de artilharia, comandantes e pilotos assistissem a imagens de drones simultaneamente, enquanto conversavam online. O tempo de resposta entre encontrar um alvo e atingi-lo foi reduzido de quase 20 minutos para cerca de um minuto, segundo os soldados.
“O imenso número de vidas que o Starlink ajudou a salvar pode ser medido em milhares”, disse Fedorov.
Mas as preocupações entre as autoridades ucranianas e ocidentais quanto ao controle de Musk sobre a tecnologia aumentaram, chegando ao ápice no final do ano passado, quando ele fez repetidos comentários sobre a guerra que levantaram dúvidas sobre seu compromisso para com o serviço do Starlink na Ucrânia.
Em setembro, em um evento privado sobre questões internacionais e negócios em Aspen, Colorado, que contou com a presença da então presidente da Câmara dos Deputados americana, Nancy Pelosi, e outros, Musk propôs um plano de paz para a Ucrânia que incluía a anexação de terras ucranianas pela Rússia. A proposta indignou muitos dos participantes.
Por volta dessa época, surgiram dúvidas sobre quem pagaria pelo serviço do Starlink na Ucrânia. Inicialmente, a SpaceX havia coberto parte dos custos, com os Estados Unidos e outros aliados também oferecendo financiamento.
No mesmo mês, a SpaceX informou ao Departamento de Defesa dos EUA que não poderia continuar com o acordo e pediu ao Pentágono que assumisse o custeio. A empresa estimou o custo em quase US$ 400 milhões em 12 meses, de acordo com uma carta da SpaceX, reportada pela CNN e verificada pelo The New York Times.
O governo Biden instruiu um alto funcionário do Pentágono, Colin Kahl, a tentar uma mediação. Em 7 de outubro, Kahl telefonou para Musk, que expressou seu temor de que a Ucrânia usasse o Starlink não apenas para se defender, mas também para conduzir operações ofensivas com o objetivo de recuperar o território tomado pela Rússia, o que poderia causar baixas militares russas significativas, disse um ex-funcionário do governo. Kahl disse a Musk que mais pessoas na Ucrânia sofreriam se o Starlink fosse desativado.
Mesmo assim, Musk desativou o acesso a alguns terminais Starlink na Ucrânia. No final do ano passado, cerca de 1,3 mil terminais Starlink adquiridos por meio de um fornecedor britânico pararam de funcionar no país depois que o governo ucraniano deixou de pagar a taxa mensal de US$ 2,5 mil por terminal, disseram duas pessoas informadas sobre o assunto.
O acesso ao Starlink também flutuava a depender dos movimentos da guerra, à medida que a Rússia ganhava território e a Ucrânia lutava para recuperá-lo. Com a mudança nas linhas de batalha, Musk passou a usar um processo chamado “geofencing” para restringir as áreas em que o Starlink estava disponível nas linhas de frente. A SpaceX usa dados de localização coletados por seu serviço para impor limites de “geofencing”.
Isso causou problemas. Quando as tropas ucranianas tentaram retomar cidades como Kherson, em áreas controladas pela Rússia no final do ano passado, elas precisavam de acesso à internet para se comunicar. Fedorov e membros das forças armadas enviaram mensagens a Musk e a funcionários da SpaceX solicitando a restauração do serviço em áreas nas quais o exército estava avançando.
Fedorov disse que a SpaceX respondeu “muito prontamente”. Mas Musk tinha outros limites que não estava disposto a desrespeitar. No ano passado, ele recusou o pedido da Ucrânia para fornecer acesso ao Starlink perto da Crimeia, uma península controlada pela Rússia, para que os ucranianos pudessem enviar um drone marítimo repleto de explosivos a fim de atacar navios russos atracados no Mar Negro, disseram duas pessoas familiarizadas com as discussões. Mais tarde, Musk disse que o Starlink não poderia ser usado para ataques de drones de longo alcance.
Outras autoridades norte-americanas também se manifestaram. Em junho, o Secretário de Defesa Lloyd Austin aprovou um acordo com o Pentágono para comprar de 400 a 500 novos terminais e serviços Starlink. O acordo dá ao Pentágono controle sobre onde o sinal de internet do Starlink funciona dentro da Ucrânia, para que esses novos dispositivos realizem “capacidades essenciais e determinadas missões”, disseram duas pessoas familiarizadas com o acordo. A intenção parecia ser a de fornecer à Ucrânia terminais e serviços dedicados para realizar funções sensíveis sem medo de interrupções.
Ao contrário das empresas de defesa tradicionais, cujas vendas de armas para países estrangeiros são normalmente realizadas por meio do governo americano, o Starlink é um produto comercial. Isso permite que Musk aja de maneiras que às vezes não se alinham com os interesses dos Estados Unidos, como quando a SpaceX anunciou que não poderia continuar financiando o Starlink na Ucrânia, disse Gregory Allen, ex-funcionário do Departamento de Defesa que trabalhou na Blue Origin.
“Certamente faz muito tempo que não vemos uma empresa e um indivíduo como esse se posicionando abertamente contra a política externa dos EUA no meio de uma guerra”, disse Allen, que agora está no Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais.
O comportamento de Musk dividiu as autoridades ucranianas. Mykhailo Podolyak, conselheiro do presidente ucraniano Volodymyr Zelenskyy, disse no Twitter em fevereiro que a SpaceX precisava escolher um lado.
Mas Fedorov disse que as perguntas sobre a dedicação de Musk à causa eram injustas. Quando a Ucrânia estava sob forte bombardeio e enfrentando grandes quedas de energia, em novembro, Musk ajudou a acelerar a entrega de cerca de 10 mil terminais Starlink, ele disse.
“A SpaceX e Elon Musk mostraram, por meio de suas ações, de que lado realmente estão”, disse Fedorov.
De Taiwan à Turquia
Em fevereiro, dois cabos submarinos de internet que ligam a ilha principal de Taiwan às ilhas periféricas de Matsu foram cortados por navios chineses. O incidente interrompeu o acesso online em Matsu, intensificando as preocupações de que a infraestrutura de comunicações de Taiwan era vulnerável.
Taiwan, que a China reivindica como parte de seu território, parece ser o lugar ideal para a operação do Starlink. Mas o governo do país estava relutante – uma preocupação cada vez mais frequente também em outros lugares, à medida que os governos tentam avaliar o balanço entre o poder da internet via satélite em relação aos riscos de trabalhar com Musk.
As autoridades taiwanesas conversaram com a SpaceX sobre o Starlink, disse Jason Hsu, ex-legislador de Taiwan que assessora o governo em infraestrutura digital. Mas as conversas se desaceleraram em parte por causa das “enormes preocupações” com Musk, cujos interesses financeiros estão ligados à China, disse ele. Com cerca de 50% dos novos carros da Tesla sendo fabricados em Xangai, Taiwan não confiava que Musk continuaria a forneceria acesso ao Starlink se Pequim o pressionasse para desativar o serviço, acrescentou.
“Preocupa-nos que, se encomendarmos dispositivos da Starlink, cairemos em algum tipo de armadilha”, disse Hsu, agora pesquisador sênior da Harvard Kennedy School em Taipei, Taiwan. “Elon tem grandes interesses comerciais na China”.
Quando uma delegação do Congresso dos Estados Unidos visitou Taiwan em abril, o deputado Michael McCaul, republicano do Texas, presidente do Comitê de Relações Exteriores da Câmara, durante um almoço perguntou à presidente taiwanesa, Tsai Ing-wen, sobre a possibilidade de usar o Starlink, de acordo com a equipe do comitê que o acompanhou na viagem. Tsai preferiu não responder. Os assessores do Congresso concluíram logo em seguida que o serviço não era uma opção viável para Taiwan por causa dos vínculos de Musk com a China, disse a equipe do comitê.
Audrey Tang, ministra digital de Taiwan, disse que o país fechou um acordo com a OneWeb em junho e não descartou a possibilidade de trabalhar com qualquer provedor de internet via satélite. “Queremos testar o maior número possível de constelações”, ela disse.
A influência de Musk tem sido debatida em outros lugares. Na União Europeia, as preocupações com o domínio do Starlink influenciaram o bloco de 27 nações a reservar 2,4 bilhões de euros no ano passado para criar uma constelação de satélites “soberana”, a ser lançada a partir de 2027.
“O espaço se tornou um domínio altamente disputado, no qual a União Europeia deve proteger seus interesses vitais”, disse Thierry Breton, o comissário europeu que supervisiona o projeto. “A União Europeia não pode se dar ao luxo de depender de terceiros”.