Polícia divulga fotos e dados pessoais de homens detidos, acusados de delitos como poluição sonora e atentado ao pudor
A prisão de um grupo de pessoas que estava numa sauna na Venezuela revoltou ONGs e ativistas LGBTQIA+ nesta semana. No último domingo (23), a polícia venezuelana prendeu 33 homens em um local que funcionava como bar LGBT+ em Valencia, no norte do país e a cerca de 165 km da capital, Caracas.
A ação no Avalon Club, que, de acordo com meios locais, teria ocorrido sem ordem judicial, foi seguida da exposição de fotos e documentos de identidade dos presos. A corporação teria agido após denunciarem, por meio de uma chamada anônima, a ocorrência de sexo grupal no local. A Polícia Nacional Bolivariana afirma que os frequentadores se gravavam e pretendiam comercializar material pornográfico.
Os detidos, com idades entre 21 e 57 anos, foram apresentados a um juiz apenas na quarta (26), três dias após a detenção e depois de um adiamento da audiência. Só nesse momento os homens souberam que estavam sendo acusados, entre outros delitos, de poluição sonora e atentado ao pudor. O último, segundo o Código Penal, seria crime apenas se cometido em público, o que não foi o caso no último domingo.
Lá fora
As alegações das autoridades foram rapidamente rebatidas por ONGs, ativistas e familiares dos afetados.
“Ser homossexual não é delito”, afirmou a mãe de um dos detidos, em frente ao Palácio de Justiça do Estado de Carabobo, onde manifestantes se reuniram nesta quarta. A Anistia Internacional da Venezuela disse que “33 pessoas foram acusadas de homossexualidade em 2023” e, de acordo com o Observatório de Violências LGBTIQ+, funcionários do governo tentaram extorquir familiares dos presos.
“A detenção é um vestígio de quando as pessoas LGBT+ eram criminalizadas nas décadas de 1960, 1970 e 1980. É algo que não deveria acontecer, já que ser LGBT+ não é crime”, afirmou a organização.
Já a ONG Provea (Programa de Educação em Direitos Humanos Ação), segundo a qual o governo havia se comprometido com a erradicação de toda prática discriminatória contra a comunidade LGBT+, afirmou que o episódio “é um precedente que pode marcar um novo capítulo de medo e prisão para esse grupo vulnerável, que já enfrenta discursos de ódio e estigmatização de vários grupos e autoridades”.
Na quarta, 30 dos detidos foram liberados —o dono do local e dois massagistas seguem presos e devem apresentar fiadores para a sua liberação. A operação acontece no mesmo momento em que o ditador venezuelano, Nicolás Maduro, estreita suas relações com as igrejas evangélicas locais, em mais uma estratégia para se manter no poder. Por outro lado, o Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) da Venezuela anulou em março um controverso artigo do Código da Justiça Militar que previa detenção de um a três anos para os integrantes das Forças Armadas que realizassem atos homossexuais.
Não se sabe quantos militares foram condenados pelo crime —ao menos um caso foi registrado em 2013. No entanto, segundo relatos de organizações que defendem os direitos LGBT+ no país, o dispositivo era evocado com frequência por oficiais para constranger gays e lésbicas na organização.
A decisão foi vista como uma vitória por movimentos LGBT+. A ditadura era um dos poucos países latino-americanos a punir relações entre pessoas do mesmo sexo, ainda que no âmbito das Forças Armadas.