AVISO: Esta reportagem é imprópria para pessoas com menos de 18 anos, reproduz termos chulos e depreciativos usados em um contexto de violência sexual contra a mulher e pode servir como gatilho.
“É, eu comi, pô! Porque ela quis. Aonde eu forcei a mina? Eu comi a mina, ela fez chupeta pra mim e depois saí fora. Os cara continuaram lá”.
Com o avanço das investigações, Robinho admitiu que fez sexo com penetração com a vítima. A frase acima é a admissão mais clara feita pelo jogador sobre a noite do crime em Milão. O áudio, gravado por escutas autorizadas pela Justiça da Itália, faz parte do processo que condenou Robinho e seu amigo Ricardo Falco a nove anos de prisão por estupro coletivo de uma mulher em 2013.
Essa conversa, em que ele discute com Falco os depoimentos que ambos deram para a polícia, faz parte do quinto episódio de “Os Grampos de Robinho”, a quarta temporada de UOL Esporte – História. Nela, o jogador afirma que a mulher “quis”. Em outro momento, porém, os dois admitiram que a vítima estava embriagada, o que fez a Justiça decidir que houve estupro.
Os pontos principais do episódio
Com a avanço das investigações, Robinho admite que fez sexo com penetração com a vítima. “É, eu comi, pô! Porque ela quis. Aonde eu forcei a mina? Eu comi a mina, ela fez chupeta pra mim e depois saí fora. Os cara continuaram lá”, disse ele em conversa com Falco.
Falco diz que mentiu a seu advogado e à polícia sobre o envolvimento de Robinho no ato. “Dei depoimento, falei toda a verdade para o meu advogado. Só não falei que você comeu a mina”, disse o amigo.
Ao descobrir que a estratégia de Robinho era incriminá-lo, Falco ameaça mudar o próprio depoimento e implicar o jogador. “Eu sou homem até o fim, porque é o seguinte, num bagulho desse quem tem mais a perder é ele, porque eu podia chegar lá e falar assim: ‘O Robinho comeu a mina mesmo e o caralho’. É sua vida, sua profissão, você se fode”, disse Falco a Robinho.
Como Falco estava sem emprego, Robinho prometeu conseguir um cargo público ao amigo, caso os dois voltassem ao Brasil. “Se eu for voltar pro Brasil, eu te coloco pra trabalhar na prefeitura lá que é uma teta. Igual os caras… os caras ganham 2 conto.”
O quinto episódio mostra ainda o medo dos amigos com um exame de DNA feito no vestido que a vítima usava no dia do crime. Falco e Robinho temiam que o teste encontrasse seus espermas na roupa. “Eu também fiquei com medo disso aí”, conta Robinho. “O próprio advogado falou: ‘Puta?’ Eu falei: ‘Se eu não soubesse que tivesse essa porra desse vestido aí?'”
Robinho
É normal, isso aí de polícia. Querer jogar um contra o outro pra ver o que nós vai falar. Do mesmo jeito que eles jogaram você contra mim, eles vão querer jogar eu contra você. Isso é normal.
Falco
Quer saber, mano? O máximo que eu puder jogar pros caras, mano?
Robinho
É, pô, joga pra eles, joga pra eles.
Falco
Aí vou chegar no meu advogado e falar: “Posso ser sincero pra você? Eu menti um bagulho”.
Robinho
E eu, se eu fiz alguma coisa com a mina, não foi nada forçado.
Narrador
Estamos no carro de Robinho, no final da tarde do dia 23 de abril de 2014. O relógio marca 5 horas e 23 minutos.
Robinho
Tá onde? Só tá vocês dois? Porque eu tô aqui no Picanha?s. Vem você dois, não dá nada. Eu tô de meia, mané. Estava jogando bola com meu filho, tô dentro do carro. Vem até o Picanha?s, vocês dois, dá nada.
Narrador
O jogador do Milan vai estacionar o carro. Ele tem um encontro importante. A gente não sabe quem são as duas pessoas, ou “vocês dois”, que o Robinho queria encontrar. Mas depois de dois minutos com o pisca-alerta ligado, ele abre a porta do carro para um deles: Ricardo Falco.
Robinho
Tô de meia, mano. A fase do jogador. Tô descalço, igual… tá bonitinho, fez a barba, hein? E aí, moleque? Foi lá, que manda? Falar de coisa ruim, depois nós fala de coisa boa.
Narrador
A gente sabe quem é Ricardo Falco e a essa altura você também já deve saber. Ele é um brasileiro com cidadania italiana que Robinho conheceu logo que chegou em Milão. Eles estavam juntos naquela noite do ano anterior no Sio Café e estavam sendo investigados.
Falco
Não. Coisa ruim, sabe qual que é?
Robinho
Ahn?
Falco
Não, tá até mais suave pra mim, né, mano? Eu fui lá com advogado.
Robinho
Tu foi com o advogado, com o outro?
Narrador
Robinho queria encontrar Falco porque naquele mesmo dia o amigo tinha dado um segundo depoimento sobre o crime do inverno anterior. Agora ele tinha falado com o Ministério Público no Tribunal de Milão.
Narrador
Ricardo Falco tinha uma espécie de gratidão por Robinho. Ele não tinha um emprego fixo em Milão, vivia de trabalhos eventuais e de participações em campeonatos de várzea. Naquela época ele estava tendo dificuldades pra pagar o aluguel. A amizade com Robinho naqueles últimos anos tinha sido um porto seguro que ajudava Falco a navegar em um mar turbulento.
Narrador
Falco já tinha trabalhado pra Robinho e pra mulher dele e costumava frequentar a casa da família nos arredores do estádio San Siro. Ele também ia pros jogos do Milan a convite do amigo jogador.
Falco
Aí cheguei lá, né, mano? Fui lá de boa, troquei ideia com os cara…
Robinho
Achei que tu tinha dormido lá e o caralho, eu falei.
Falco
Não, eu falei a minha versão, saí de lá tarde.
Narrador
Já fazia quatro meses que os amigos estavam às voltas com aquela investigação. Durante todo aquele tempo, Falco tinha se esforçado pra proteger Robinho, porque os dois achavam que Robinho era o mais vulnerável naquela situação.
Falco
Dei depoimento, falei toda a verdade para o meu advogado. Só não falei que você comeu a mina.
Robinho
Aham.
Falco
Eu falei assim, quer dizer: “Oh, quando eu entrei, eu vi tudo o bagulho, eu tava lá.” “Robinho estava, né?” Falei pra ele: “Oh, não tava”. “Você tá mentindo”. Eu falei: “Não tava, mano, não preciso defender ninguém, não tava.”
Narrador
Os dois estavam presentes na hora do crime, os dois sabiam disso, mas Falco tentava convencer o promotor do contrário. Só que aquele depoimento marcou um ponto de virada na relação dos amigos. Foi a primeira vez que Falco cogitou que aquela investigação poderia ser uma espécie de cabo de guerra, um jogo de força em que cada pessoa envolvida puxava a corda pro seu lado.
Falco
Aí chegamos lá, ele falou pro advogado: “A linha é aquela lá mesmo, a mulher quer saber as provas.” Foi a primeira pergunta que ele fez: “Você se fida o De Souza?”
Narrador
A palavra “fida” significa “confia”. Falco foi questionado se confiava no Robinho. “Você se fida no De Souza?” Você confia no Robinho?
Falco
Eu falei: “Vou ser bem sincero pra você. Se você leva uma pessoa na sua casa, frequenta sua casa e tal, tem amizade. Você se fida?” Ela falou assim: “Pra levar na minha casa, eu me fido”. Eu falei: “Então eu me fido di lui.”
Narrador
Eu me fido di lui. Eu confio nele. Falco confiava em Robinho. Por que não confiaria no amigo?
Falco
Aí o cara falou assim: “Então pera que eu vou ler para você aqui o depoimento dele”, e aí leu. Aí foi quando eu fiquei chateado pra caralho, Neguinho. Ele falou assim: “Oh, ele não se fida de você. E segundo ele, você tá armado com a mina”. Daí, olha, posso falar um bagulho pra você? Sinceridade? Você está gastando maior caminhão com o seu advogado. O próprio cara falou: “Foi mal.” Daí meu advogado falou assim: “Mas como assim? Ele está armado com a mina e tá sendo indagado junto com o De Souza?”. O promotor falou assim: “Ele foi mal.”
Narrador
Duas semanas antes de Falco prestar o depoimento, Robinho deu o dele. E pro Ministério Público, o jogador anunciou a teoria que ele vinha construindo junto com a família e com os advogados. A teoria de que ele estava sendo acusado apenas por ser famoso, porque alguém queria tirar vantagem dele. E a mulher que acusava não estava agindo sozinha. Ela tinha ajuda de algum amigo dele.
Narrador
E esse amigo devia ser Falco. Robinho não confiava em Falco e disse isso ao promotor.
Robinho
Mas porque o que eles fazem, Ricardo? Eles não falam quem tá indagado, eu fui saber que tu tava indagado quando tu me mandou o papel. Por isso que o advogado falou: “Porra…”
Falco
Posso falar um bagulho procê, Neguinho?
Robinho
O advogado deve ter levantado o bagulho seu e falou isso aí: “Fala isso daí.”
Narrador
Ao ser cobrado pelo amigo pelo que tinha dito, Robinho culpou o advogado dele. Ele disse que só tinha acusado Falco porque foi isso que o advogado orientou. Falco aceitou essa explicação. Mas estava chateado porque ele entendeu que foi o depoimento de Robinho que fez o Ministério Público colocar o Falco como suspeito. Como indagato, investigado.
Falco
“Dia 14 do… 10/04 foi aggiornato (atualizado). Quando nós corremos atrás de você”. Eu falei: “Mas quer dizer o que”? Ele falou: “Alguma das pessoas que depôs foi contra você.”
Robinho
Quem?
Falco
Aí foi quando ele leu o que você falou, mano. Que eu estava de acordo com a mina. Segundo você, estava de acordo com a mina, armando pra te foder e tal, tal, tal. Falou: “Segundo o depoimento do De Souza, a gente começou a te indagar por causa disso.”
Robinho
Segundo o meu depoimento?
Falco
Te juro, mano, te juro por Deus, Neguinho. Pergunta pro Bruno, falei: “Caralho, Bruno!”
Robinho
Ela te inda… como que ela te indagou segundo o meu depoimento se antes de eu depor tua foto já tava lá?
Narrador
Quando prestou depoimento, Falco começou a entender a dinâmica das forças daquele cabo de guerra. De um lado estava ele, tentando proteger o amigo famoso a todo custo. E do outro estava o amigo famoso, tentando se proteger a todo custo. Os policiais e promotores observavam a disputa, esperando um momento em que a corda fosse arrebentar. Porque a corda sempre arrebenta em um dos lados.
Narrador
E mesmo nessa situação desconfortável, Falco não deu sinais de que fosse soltar.
Falco
Pra você ver, Neguinho. Eu falei pro Bruno: “Na moral? Mano, vamos supor, não sei, o Neguinho pode ter falado esse bagulho, fez o do advogado, acredito eu, Bruno. Agora não vou botar uma fé. Como que o Neguinho vai lá falar mal de mim e o cara mandou uma mensagem falando que vai me dar moral para ir pro bagulho? O bagulho não tá assim. Ou ele entrou na minha cabeça.
Robinho
Exato.
Falco
Eu falei: “Bruno, eu sou homem até o fim, porque é o seguinte, num bagulho desse quem tem mais a perder é ele, porque eu podia chegar lá e falar assim: ?O Robinho comeu a mina mesmo e o caralho?”. É sua vida, sua profissão, você se fode. Eu falei: “Bruno, mas é o seguinte, independente se ele falou ou não, se eu não trombar mais ele, vou guardar pra mim.” Mas é o seguinte: eu vou ser homem até o fim. Não vou chegar lá e falar…
Robinho
E também não tem nada a ver.
Falco
Eu sou homem, né, Neguinho?
Narrador
Falco era homem, Robinho era homem. E ao se verem acusados de estupro, os amigos agiram como os homens geralmente agem nessas situações.
Robinho
A gente se preocupa, Ricardo, porque a gente, porra, tem uns bagulho, tu tem que viajar, tá tranquilo. Mas, com todo o respeito, isso aí não vai dar em porra nenhuma.
Falco
Não vai dar mesmo.
Robinho
A mina sabe, ela sabe que tu não fez porra nenhuma com ela, ela é idiota? A gente vai dar um soco na cara dela. Tu vai dar um murro na cara, vai falar: “Porra, que que eu fiz contigo? Eu fiz alguma coisa?” E eu, se eu fiz alguma coisa com a mina, não foi nada forçado.
Abertura
UOL Esporte Histórias – EP 5 – Promessas, traições e um soco na cara dela
Por Janaina Cesar e Adriano Wilkson
Narrador
Esse podcast está chegando no final. A gente escolheu contar a história da investigação que condenou dois amigos brasileiros a partir dos áudios gravados das conversas deles.
A primeira conversa gravada aconteceu no dia 3 de janeiro de 2014. No dia 23 de abril, foi gravada a última, pelo menos a última que foi anexada ao processo e que foi cedida pra gente pelo Tribunal de Milão. É justamente essa conversa entre Robinho e Ricardo Falco no carro que estamos mostrando agora. Ela tem um total de 55 minutos e foi dividida em dois arquivos no sistema do tribunal.
Narrador
É uma conversa longa e repetitiva. Os amigos repassam de novo versões e argumentos que eles já vinham levantando nas conversas anteriores. Essa gravação é um retrato de Falco e Robinho quatro meses depois de eles saberem que estavam na mira da Justiça. Eles estavam abalados, desconfiando do que um estava dizendo sobre o outro por aí.
Robinho
É normal isso aí de polícia. Querer jogar um contra o outro pra ver o que nós vai falar. Do mesmo jeito que eles jogaram você contra mim, eles vão querer jogar eu contra você. Isso é normal.
Narrador
Robinho estava tentando se defender e acusando a polícia de causar uma cisão na amizade com Falco. Já Falco queria entender por que ele tinha dado o primeiro depoimento como testemunha e agora estava como investigado. A gente lembra que Falco era um amigo da vítima, que estamos chamando de Helena.
Narrador
De fato, no depoimento que ela deu, Falco não aparecia como um dos suspeitos. Ele só entrou no alvo da polícia depois.
Robinho
Mas é bom tu me falar isso que eu vou falar pro cara, vou falar: “Stefano, como que a mulher falou que a partir do meu depoimento ela indagou o Ricardo sendo que antes deu depor alguma coisa eu já vi a foto dele lá como indagado?”
Falco
Eu falei pro Bruno: “Aí Bruno, na moral, eu espero de coração, que o Neguinho tenha falado esse bagulho aí por influência do advogado, pra defender ele. Porque se ele acha um bagulho desse mesmo, vai contra mim”. Porque eu vou falar pra você, Neguinho.
Robinho
É, tu sabe que se eu tivesse… se eu achasse qualquer tipo de bagulho desse tipo, nem trocar ideia contigo, eu trocaria.
Falco
Exato, eu vou falar um bagulho pra você.
Robinho
Mas agora, é bom tu ter falado isso aí, que eu vou falar isso aí pro Stefano. Vou perguntar para ele se isso daí é estratégia da polícia pra ver se de repente fala: “Não, vou fazer o Ricardo ficar puto com o Neguinho, o Neguinho fica puto com ele, e o Neguinho vai falar tal coisa, o Ricardo vai falar tal coisa, entendeu?”
Falco
Posso falar, mano? Não precisa estudar para ser inteligente. Eu cheguei à conclusão que a defesa que seu advogado usou para defender você foi a pior de todas. Ele quer tirar o sofrimento das suas costas, jogar no meu, conclusão: ele quer provar pros caras que eu sou armado com a mina e que eu te levei, apposta para comer ela e fazer essa putaria pra falar assim: “Pô, então realmente…”
Robinho
Pô, isso aí não existe. Como apposta?
Narrador
“Apposta” é uma palavra que significa “com a intenção de”, “com a finalidade de fazer algo”. Como se Falco tivesse apresentado Helena a Robinho com a intenção de armar um golpe contra o amigo.
Falco
Não, tipo assim, modo de dizer, “ele armou com a mina pro Robinho comer a mina, pra mina denunciar esse bagulho”. Aí o seu advogado tá pensando o quê? “Eu vou dar um jeito de armar que ele arrastou o Robinho mesmo, Robinho está livre, ele segura a onda dele.”
Robinho
Eu vou dar essa ideia nele.
Narrador
Não existiu ao longo das investigações nenhum indício que levasse os promotores a comprar essa tese. Para os investigadores, Robinho nunca foi vítima de nenhum golpe ou tentativa de golpe. Diante dessa acusação injusta, Falco cogitou mudar seu depoimento e implicar Robinho nele. Mas no final das contas, escolheu se manter fiel ao jogador. Ele manteve o que vinha dizendo desde o começo pra polícia e pro MP: que Robinho não tinha participado de maneira nenhuma do crime.
Falco
Ele falou assim: “O Robinho viu?” Por isso eu falei pra você que eu fiquei chateado de você ir falar lá pros cara. Eu falei assim pro Bruno: “Vou falar pro meu advogado a verdade. Eu vi o Robinho lá.” Até nisso eu tirei, porque, mano, pra mim, eu vou falar um bagulho pra você, Neguinho: eu dou prioridade às amizades, mano.
Robinho
Lógico, lógico.
Falco
Sua amizade pra mim não vale 50, 100 mil euros, porra nenhuma. Já falei isso pra você.
Robinho
Claro, claro.
Falco
Amizade acima de tudo, mano. Então se eu puder defender, vou defender. Aí ele falou: “Então chega lá e falar essa verdade sua.”
Narrador
Entre os seis amigos que atacaram Helena em janeiro de 2013, Robinho e Falco eram os únicos que moravam na Itália. Os outros quatro eram amigos antigos do jogador, mas moravam no Brasil e estavam apenas passando férias em Milão. A amizade entre Robinho e Falco ia além das festas que frequentavam. Como Falco estava em dificuldades financeiras, Robinho tinha prometido ajudar ele, pagar algumas contas dele.
Narrador
“Dar uma moral”, como eles costumavam dizer.
Narrador
E mais do que isso: Robinho estava fazendo contatos para que Falco saísse da Itália e conseguisse um emprego nos Estados Unidos. Esse assunto já tinha aparecido em gravações anteriores, mas agora, no final de abril, os amigos voltaram a tratar disso.
Robinho
E outra coisa, agora vamos falar de coisa boa, senão eu esqueço. O César falou que? pra te levar pra lá e o caralho. Aí eu te dei a moral. Eu falei: “Porra, leva o moleque, pô, dá moral pro moleque, o caralho.” Ele falou: “Eu conheci ele através de você. Posso levar ele?” Falei: “Porra, malandro, não vai poder, caralho? Leva porra.” Mas tu tá com teu passaporte? Tá onde?
Falco
Eu fiquei até meio assim porque eu mandava mensagem no pa… falei: “Mas será que o Neguinho falou algum bagulho, que eu dei uma mancada com ele, esse bagulho aí?”
Robinho
Não, tá louco? Tá louco?
Falco
Aí ontem ele mandou uma mensagem. Eu falei: “César, aquele bagulho da passagem, você falou pra mim que ia me dar passagem, tá de pé? Porque eu tô agilizando pra sair fora.”
Robinho
Ele escreveu aqui, pô:
Narrador
Robinho relata uma troca de mensagem entre ele e essa pessoa chamada César, que seria alguém que poderia levar Falco pra Miami.
Robinho
“Arruma emprego pra ele lá, pô, em Milão tá ruim”, eu falei. Se tiver documento, se tu tiver documento, já era. “Se ele precisar também dou dinheiro”, eu falei pra ele. Eu falei: “Se precisar dar uma moral pra ele lá, para ele se manter no começo, o caralho, dou mil euros pra tu se manter lá.”
Narrador
Robinho já tinha ajudado Falco outras vezes, e parecia provável que ele pudesse ajudar ainda mais. Falco queria trabalhar como faz-tudo de jogadores brasileiros na Itália, assim como Jairo e o amigo Bruno faziam. Esse amigo Bruno, citado na conversa, é só um amigo do grupo, mas sem relação com o processo. No começo do mês, Robinho tinha prometido tentar um trabalho pro Falco com o volante Hernanes, que estava na Inter de Milão. Os jogadores se conheciam da seleção brasileira. Em paralelo, Falco tentava conseguir algo com um funcionário do Milan que ele conhecia.
Narrador
Falco disse que não pensava em voltar pro Brasil, ao menos enquanto não conseguisse levantar dinheiro suficiente para abrir um negócio. Robinho disse que poderia conseguir um emprego pra ele.
Falco
Já não tinha a piração de ir pro Brasil, que nem… não estudei, porra nenhuma, estudei em colégio normal. Não faculdade, nada. Ai eu piraria em voltar pro Brasil estruturado, chegasse lá e falar assim: “Não vou precisar morar no apartamento do meu pai. Vou comprar meu apartamento só meu. E vou montar um barato pra mim que eu consiga arrumar uns 5 mil reais, que eu vivo legal, de boa, tranquilo”. Aí eu já tava nesse pensamento. O dia que que falei com o meu irmão, meu cunhado…
Robinho
Se eu for voltar pro Brasil eu te coloco pra trabalhar na prefeitura lá que é uma teta. Igual os caras… os caras ganham 2 conto.
Falco
Porra, aí bom mesmo, lindo.
Narrador
Se eu for voltar pro Brasil eu te coloco pra trabalhar na prefeitura lá que é uma teta. Igual os caras… os caras ganham 2 conto. A gente não sabe de qual prefeitura Robinho está falando, mas fica claro que ele disse ter usado a influência dele pra conseguir um emprego público pros amigos.
Narrador
A verdade é que Falco já não queria mais morar na Itália. Ele fazia planos pra sair do país ao mesmo tempo em que a polícia e o Ministério Público investigavam o grupo. Robinho também tinha planos de deixar a Itália e negociava uma transferência com times de outros países. Ele não queria voltar pro Brasil, ao menos por enquanto. Achava que ainda podia jogar alguns anos no exterior antes de voltar.
No meio de tudo isso, acontecia a investigação. Nos depoimentos, Falco estava fazendo de tudo pra tirar Robinho da cena do crime. Ele disse que Robinho tinha saído antes de todo mundo da boate e que nem sequer viu o que os amigos brasileiros fizeram com Helena.
Narrador
Os dois sabiam que aquilo era mentira, mas apostavam que a polícia não tinha como descobrir o que de fato aconteceu. Eles se certificaram de que não tinha câmeras na boate e Robinho parecia ter certeza que a polícia não ia encontrar nada nos equipamentos dele.
Robinho
Eles também tão com meus bagulho, estão com meu iPad ainda.
Falco
Tá lá ainda?
Robinho
Porra, não quer devolver meu bagulho.
Falco
Só que os seus bagulho é tudo bloqueado, né? Ou entra automático?
Robinho
Não, mas não tem nada. E-mail… como que o cara vai mandar e-mail pra falar disso?
Falco
Mas no seu tablet lá, Facebook você não trocou ideia com os caras…
Robinho
Não, eu não tenho Facebook.
Falco
De repente entra direto, os caras dá um migué.
Robinho
Não, mas mesmo que não entre direto, os caras têm senha, eles desbloqueia, mas o bagulho é o seguinte, eu não falo, não tem nada, está limpinho. No máximo, o que eles vão achar é foto dos cara.
Narrador
Como eles eram os únicos dos seis que estavam na Itália, os únicos que estavam de fato respondendo ao processo, Robinho e Falco já tinham uma estratégia caso fossem mais pressionados pelos investigadores. Até então eles estavam sustentando que não tinham visto nada de criminoso naquela noite. Mas se essa estratégia não desse certo, eles já desenhavam um plano B: colocar toda a culpa nos quatro amigos que estavam no Brasil.
Robinho
Você quer que eu te fale a real? As únicas coisas que eu acho que deve ter: Claytinho e Rudney. Nem o Galan tocou na mina que é lixo. O próprio Alex, que é mó lixo… Agora Claytinho, Rudney ficaram desesperados na mina. Nós tava em pé, tava em pé, rindo. Nós tava em pé, rindo, pô!
Falco
Meu advogado perguntou: “Mas quem fodeu a mina?” Falei: “Quando eu entrei tava Claytinho, Alex e o Rudney”. “E o Fabio?” “Na moral…”
Robinho
Te perguntaram se a mina tava mamada?
Falco
Não, porque eu dei o mesmo depoimento, ele só confirmou. Não precisava falar nada. O cara leu meu depoimento, o advogado. “Confirma?”, “Confirmo”. Aí o bagulho que eu falei também, de passar um pano para nós. Eu falei assim: “O seu Clayton já conhecia a menina de um ano que ele veio e eu vou ser sincero pra vocês, depois que acabou o bagulho, ficamos trocando ideia lá e tal. Ela tá falando que tava bêbada, que os cara abusou dela. Vou falar um negócio pro senhor: “Dentro de uma discoteca, um monte de gente, ninguém vai pegar a pessoa no meio da pista, a marra, na força.?”
Narrador
O Ministério Público também denunciou Clayton Santos, Alex Silva, Rudney Gomes e Fabio Galan por violência sexual de grupo, o mesmo crime imputado a Robinho e Falco. Mas como eles não foram encontrados na Itália, o processo deles foi desmembrado e não pôde continuar, até hoje. Existe uma lei na Itália que impede um réu de ser julgado se ele não for comunicado oficialmente pela Justiça sobre a existência do processo.
Em 2014, o Ministério Público foi atrás dos amigos na casa de Robinho em Milão, já que esse era o endereço conhecido deles no país. Mas os brasileiros já não estavam mais lá, já tinha mais de um ano. A defesa de Robinho chegou a entregar os endereços dos amigos no Brasil, mas a Itália nunca conseguiu encontrar eles.
Narrador
Dez anos depois do crime, dá pra dizer que os quatro conseguiram escapar do processo, do julgamento e de qualquer responsabilização usando uma estratégia simples: voltar pro Brasil e ficar longe da Itália.
Falco
“E os cara?” Eu tinha falado no depoimento, leva embora, depois que eu fui ver. “Depois que eu fui ver, o Galan chegou”, falei. “O Galan chegou por trás e falou pra mim.” Só que daí no dia lá eu falei: “O Robinho me salutou. Olhei e não tinha ninguém.” Ele falou: “E a mulher?” “Não tinha.” Também falei assim: “Eu não vou falar pra você, ?eles comeram, não comeram?, porque eu não vi. Mas que é uma coincidência, é. Porque sumiu os caras e a mina. Aí eu falei: “Quer saber, mano? O máximo que eu puder jogar pros caras, mano…”
Robinho
É, pô, joga pra eles.
Falco
Se eu sair fora daqui, os caras não vai vir nunca mais pra Itália, mano. Os caras vão vir passear aqui na Itália?
Robinho
É, eles não vão. Eu joguei pra eles.
Falco
Eu falei assim: “Sumiu mesmo, a mina com os caras. É muita coincidência.” Aí o cara falou: “Não, se você não viu, não precisa falar. Você viu que eles sumiram tudo junto?” “Eu olhei que não tinha mais ninguém, nem os caras, nem a mina. Mais ninguém.”
Narrador
Em abril de 2014, Robinho e Falco pareciam ter muita confiança na absolvição. Era o que eles estavam repetindo pra si mesmos nas conversas por telefone e dentro do carro. Não tinha provas de que eles fizeram alguma coisa contra a mulher que acusava eles. Seria sempre a palavra dela contra a palavra deles.
Narrador
Mas tinha uma coisa que estava tirando a tranquilidade de Falco. Um vestido. O vestido que Helena usava no dia do crime. A prova que podia fazer todos aqueles depoimentos serem jogados no lixo. É sobre isso que a gente vai falar depois do intervalo.
[intervalo]
Narrador
Ricardo Falco estava muito preocupado com as provas que podiam aparecer. E foi por isso que ele criticou a postura do advogado do Robinho.
Falco
Meu advogado é embaçado também. Ele falou assim: “Posso ser sincero? O Robinho veio aqui, né? Com o advogado e tal tal tal. De cara: foi mal o advogado de instruir ele sem pedir as provas, o barato e tal.”
Robinho
Mas é porque eles não dão prova, não, Ricardo, eles não…
Falco
Ele falou pra mim, a hora que eu cheguei lá. Ele falou: “Você quer saber? Tem um vestido.” E aí o cara falou se ele quer saber o depoimento do outro.
Robinho
Mas então, eles não dão prova.
Falco
Ele deu tudo.
Robinho
O advogado falou: “Qual é a prova que tem? Até porque a mina não tem prova nenhuma.”
Falco
O vestido.
Robinho
Só o vestido.
Falco
Fui fazer exame hoje.
Robinho
Você vai fazer exame?
Falco
DNA.
Robinho
Então.
Falco
Você foi? Te chamaram?
Robinho
Não [risos]
Falco
Vou falar pro meu advogado: “Como que eu vou toda hora e o cara não vai?”
Robinho
[Risos]
Narrador
O vestido. É assim que ele é descrito no processo: “Um vestido da marca Guess – Los Angeles, vermelho, de poliéster, tamanho XS, pertencente à vítima e usado no dia em que ocorreram os eventos. O vestido, com saia na altura dos joelhos e mangas no antebraço, apresenta botões na parte frontal e duas fitas para amarrar um laço no pescoço. Segundo o processo, o vestido foi mergulhado pela vítima em água e amaciante. No entanto, foram identificados vestígios de interesse nele.”
Falco
Aí o cara leu o seu depoimento e falou assim: “A prova que eu tenho é um vestido em sequestro.” Aí eu fingi que não sabia. Eu falei: “Ah, va bene” “Faz o exame?” Falei: “Tranquilo.”
Robinho
O vestido em sequestro?
Falco
É o vestido, é a blusa dela em sequestro, que eles sequestraram.
Narrador
Antes de sair do MP, Falco aceitou entregar uma amostra de saliva de onde a polícia ia extrair o DNA dele e comparar com o que tinha sido encontrado nos “vestígios de interesse” na roupa da Helena. Robinho tentava tranquilizar o amigo.
Robinho
Mas, Ricardo, não é possível que ela foi logo depois, não é possível, Ricardo. Não é possível. Graças a Deus não deu nada. Também acredito que pra você não vai dar nada, vai dar pros moleques. O sufoco já passou de tu ir lá e voltar.
Falco
Mais ou menos. Eu vou ter que ir lá de novo, Neguinho. Porque o exame meu, tenho certeza que algum bagulho vai constar.
Robinho
Vai constar que tu dançou com a mina.
Falco
Não, vai constar, porque tava lá daquele jeito, batendo punheta e o caralho, certeza que raspou, vai ter algum bagulho, vai ter. Ele falou assim: “Se raspou e estiver com a cabeça do pau melada algum bagulho vai constar.”
Narrador
A história que Falco tinha contado pro promotor era clara, ao menos na mente dele. Ele estava na boate, viu Helena ficando com um dos amigos e se despediu de Robinho, prometendo levar os outros brasileiros de volta pra casa. Robinho foi embora. De repente, Falco já não via mais Helena, nem os amigos. Só um tempo depois ele encontrou Helena chorando, sem explicar o motivo do choro. Ele deu carona pra ela até uma segunda boate, onde ela encontrou outra amiga, que levou ela embora pra casa.
Mas aquele discurso só faria sentido se Helena não tivesse entregado ao MP o vestido que ela usava naquela noite.
Falco
Só que a minha preocupação é essa, Neguinho. Porque é quase certeza que vai pegar algum bagulho no meu…
Robinho
Mas você dançou com a mina, Ricardo, se quiser aquela foto eu te mando.
Falco
Não, não, não. Aquela foto lá é de boa…
Robinho
Porque aí dá pra te defender, falar: “Ó, dancei com a mina.”
Falco
Na hora que eu estava lá doidão, pá, batendo a punheta…
Robinho
Tu gozou na mina?
Falco
Então, eu não sei, mano, eu já nem lembro se escorreu uma gota ou não…
Robinho
Eu também. Isso aí eu também não lembro.
Falco
Mas meu medo é esse. Meu medo é esse. Aí, o que eu tô pensando? Vou trocar uma ideia com meu advogado: “Mano…”
Robinho
Tu vai lá quando agora? Tu armou ou tu não vai precisar ir mais?
Falco
No bagulho não, eu fiz o exame hoje. Certeza que a hora que sair o resultado do exame os caras vão me chamar.
Robinho
Quando vai sair o resultado?
Falco
Não sabe. Pode ser durante 30 dias. Aí vou chegar no meu advogado e falar: “Vou ser sincero pra você. Eu menti um bagulho. Eu vi tudo, mas eu tava lá tirando um barato. Eu não lembro se eu gozei, se encostou alguma coisa.”
Robinho
O teu advogado?
Falco
É. Eu tô meio assim, achando que caiu um bagulho, pode ter caído na mina.
Robinho
Espera vir o resultado, tu fala.
Falco
Mas sabe qual o problema, Neguinho? Mano, eu tenho tipo 80% na minha cabeça que pode ter constado algum bagulho meu. Aí sai o resultado. “Ah, tem esperma dele.” Aí depois do resultado eu vou lá mudar? A hora que os caras me chamar lá pode ser foda. Eu prefiro. Porque ele falou: “Se você só assistiu não dá nada.”
Narrador
A hora que os caras me chamar lá pode ser foda. Eu prefiro. Porque ele falou: “Se você só assistiu não dá nada.”
Narrador
O medo de ter um resultado positivo no exame de DNA fez Falco querer mudar o depoimento dele. Ele queria dizer que na verdade viu os amigos transando com Helena, mas não participou ativamente do ato, apenas se masturbou. Na cabeça dele, isso seria uma boa explicação, caso o esperma dele fosse de fato encontrado no vestido.
Foi também o vestido, ou melhor, o medo do vestido provar o que tinha acontecido naquela noite, que fez Robinho admitir mais do que ele gostaria. No depoimento que ele deu ao MP, ele acabou reconhecendo ter feito sexo oral com Helena. Segundo Robinho, tudo com o consentimento dela.
Robinho
Mas Ricardo… é o Jairo aqui atrás? Mas os caras não sabe, Ricardo. Eu também fiquei com medo disso aí. O próprio advogado falou: “Puta…” Eu falei: “Se eu não soubesse que tivesse essa porra desse vestido aí…
Falco
Você ia falar que não tocou na mina…
Robinho
Eu nem toquei na mina, nem toquei na mina.
Falco
Mas eu acho que é por isso que não chamaram você pra fazer exame. Ou é porque você é o Robinho ou porque você assumiu que a mina fez uma chupeta pra você. Então os caras vão falar: ele assumiu que fez a chupeta? Então certeza que algum bagulho dele vai ter.
Robinho
Não, eles falaram que se precisar, mais pra frente, vai fazer exame. Se precisar…
Narrador
A gente teve acesso ao relatório do depoimento, dado por Robinho no dia 10 de abril de 2014. Durante os julgamentos nas três instâncias, ele optou por não estar presente e não ser ouvido. Nesses julgamentos, ele foi representado por advogados que apresentaram a defesa dele por escrito e oralmente.
Mas antes do caso chegar aos tribunais, ele deu a versão dele ao MP. O trecho a seguir é parte do que Robinho disse no depoimento ao promotor Stefano Amendola em abril de 2014. A transcrição está em um documento produzido pelo promotor durante a investigação. Ele usou o nome real da vítima, mas a gente substituiu esse nome pelo pseudônimo que a gente está usando.
A gente pediu ao Daniel Neri, nosso colega aqui no UOL, pra dar voz ao depoimento do Robinho.
Robinho
Não conheço Helena, não é minha amiga. Lembro de ter visto uma garota que dançava no dia 22 de janeiro de 2013. Eu não conhecia o nome e penso que seja a Helena, indicada na denúncia. Não falei com ela e não sentei com ela pra beber.
Não lembro que estivesse bêbada. Em certo momento, ou melhor, no final da noite, mais ou menos 1h30 / 2h da manhã, a garota quis me conhecer, provavelmente por causa da fama que eu tenho como jogador. Eu comecei a falar um pouco com ela depois que parei de tocar. Depois ela me chamou pra dançar, me fazendo entender que gostava de mim, tentando me seduzir. Então eu chamei ela para vir comigo em um lugar um pouco mais reservado da discoteca para evitar ser visto naquelas circunstâncias. Ela me fez sexo oral por cinco, dez minutos. Acho que não gozei e muito menos que sujei o vestido.
Durante a relação sexual nós estávamos sozinhos. No final da relação oral a garota ficou na discoteca e eu voltei para casa com meu carro Audi. A garota não pediu meu número de telefone e nem algum contato para poder me encontrar ou rever. Antes de ir embora eu vi essa mesma garota dançando com o Alex. Alex é meu amigo brasileiro. Ele nasceu no Brasil, em São Vicente. O nome completo é Alexsandro da Silva. Me comprometo a fornecer exatamente o nome do meu amigo através do meu advogado.
Eu não falei pro Alex da relação oral que tive com a menina e nem o Alex me disse se teve alguma relação sexual com essa mulher. Naquela noite estávamos eu, Alex, Fábio Galan, Rudney Gomes da Silva e Clayton Santos. Esses são os meus amigos. Naquela noite a gente estava comemorando o aniversário do Rudney.
Também estava na discoteca o Ricardo Falco que eu pouco conheço. Ele não é meu amigo e não sei onde ele trabalha. Não confio nele, só sei que ele mora em Milão. Me comprometo a fornecer exatamente o nome dessas pessoas através do meu advogado.
Eu encontrei o Ricardo Falco por acaso no estádio e no restaurante nos últimos tempos. Quando cheguei na Itália eu falava e via muito mais o Ricardo Falco do que no ano passado. Recentemente falei com ele quando eu estava no Brasil, durante as férias, pouco depois de ele ser convocado na Questura. Ele queria me avisar que eu e os meus amigos tínhamos sido acusados de alguma coisa por aquela noite na discoteca. Eu não confio nele. Disse a ele que não tinha feito nada e que ele ligasse pros outros. Depois dessa ligação não falamos mais sobre os fatos pelos quais hoje estou sendo acusado. Nunca falei com os meus amigos Alex e Fábio sobre os fatos pelos quais estou sendo acusado. Com os outros dois é impossível porque eu não tenho o número deles.
Na Inglaterra fui acusado de uma violência sexual contra uma menina, mas graças a câmeras de vídeo fui liberado. O advogado se compromete a produzir documentos relacionados ao fato.
Eu tinha outro telefone, diferente daquele oficial que eu usava em janeiro de 2013. Assim eu podia ser contatado e encontrar outras mulheres diferentes da minha esposa. Por este motivo eu deixava o telefone com Fabio Galan. Não sei se Helena foi contatada por esse celular.
Narrador
No final, o promotor fez uma anotação sobre o depoimento: “?O acusado diz estar preocupado porque não entende como essa história veio à tona depois de tanto tempo, já que aconteceu em janeiro de 2013. Ele não confia em Falco e nem nas outras pessoas que estavam na discoteca. Ele acha que alguém pode ter manipulado a garota.”
Narrador
Esse depoimento aconteceu no dia 10 de abril de 2014. No dia 23, Falco deu o depoimento dele e entregou uma amostra de saliva. Em julho, Robinho enfim foi chamado pra colher a dele. Em agosto, Helena também entregou uma amostra de saliva à polícia.
Narrador
Em outubro, o resultado do exame de DNA saiu. Em um relatório de 40 páginas, o doutor Roberto Giuffrida, diretor técnico do Gabinete Regional de Polícia Científica da Lombardia, detalhou o exame que foi feito no vestido que Helena usou naquele dia.
O vestido estava em posse da polícia desde julho de 2013, quando a própria Helena entregou a peça. Ele já tinha sido lavado com água e amaciante, mas mesmo depois de seis meses ainda era possível encontrar resquícios de material biológico em nove pontos diferentes.
Narrador
Neles a polícia encontrou vestígios biológicos de uma mulher e vestígios de sêmen de dois homens distintos. O DNA feminino era idêntico ao de Helena. Ou seja, ficou comprovado que o vestido estava ligado a ela.
A polícia então passou a analisar os traços masculinos. Uma das amostras tinha o perfil genético idêntico ao de Ricardo Falco. Ou seja, ficou comprovado que o esperma dele estava mesmo no vestido de Helena.
O diretor técnico da polícia escreveu: “A comparação realizada confirma a presença na mencionada amostra de fluido seminal do suspeito Ricardo Falco.”
Narrador
Mas quando a polícia examinou a outra amostra e comparou ela com o DNA de Robinho, o resultado foi negativo. O diretor escreveu: “O perfil genético do suspeito Robson de Souza é diferente daquele do indivíduo da amostra 2. Isso significa que Robson de Souza e o indivíduo do sexo masculino da amostra 2 são pessoas diferentes.”
Narrador
O resultado era claro: Ricardo Falco tinha participado de atos sexuais com Helena, o que ele vinha negando nos depoimentos. Sobre Robinho, o exame não era definitivo a respeito da participação dele. O teste dizia apenas que ele não deixou traços biológicos no vestido que Helena usava. Mesmo assim, era uma boa notícia pra Robinho, que naquele momento já estava no Brasil, jogando pelo Santos, depois que as negociações com times estrangeiros fracassaram.
Mas o resultado do exame não tirou Robinho da lista de suspeitos. Com o papel em mãos, os investigadores voltaram as atenções às várias horas de gravações entre ele e os amigos. A comparação agora era entre o que ele tinha falado pro promotor e o que ele estava falando pros amigos.
Narrador
Se o vestido não disse muita coisa sobre a participação de Robinho naquela noite, o Ministério Público prestou mais atenção no que saía da boca dele.
Narrador
Uma vítima de estupro pode se sentir muito sozinha nos primeiros dias.
Narrador
Ela pode não ter muitas pessoas pra quem contar o que aconteceu.
Narrador
Ela pode não ter ninguém a quem recorrer.
Narrador
Ela certamente sente dor, mas também pode sentir culpa.
Narrador
Ela pode sentir vergonha e em muitos casos desespero.
Narrador
Ela pode ter certeza do que aconteceu, mas ela tem provas?
Narrador
Ela tem a palavra dela, mas o que mais? Ela precisa de mais.
Narrador
Helena tinha também muita coisa contra ela.
Narrador
Era a palavra dela contra a palavra deles.
Narrador
Seis deles.
Quando Helena foi fazer a denúncia no Ministério Público de Milão, em maio de 2013, ela precisou se esforçar pra reconstruir os fatos que na memória se perdiam. Não bastava ter sofrido o trauma. Era preciso sofrer o trauma de novo.
Narrador
Como ela tinha bebido muito naquela noite, Helena lembrava de flashes. E um desses flashes, o flash que ela lembrava com mais nitidez, mostrava Robinho e Alex abusando dela.
O promotor escreveu no papel o que ela disse.
Narrador
A posição do Alex. A posição dela. A posição do Robinho.
Narrador
O que o Alex fez. O que o Robinho fez.
Narrador
E o que ela não conseguiu fazer.
Narrador
Era a palavra dela, mas o que mais ela tinha?
Narrador
Quando Robinho soube meses depois que estava sendo acusado de estupro, ele primeiro riu. E depois emendou uma sequência de explicações contraditórias entre si.
Narrador
Ele disse que nunca tinha visto Helena.
Narrador
E depois, que viu Helena e até dançou com ela.
Narrador
Ele disse que saiu mais cedo da boate e não viu nada.
Narrador
E depois, que viu os amigos transando com ela.
Narrador
Ele disse que Helena estava muito bêbada pra lembrar.
Narrador
E depois, que ela sabia muito bem o que estava fazendo.
Narrador
Ele disse que ela fez sexo oral nele porque ela quis.
Narrador
E depois, que sexo oral não é sexo.
Narrador
No dia 23 de abril de 2014 ele disse o que o MP provavelmente considerou a declaração definitiva dele sobre o assunto. Robinho e o amigo Ricardo Falco sabiam que estavam com os telefones grampeados pela polícia e estavam evitando se ligar.
Narrador
Mas quando eles se encontraram no carro de Robinho, eles não sabiam que o carro também estava grampeado. Eles não sabiam que estavam produzindo as principais provas contra si mesmos.
Falco
Como ele falou pra mim: “Se você só assistiu, não dá nada, não dá cadeia, não dá nada”. Ele falou: “No máximo, se der algum BO…”
Robinho
Mesmo se tu participou?
Falco
Vai dar cinco cestas básicas.
Robinho
Mas Ricardo, tu participou do bagulho. Só que a questão não é essa. Tu não forçou a mina. Por mais que tu tenha participado no… vamos chutar errado aqui, lógico que tomara Deus que não vai dar em nada, isso aí vai ser só pressãozinha para nós tomar vergonha na cara e parar com essas palhaçada, pra nós virar homem e crescer.
Narrador
Os amigos estavam com medo da polícia encontrar alguma prova que ligasse eles ao crime. Mas se isso acontecesse, Robinho já sabia o que dizer.
Robinho
Agora, beleza, vamos chutar errado: “Ah, deu alguma coisa, descobriram que o Ricardo participou, que o Neguinho comeu a mina.” “É, eu comi, pô! Porque ela quis. Aonde eu forcei a mina? Eu comi a mina, ela fez chupeta pra mim e depois saí fora. Os cara continuaram lá”. “Você viu os cara lá?” “Vi, os caras continuaram, ela queria.” Ah, porventura, em último caso, em última instância… “Tu..?” “Comi, ela queria me chupar. Ela me chupou um pouquinho, depois sai fora também.”
Falco
Exato.
Robinho
Porque foi o que aconteceu, pô…
Narrador
Essa foi a primeira vez em quatro meses de escutas que Robinho admitiu que de fato fez sexo com penetração com Helena. Era exatamente isso o que ela tinha dito antes, no esforço que fez pra recuperar as lembranças que ela preferia esquecer. E foi isso que o promotor Stefano Amendola escreveu na denúncia. Dois anos depois, a Justiça italiana considerou que Robinho e Falco se aproveitaram da embriaguez de Helena para abusar dela. A frase de Robinho apareceu nos documentos do processo.
Narrador
E a de Falco, logo em seguida, também.
Falco
Eu queria falar, dá vontade de falar pro cara, se é um amigo meu, eu ia falar: “Na moral, mano, isso aqui, o Robinho comendo ela, ela fazendo uma chupeta pro Alex, é verdade, mano. Como que a mina louca lembra desse bagulho?”
Narrador
Robinho e Falco foram condenados a 9 anos de prisão por violência sexual de grupo, o termo técnico para estupro coletivo. Eles recorreram. Eles até hoje negam que tenham cometido um crime, mas os juízes da segunda instância deram razão a Helena.
Narrador
Os da terceira também.
Narrador
Helena não estava louca.
Narrador
Ela sabia.
Narrador
No próximo episódio de Os Grampos de Robinho
Janaina Cesar
Alô?
Robinho
Alô?
Janaina Cesar
Alô, é Robinho?
Robinho
Quem é?
Janaina Cesar
Oi, Robinho. Quem tá falando aqui é Janaína. Eu sou uma jornalista, trabalho pro UOL.
Robinho
Pois não.
Janaina Cesar
Oi. É o Robinho que tá falando?
Robinho
Sim.
Créditos: UOL.