Foto: Josep LAGO / AFP.
Na Espanha, Mercedes erra e provoca acidente que mudou o grid de logo mais pic.twitter.com/sWqWSjxPq9
— Junior Melo TERRA🇧🇷🇮🇱 (@juniormelorn_) June 4, 2023
A classificação para o GP da Espanha, sétima etapa da temporada 2023 da Fórmula 1, terminou com mais do mesmo na briga pela pole position. Afinal, Max Verstappen vai largar na frente pela quarta vez no ano, a 24ª da carreira, em mais uma sessão extremamente dominada pela RBR do holandês, que foi 462 milésimos mais rápido que a Ferrari do espanhol Carlos Sainz, o segundo no grid. A grande surpresa foi o desempenho da McLaren, que colocou seus dois carros no Q3. A equipe inglesa terá o inglês Lando Norris em terceiro e o australiano Oscar Piastri em nono. E a decepção do dia foi o desempenho do monegasco Charles Leclerc: com uma Ferrari com novidades aerodinâmicas, mas com problemas de equilíbrio na traseira, foi eliminado ainda no Q1, conseguiu apenas o 19º tempo e vai largar na última fila no Circuit de Barcelona-Catalunya. Será uma corrida longa para ele.
Depois do resumo do dia, vamos ao assunto que roubou a cena neste sábado em Montmeló: o erro primário da Mercedes no fim do Q2 que causou o toque de George Russell em Lewis Hamilton em plena reta dos boxes, quando os dois abriam volta rápida em suas últimas tentativas na segunda parte da classificação. Foi uma falha que atrapalhou os resultados de ambos os pilotos: o carro de Hamilton ficou desalinhado e ele perdeu a chance de lutar por uma possível primeira fila com um W14 completamente revisado aerodinamicamente e mostrando potencial de evolução – vai largar em quarto. Já Russell, que não se acertou com o carro durante todo o fim de semana e partia para o tudo ou nada em sua última tentativa, acabou eliminado ainda no Q2, apenas com o 12º tempo.
E é extremamente necessário falar sobre o incidente, porque as narrativas erradas já começaram nas mídias sociais. A principal delas é que Russell teria feito jogado o carro para cima de Hamilton propositalmente, para atrapalhar o companheiro de equipe. E isso, por si só, não faz o menor sentido. Naquele momento, o heptacampeão já tinha um tempo que lhe garantiria no Q3 – o que foi confirmado, aliás. Quem estava com a “corda no pescoço” era Russell, que tinha tudo a perder e ser eliminado no Q2. O piloto da Mercedes #63 não teria nada a ganhar jogando o carro deliberadamente em cima do companheiro: perderia a chance de avançar ao Q3 – como efetivamente aconteceu – e ainda criaria uma enorme crise interna dentro da equipe do chefe Toto Wolff. A narrativa não faz sentido.
Então, o que efetivamente aconteceu naquele momento? Simples: um erro de comunicação primário, que, segundo o próprio Toto Wolff, fez sua equipe parecer “boba”. O erro partiu dos engenheiros dos carros #44 – Peter Bonnington, o Bono – e do #63 – Marcus Dudley. Os carros foram liberados dos boxes com diferentes planos para o fim do Q2: Russell fecharia sua volta rápida primeiro, enquanto Hamilton estaria abrindo sua última tentativa. Mas Russell teve de mudar os planos e abortar a volta na curva 5, quando errou a tangência, segundos após Sergio Pérez escapar para a caixa de brita e retornar à pista. Então, o piloto do carro #63 reduziu a velocidade, recarregou as baterias, esfriou os pneus e perguntou ao engenheiro sobre os carros que poderiam estar chegando. Russell recebeu o aviso de que Yuki Tsunoda estava à frente e de que Max Verstappen vinha rápido e o alcançaria no último setor.
Após abrir para Verstappen, Russell foi avisado que Sainz vinha fechando sua volta rápida. Então, ele tirou o pé rapidamente para não atrapalhar o espanhol antes da última curva. Após isso, seu engenheiro pediu para ele mudar o modo do motor (Strat 2). E Russell perguntou se ele precisava estar atento para mais algum piloto vindo – e não obteve resposta. Foi o início da confusão. O inglês resolveu então pegar o vácuo de Sainz enquanto acelerava forte para a última curva do Circuit de Barcelona-Catalunya para abrir sua última tentativa. O problema é que essa atitude coincidiu com a preparação de Hamilton para sua derradeira volta rápida no Q2. Pelo rádio com os engenheiros, nem Russell nem Hamilton sabiam da posição de pista do companheiro. A confusão se desenhava.
Assim como Russell, Hamilton também tinha deixado Verstappen e Sainz passar. E o heptacampeão também não tinha sido avisado que o companheiro tinha abortado a volta e partiria para uma nova volta rápida naquele momento. Para ele, Russell estaria em sua volta de desaceleração depois da linha de chegada. Com isso, os dois carros da Mercedes ficaram colados logo depois da última curva, no início da reta dos boxes. Marcus Dudley, engenheiro do #63, não avisou a Russell que Hamilton estava atrás dele, e o inglês decidiu sair para a direita para tentar aproveitar o vácuo de Sainz na abertura de sua última volta. O problema é que esse movimento induziu Hamilton a pensar que Russell estava dando passagem. Só que Russell acabou voltando para o traçado e espremeu o companheiro, danificando a asa dianteira do heptacampeão. Tudo isso aconteceu sem que Peter Bonnington ou Marcus Dudley avisassem a ambos das posições de pista de seus companheiros.
Em resumo: não tivemos um acidente pior porque Hamilton pisou na grama para evitar um choque mais forte. Tudo por culpa da falta de comunicação dos engenheiros da Mercedes. Tanto é que o incidente foi investigado pelos comissários esportivos da Federação Internacional de Automobilismo (FIA). E depois de ver os dados da telemetria, rever as imagens das onboards e ouvir as conversas dos rádios, ficou claro que a culpa não era de Russell, mas da equipe alemã. Por isso, o piloto do carro #63 tomou apenas uma reprimenda. E a falha foi admitida com muita clareza pelo chefe Toto Wolff, que já disse que não aceitará mais erros desse tipo de seu time de engenharia. Uma bobagem que não combina com o profissionalismo que a Mercedes mostra na Fórmula 1 desde 2014.
Por isso, amigos, tomem cuidado antes de acreditarem nas narrativas que estão rodando por aí. Neste momento, não há clima de animosidade entre os pilotos da Mercedes. Pelo contrário: os relatos são de que Lewis Hamilton e George Russell se dão muito bem. Aliás, o jovem inglês sabe que não precisa forçar a barra neste momento. Está claro que a equipe alemã o está preparando para suceder o heptacampeão quando ele parar ou deixar o time. É só ter paciência e aprender. É uma situação completamente diferente, por exemplo, da vivida pela Mercedes com o próprio Hamilton e Nico Rosberg em 2016, quando os dois até bateram na primeira volta do GP da Espanha. Ali sim existia uma rivalidade e uma enorme animosidade. A situação hoje é completamente diferente.
Para encerrar: vou sempre trazer aqui no Voando Baixo o lado racional dessas polêmicas vazias que muita gente gosta de criar. O caso Russell-Hamilton na classificação da Espanha é um ótimo exemplo disso. Os fatos sempre se sobrepõem às narrativas. Ou pelo menos deveria ser assim.
Créditos: GE.