Foto: GETTY IMAGES.
Da sua varanda, sobre as roupas de surfe penduradas para secar, o surfista inglês Andrew Cotton pode ver tudo: a faixa de areia, a névoa causada pela maresia, o pico de um rochedo e um farol vermelho.
Mas o mais importante é que Cotton pode observar as ondas de Nazaré, em Portugal.
Elas estão relativamente pequenas hoje, mas ainda é possível ver a espuma branca borbulhando e ouvir o barulho da água batendo na areia e voltando para o mar. As informações são da BBC.
E, quando as ondas estão altas para a prática do surfe, a história é outra.
Nas praias de Nazaré — uma pequena cidade com cerca de 15 mil habitantes, a 97 km ao norte de Lisboa —, quebram ondas gigantescas, algumas com a altura de edifícios de 10 andares.
Para gerações de pescadores locais, estas condições sempre foram sinônimo de perigo e morte. Mas, para Cotton, elas são seu trabalho e um estilo de vida.
“É meio estranho, mas transformei aquilo em um trabalho e, quando as ondas estão altas, você vai até lá”, ele conta.
“Você fica por lá o dia todo e faz o que precisa fazer.”
Nesses dias, Cotton nem precisa olhar. Quando a onda maior e mais lucrativa do mundo chega, ele sabe assim que acorda, antes de abrir olhos.
“Morando aqui, sei o tamanho das ondas pelo quanto as janelas estão trepidando”, afirma.
“Pode ser realmente único, sabe? O oceano pode ser assustador quando não há ondas. E aqui quando elas são grandes… pode ser aterrorizante.”
O começo
A fama do mar de Nazaré tem diversas origens. Uma delas fica a 210 km da praia, a 5 km de profundidade. Foi criada milhões de anos atrás, nas águas calmas e frias do Oceano Atlântico.
Ali, formou-se um profundo cânion submarino, que se estende pelo litoral de Portugal. Ele sobe abruptamente ao largo da costa de Nazaré e, quando as condições são favoráveis, uma massa de água se afunila em uma coluna assustadora.
Outra origem é 14 de setembro de 1182. Reza a lenda que nessa data um caçador local foi salvo de cair de um rochedo no oceano por um milagre de Nossa Senhora. O episódio fez com que Nazaré ficasse eternamente relacionada ao céu, ao inferno e ao alto mar, no imaginário português.
Para Cotton e outros surfistas, as ondas de Nazaré ficaram conhecidas de forma mais moderna e menos dramática. Foi por meio de um e-mail enviado por Dino Casimiro, em 2005.
Filho de pescador, Casimiro, quando criança, costumava roubar tampas de caixas para surfar nas ondas, enquanto as mulheres embalavam os peixes.
“Eles me diziam que eu iria morrer”, conta ele, relembrando a reação da sua família quando levou sua prancha artesanal para a Praia do Norte, onde quebram as ondas mais fortes de Nazaré.
“Eles viam as ondas como um demônio.”
“Em Nazaré, temos uma relação de amor e ódio com o oceano. Amor, porque ele nos dá o alimento e os turistas — e ódio, porque também tira a vida dos nossos parentes.”
Casimiro insistiu, mas houve dias em que as ondas e as dúvidas eram grandes demais.
“Nós nos sentávamos na areia, procurando as ondas enormes e perfeitas sem ninguém por perto, pois não tínhamos confiança, experiência e equipamento para surfar nelas”, relembra ele.
Mas Casimiro conhecia algumas pessoas que poderiam enfrentar aquelas ondas.
O tow-in surfing — modalidade em que os surfistas se revezam para rebocar uns aos outros sobre as ondas com um jet ski — havia começado a ser praticado no Havaí uma década antes. Ele permitia que os bravos surfistas pegassem ondas monstruosas inalcançáveis.
Quando as ondas de Nazaré ficavam mais fortes, Casimiro tirava fotos, ligava sua câmera ao computador e começava a “surfar” — não no oceano, mas na internet.
“Pesquisei pelos surfistas de ondas grandes e de jet ski mais conhecidos, mas o ano era 2005”, diz.
“Todos agora têm Instagram e Facebook. Naquela época, não era fácil, mas Garrett já tinha seu próprio site e havia um botão de contato no canto da página.”
O recorde mundial
Uma voz feminina surge no rádio. “Vocês têm três ondas gigantes chegando.”
O jet ski, dirigido por Cotton, rasga a superfície íngreme da onda. A prancha, carregando Garrett McNamara, segue na direção oposta, até o ponto de não retorno.
O ângulo não é perfeito. “Eu queria entrar mais fundo naquela onda”, afirma McNamara.
“Eu segurei aquela corda até o último segundo. Ela me fez ir até o fundo da onda e saí o mais forte que pude”, relembra ele. “Quando olhei de novo para o mar, todo o horizonte escureceu.”
O dia era 1º de novembro de 2011 — seis anos após o primeiro e-mail de Casimiro e um ano depois que McNamara esteve no farol de Nazaré pela primeira vez, declarando que havia encontrado seu Santo Graal.
Aquela foi a maior onda que ele já havia surfado. As imagens são fascinantes e desorientadoras.
McNamara se lança para baixo, mas parece simplesmente deslizar em direção ao fundo da onda, que aumenta de tamanho quase tão rápido quando ele consegue surfar.
Ele é levado em direção à câmera, mas a perspectiva está fora de sincronia. McNamara parece encolher em vez de crescer, enquanto a crista da onda sobe em direção ao céu atrás dele.
E, por todo o tempo, toneladas de água caem ao seu redor. Ele se mantém em equilíbrio graças apenas à sua prancha, que deixa uma fina trilha branca na superfície da onda.
“Você não ouve a onda”, acrescenta McNamara. “Você se movimenta tão rápido que tudo o que você ouve é o vento nos seus ouvidos.”
“Você realmente não pensa. Você está em estado de fluxo, seguindo seu coração.”
“É emocionante. É como dirigir um carro em uma avalanche, mas você está desafiando a avalanche, em vez de se afastar dela”, descreve McNamara.
Assim que a espuma se dissipou, as notícias do seu feito viajaram rapidamente. Dois dias depois, a lenda do surfe Kelly Slater tuitou para descrever as imagens que havia recebido.
“Acabei de ver uma foto de Garrett McNamara em Portugal em uma onda estupidamente grande. Ele precisa postar aquilo o mais rápido possível”, escreveu.
Uma semana depois, ele postou. O vídeo foi publicado pela primeira vez na televisão pela ESPN, que apresentou as primeiras imagens do surfista americano em horário nobre nos Estados Unidos.
Na manhã seguinte, as imagens estavam nas manchetes dos jornais portugueses e, logo depois, em todo o mundo. A onda havia atingido 24 metros de altura, batendo um recorde mundial.
“Foi uma loucura”, relembra McNamara.
“Uma maluquice! O alvoroço da mídia que tivemos que enfrentar foi muito maior do que a onda.”
‘No início, ninguém acreditava’
Os pedidos de entrevista vieram de todo o mundo. McNamara passou as três semanas seguintes repetindo sua história e contando sobre as ondas de Nazaré para apresentadores de rádio e televisão, além de repórteres de jornal.
Foi um triunfo para ele, mas também um impulso para o planejamento da cidade. O palpite de Casimiro de que as águas de Nazaré poderiam oferecer algo mais do que peixe e turistas no verão ganhou apoio do governo municipal.
“Nós não tínhamos um orçamento muito grande e percebemos que, fazendo algo com aquelas ondas enormes, ganharíamos 20 a 30 anos de publicidade”, explica Pedro Pisco, parte de uma pequena equipe municipal que, ao lado de Casimiro, apostou suas fichas nas ondas da Praia do Norte.
Juntos, eles recrutaram um pequeno grupo de surfistas, forneceram equipamentos e criaram uma estratégia para vender sua pequena cidade para o mundo.
Mas os outros moradores de Nazaré acharam que era uma má ideia.
“No início, ninguém acreditava em nós. Nenhuma pessoa”, relembra Casimiro.
“Foi muito difícil. Todos nos ridicularizavam. Diziam que estávamos perdendo nosso tempo na Praia do Norte. Nenhum patrocinador acreditava em nós.”
Inicialmente, assim que McNamara chegou a Nazaré, os céticos pareciam estar certos.
Os jet skis tinham pouca potência. Seus motores ficavam inundados ou bloqueados por sacos plásticos, deixando o piloto e o surfista boiando perigosamente no caminho das ondas que chegavam à praia.
Mesmo quando já estava trabalhando, Cotton admite que, como piloto, não tinha experiência suficiente.
“Eu não estava à altura, eu só enganava”, ele conta, sobre seu controle do motor.
A véspera do recorde mundial havia sido um fracasso: um jet ski quebrou, e Cotton se lesionou.
Eles nem iriam se aventurar na manhã seguinte. Mas, quando as condições mudaram, McNamara, Cotton e o irlandês Al Mennie mudaram de ideia. E, juntos, eles pegaram a onda que fez toda a diferença.
Risco calculado
“Quando você larga a corda, a sensação é que você está sozinho”, afirma a surfista francesa Justine Dupont.
“A onda ainda está se formando embaixo dos seus pés, vindo do fundo do oceano. É como se você estivesse subindo em um elevador.”
“Depois, você sai cada vez mais rápido e se sente como se estivesse usando 100% dos seus sentidos e do seu potencial como ser humano, como se estivesse ativando seu modo super-herói”, descreve ela.
“Você está apenas vivendo o momento, não existe mais nada além daquele momento.”
Dupont assistiu ao vídeo da onda recorde de McNamara. E viu a foto viral de outra onda assustadora em que ele havia surfado pouco mais de um ano depois.
Quando chegou pela primeira vez a Nazaré em 2016 com seu parceiro Fred David — que também é surfista e, às vezes, pilota o jet ski —, aquelas imagens a intimidaram, mas também serviram de inspiração.
“Fiquei supernervosa e impressionada com as imagens”, ela conta.
“Nós entramos na água, as ondas não eram tão grandes, e Fred me disse: ‘Ora, se você está assustada com este tamanho, vamos ter problemas para ficar aqui!'”, relembra ela.
“Mas consegui vencer o medo.”
E ela fez mais do que isso. Dupont, agora com 31 anos, é uma das melhores surfistas de ondas grandes do mundo. Poucas ondas de Nazaré testemunharam tanta categoria, ou foram filmadas de forma tão emocionante, como uma que ela pegou em fevereiro de 2020.
Mas o medo permanece. É necessário. O perigo é claro demais, e os lembretes dele, muito recentes.
Em janeiro deste ano, o surfista brasileiro Márcio Freire, de 47 anos, um veterano do mundo das ondas grandes, foi o primeiro surfista a morrer na Praia do Norte.
DuPont aceita este risco. Ela reconhece que, sempre que entra na água, pode não voltar.
“É loucura, você se sente tão livre na onda quando está tudo bem, você se sente superviva, mas, quando alguma coisa dá errado, você pensa: ‘OK, eu posso morrer'”, diz ela.
“Há um breve momento em que você se pergunta o que vai acontecer. Há um suspense sobre como a onda vai atingir você e, embaixo d’água, é superviolento. Você precisa estar satisfeita com as boas coisas que fez na vida.”
A visão de Cotton é uma mistura similar de fé e fatalismo, baseada em sua própria experiência.
Em 2017, enquanto era rebocado para uma onda por McNamara, ele avaliou mal uma linha e foi lançado para fora da prancha. Seu corpo foi arremessado a seis metros da onda em direção ao ar.
Quando ele caiu sobre a superfície da água, o impacto quebrou suas costas. Ele voltou a surfar em Nazaré um ano depois.
“Não existe segurança completa, não há sentido em sair para a água com este pensamento”, ele afirma.
“Cair da prancha machuca, mas faz parte do surfe. Você não tem como apitar ou pedir tempo, as ondas não param. Ou você aprende a apreciar, ou simplesmente não faz.”
“Em alguns momentos, você pensa que tudo acabou, mas uma boa habilidade que eu tenho é conseguir desligar. Nessas situações, não penso em absolutamente nada e quase me conformo que estou morrendo.”
“Quando você consegue fazer isso, é surpreendente o quanto o corpo pode aguentar, quanto tempo você consegue prender sua respiração e como a mente é poderosa”, acrescenta Cotton.
“Mas, se você entrar em pânico e seus batimentos cardíacos aumentarem, aqueles 30 segundos debaixo d’água podem parecer um minuto. Fica perigoso.”
‘Como um casamento’
Em um esporte que normalmente é solitário, esses riscos geram estresse para a parceria entre o surfista e o piloto de jet ski.
“Quando as ondas ficam muito grandes, é um esporte de equipe”, afirma Cotton.
“Todos precisam participar e precisa ser menos sobre você, mais sobre a equipe.”
“Você pode [um dia] ter o melhor surfe da vida e, quando começa a pilotar o jet ski, não consegue oferecer novas ondas para o seu parceiro. Pode ser frustrante, vocês podem discutir e, às vezes, você pode sair se sentindo culpado.”
“Pode ser como um casamento, você tem altos e baixos, dias bons e dias ruins”, diz ele.
No caso de Dupont, os paralelos entre a vida pessoal e profissional são pertinentes.
“Certamente é delicado para um casal”, diz ela sobre trabalhar com seu parceiro.
“Sei que ele vai fazer o melhor por mim, mas chegamos a um ponto em que sentimos o risco, e Fred tem dificuldade de me levar para uma onda muito grande.”
“Por isso, durante os dias melhores, comecei a trabalhar com [o surfista brasileiro] Lucas Chumbo. Eu o respeito e não discuto com ele. Com Fred, eu o respeito, mas, às vezes, preciso falar!”
“No começo, em Nazaré, era bom porque Fred e eu podíamos surfar muito e progredir rapidamente”, ela relembra.
“Mas, quando você está no line-up nos grandes dias, em condições adversas, realmente você sente os riscos.”
“Você pensa: ‘O que estamos fazendo aqui, isso não é inteligente, deveríamos voltar para casa, nós nos amamos e temos uma vida boa’.”
Se colocar seu parceiro em uma situação de perigo é difícil, estar fora da cidade e do circuito talvez seja pior.
Nos grandes dias de Nazaré, Fred continua na água. Mas, agora, ele trabalha no jet ski de segurança. A tarefa dele é retirar Dupont da água ao final da onda, em vez de lançá-la ao mar.
A esposa de McNamara, Nicole, tomou decisão parecida, se envolvendo, em vez de tentar ignorar o risco.
Ela fica no farol. Lá, ela identificou no horizonte a onda que bateu o recorde mundial em 2011, instruindo McNamara, Cotton e Mennie pelo rádio para que se preparassem.
Um ano depois, ela e Garrett se casaram em uma cerimônia no mesmo local. Eles têm três filhos, e Nazaré é o nome do meio da segunda.
A cidade é parte da estrutura familiar deles. É um ponto determinante da carreira de Dupont e Cotton. Mas todos eles fizeram o nome da cidade de Nazaré, da mesma forma que Nazaré fez os nomes deles próprios.
A repercussão na cidade
O jornal local Região da Nazaré não dedicou muito espaço à chegada de McNamara, em dezembro de 2010. Uma reportagem cobrindo a entrevista coletiva do havaiano, ao lado do então prefeito de Nazaré, Jorge Barroso, ocupou apenas um terço da página 12 do jornal.
Menos de quatro meses antes, uma reportagem especial sobre “profissões à beira da extinção” recebeu muito mais destaque.
Abaixo da reportagem, havia uma fotografia de um tecelão produtor de cestos, José Manuel Rebelo. Em outra imagem, o sapateiro José Maria Eusébio apertava um par de chinelos. E a costureira Ana Emília Amada Curado Lourácio olhava para a câmera, ao lado da sua máquina de costura.
O texto lamentava o declínio das indústrias tradicionais em uma cidade de telhados de terracota e calçadas polidas. Ela receava o que o futuro poderia reservar.
A reportagem nunca poderia prever a grande onda que chegaria a Nazaré.
Vendedores ambulantes e food trucks ocupam a estrada até o farol, enquanto ônibus repletos de gente, sobretudo jovens, disputam uma posição estratégica. Milhares de pessoas ocupam os rochedos. Drones com câmeras zumbem pelo ar, e os pilotos de jet ski e surfistas enfrentam ondas imensas.
Depois de alguma oposição inicial do outro lado do Atlântico, podemos dizer que Nazaré indiscutivelmente tem as maiores ondas do mundo. O recorde mundial de maior onda já foi quebrado duas vezes desde o feito de McNamara em 2011 — as duas vezes, em Nazaré.
O atual recordista é o alemão Sebastian Steudtner, com uma onda de 26 metros de altura que ele surfou em outubro de 2020.
A francesa Dupont e a brasileira Maya Gabeira disputam o recorde feminino —mas quem quer que vença a disputa, também será em Nazaré.
Além de ser a maior onda do mundo, Nazaré também é uma das mais acessíveis. Uma das maiores concorrentes da cidade portuguesa — Cortes Bank, na Califórnia, nos EUA — quebra a 160 km do litoral e só acontece alguns dias por ano.
Já Nazaré fica a 90 minutos de carro do aeroporto internacional e quebra tão perto da praia que os espectadores podem ouvir do alto os gritos dos surfistas em um ambiente parecido com um estádio.
O farol que, um dia, alertou os pescadores para que se afastassem das rochas, é uma espécie de holofote em imagens online hipnotizantes, atraindo as pessoas para Nazaré.
Ele agora abriga um museu do surfe. Os ingressos custam dois euros (cerca de R$ 11), e o museu recebeu 371.391 visitantes em 2022 — quase cinco vezes mais que em 2015, quando ficou aberto pela primeira vez por um ano completo.
Um estudo local afirma que a quantidade de turistas na cidade triplicou em 10 anos, desde 2010. As vitrines das imobiliárias de Nazaré estão repletas de imóveis novos, prometendo atendimento em diversos idiomas.
“É uma maluquice”, afirma Dupont. Ela e seu parceiro agora moram a 15 minutos de carro do burburinho de Nazaré, em uma casa sossegada, à sombra de pinheiros.
“Em 2016, nós conseguíamos ir de carro até o farol e, às vezes, encontrávamos duas pessoas por lá. Agora, tem tanta gente, a estrada fica congestionada e quase não há acesso para nós, surfistas, verificarmos as ondas.”
“Eu costumava ir com o gorro do meu patrocinador, mas agora eu meio que o escondo porque não quero que as pessoas me parem e façam 100 perguntas”, diz ela.
“Eles são muito simpáticos, mas mudou muito — e, eu acho, para sempre.”
Dinheiro e publicidade
O fluxo de pessoas certamente trouxe mais dinheiro para a cidade. Empresas que antes sobreviviam de verão em versão, agora continuam a funcionar na temporada das ondas grandes no inverno.
Mas alguns moradores locais não colhem os mesmos benefícios. Os sapateiros, costureiras e cesteiros não faturam muito entre a galera do surfe.
E, como acontece em terra, os dividendos para quem está na água são divididos de forma desigual.
Há algumas competições de surfe de ondas grandes. Dupont ganhou o prêmio de US$ 9 mil (cerca de R$ 45 mil) pela melhor apresentação feminina em Nazaré no ano passado, mas seus patrocinadores são a maior fonte de renda.
Antes de 2011, McNamara era patrocinado por alguns fabricantes pequenos de equipamento de surfe do Brasil.
“Nenhuma das empresas da moda”, como ele diz.
Mas, depois da forte campanha publicitária cuidadosamente planejada por Nazaré para seu recorde mundial, marcas importantes chegaram à prancha de McNamara. E, além de uma série de novos patrocinadores, ele também representou uma empresa automobilística alemã de ponta, uma marca suíça de relógios e um fabricante sueco de bicicletários.
Este tipo de apoio depende da exposição. Para conseguir, é preciso jogar o jogo e perseverar no esporte.
“Há muitas ondas grandes todos os anos”, explica Cotton.
“Você pega o maior swell do ano, e a imprensa diz que só existe uma onda nele. Uma pessoa é escolhida e, nem sempre, é a pessoa ou a onda certa.”
“Pode ser uma marca anunciando seu atleta ou uma agência publicando suas fotos… é assim”, diz ele.
Medir ondas imensas em movimento é uma ciência inexata e demorada. A onda do recorde mundial de Steudtner só foi medida oficialmente e ratificada 18 meses depois.
A propaganda exagerada preenche essa lacuna.
“Duas ou três vezes por ano, haverá comunicados à imprensa”, afirma Cotton.
“Li um recentemente dizendo que uma onda de 35 metros foi surfada aqui. Outro falava em uma onda de 31 metros. Outro, de 30 metros.”
“As pessoas simplesmente inventam números, trazem um cientista para dizer alguma coisa, e sabe o que acontece? É ótimo para o surfe de ondas grandes, para a cidade e para o esporte”, avalia.
Na cidade das ondas enormes, as estatísticas podem nem sempre ser o que parecem. Mas, em Nazaré, os desafios e o surfe são muito maiores do que em qualquer outro lugar.
Créditos: BBC.