A investigação da Polícia Federal sobre o uso de verbas do Sistema Único de Saúde (SUS) em Alagoas expõe um esquema que teria desviado recursos destinados ao atendimento da população para a compra de imóveis, viagens e itens de luxo, por meio de contratos emergenciais e ressarcimentos de procedimentos médicos supostamente fraudulentos ligados à Secretaria de Estado da Saúde de Alagoas (Sesau), com foco em verbas federais que deveriam sustentar a rede pública de saúde.
Como foi a Operação Estágio IV e quais são seus principais alvos?
A Operação Estágio IV, deflagrada nessa terça-feira (16/12), mobilizou 170 policiais federais e 26 auditores para cumprir 38 mandados de busca e apreensão em Alagoas, Pernambuco e Distrito Federal. As ordens foram expedidas pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF-5), que também determinou medidas cautelares como o afastamento de autoridade pública e o sequestro de bens.
Segundo a PF, a apuração identificou indícios de um esquema estruturado dentro da Sesau, envolvendo contratos financiados com recursos do SUS. O foco recai sobre contratos emergenciais, que permitem tramitação mais rápida e com menos burocracia, em que teriam ocorrido favorecimentos, preços inflados e pagamentos sem a devida comprovação de serviços prestados, com valores sob suspeita que se aproximam de R$ 100 milhões.
Como o dinheiro do SUS teria sido usado?
As apurações indicam que parte significativa dos recursos do SUS teria sido desviada para custear patrimônio de alto valor e gastos pessoais, em padrão de consumo incompatível com rendimentos formais de alguns investigados. A PF aponta a compra de imóveis em nome de terceiros, como familiares e pessoas ligadas a empresários favorecidos, incluindo uma pousada em Porto de Pedras (AL), adquirida em 2023 por R$ 5,7 milhões.
Durante as buscas, os agentes apreenderam R$ 775.420 em moeda nacional, US$ 24 mil, € 10.625, joias avaliadas em cerca de R$ 300 mil e duas armas de fogo. A PF relata ainda o uso de transferências bancárias, saques em espécie e pagamentos indiretos para ocultar a origem ilícita dos valores, o que é típico de esquemas de lavagem de dinheiro e de tentativa de mistura entre recursos lícitos e ilícitos.
Quais contratos emergenciais e ressarcimentos estão sob suspeita?
Entre 2023 e 2025, a Sesau firmou contratos emergenciais com uma fornecedora de material hospitalar e uma construtora, que passaram a ser o centro da investigação. Segundo a PF, há indícios de direcionamento para beneficiar grupos específicos, com valores acima da média de mercado e falhas na comprovação da entrega integral de produtos e serviços, inclusive em obras de manutenção hospitalar.
O esquema também atinge ressarcimentos de consultas e procedimentos médicos custeados pelo SUS, com suspeita de ressarcimentos superfaturados de atendimentos não realizados, gerando prejuízo estimado em mais de R$ 18 milhões. Parte desses valores estaria ligada a uma clínica privada de fisioterapia, cuja estrutura física e capacidade operacional seriam muito inferiores ao volume de procedimentos faturados, indicando possível inclusão de pacientes inexistentes e repetição de procedimentos em nomes reais.
Quais as possíveis consequências jurídicas e administrativas da operação?
A Operação Estágio IV ainda está em andamento, e o material apreendido será submetido a análises financeiras, cruzamentos de informações bancárias e perícias contábeis. A partir desses dados, a PF e o Ministério Público Federal poderão propor novas medidas judiciais, inclusive denúncias criminais por corrupção, lavagem de dinheiro, organização criminosa e desvio de recursos públicos, bem como ações civis por improbidade administrativa e pedidos de ressarcimento ao erário.
O afastamento do secretário de Saúde por 180 dias foi determinado para evitar interferência na investigação, enquanto o sequestro de veículos, imóveis e outros bens busca garantir patrimônio para eventual recomposição de danos. Para o SUS, casos como o de Alagoas afetam a confiança na aplicação de verbas federais e reforçam o debate sobre controle, transparência e fiscalização permanente dos gastos na saúde pública.
FAQ sobre esquema que desviava dinheiro do SUS
- O que caracteriza um contrato emergencial na saúde pública? É um contrato firmado em situação de urgência, com prazos reduzidos e dispensa de licitação tradicional, usado para atender demandas imediatas, como falta de insumos ou necessidade de obras rápidas em hospitais.
- Como a PF rastreia o desvio de verbas do SUS? A PF cruza dados bancários, fiscais e administrativos, analisa notas fiscais, contratos, ordens de pagamento e compara esses documentos com a estrutura real de empresas e serviços supostamente prestados.
- O que é lavagem de dinheiro em casos ligados ao SUS? É o processo de ocultar a origem ilícita de recursos desviados da saúde, por meio de transações financeiras, compras de bens, uso de laranjas e outras estratégias para parecer que o dinheiro é legal.
- Quem pode ser responsabilizado em esquemas de desvio de verbas da saúde? Podem ser responsabilizados agentes públicos, empresários, intermediários, contadores e qualquer pessoa que tenha participado ou se beneficiado do esquema, conforme o grau de envolvimento comprovado.