A recondução de Paulo Gonet ao comando da Procuradoria-Geral da República, aprovada ontem no Senado, deveria ter sido uma vitória tranquila para o governo Lula. Mas o que aconteceu foi o oposto: uma votação dramática, marcada por margens apertadas e por um alerta político claro sobre a capacidade de articulação do Planalto no Congresso.
Na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), agora presidida pelo senador Otto Alencar (PSD-BA), Gonet precisava de 14 votos para seguir ao plenário. Recebeu 17, apenas três além do mínimo. Um placar que, no universo do Senado, não significa força, mas vulnerabilidade. Mostra que cada voto foi suado, negociado e disputado.
Mas foi no plenário que a fragilidade ficou exposta de forma incontornável. O governo esperava entre 50 e 54 votos, uma margem confortável. No entanto, Paulo Gonet alcançou apenas 45 votos, superando o mínimo constitucional (41) por quatro votos, no que se tornou a menor votação para recondução de um Procurador-Geral da República desde a redemocratização.
A tensão no Planalto foi imediata. A preocupação não era apenas com o cargo de PGR, mas com o que o placar simbolizava politicamente: a perda de influência do governo num Senado historicamente decisivo.
O impacto direto na disputa pela vaga de Barroso no STF
A votação apertada acendeu um alerta ainda maior para o governo em relação à disputa pela vaga de Roberto Barroso, que se aposentou antecipadamente do Supremo Tribunal Federal.
O nome defendido pelo Planalto é o do advogado-geral da União, Jorge Messias. Mas, depois do resultado de Gonet, ficou evidente que Messias não tem hoje os votos necessários para aprovação. O governo sabe que, se o Senado repetisse o comportamento visto na recondução ao PGR, seu indicado ao STF correria sério risco de derrota.
E ainda há o fator interno: o presidente do Senado, David Alcolumbre, atua nos bastidores para emplacar um nome alternativo, e existe dentro da Casa um movimento real que prefere um senador para a cadeira, especialmente Rodrigo Pacheco, cujo suplente é assumidamente de direita, o que agrada à oposição.
Esse jogo político tornou a nomeação de Messias muito mais complicada do que o Planalto previa.
A “parceria” Gonet-Moraes e a rejeição da oposição
Outro elemento que pesou no placar apertado foi a resistência explícita da oposição à imagem de proximidade entre Paulo Gonet e o ministro Alexandre de Moraes.
Para parlamentares ligados à direita, Moraes é o símbolo das medidas mais controversas contra o bolsonarismo. E qualquer figura alinhada a ele, mesmo que institucionalmente, é recebida com desconfiança, rejeição e, como muitos senadores admitiram reservadamente, verdadeira ojeriza.
Assim, parte expressiva dos votos contra Gonet não foi direcionada a ele como jurista, mas ao que representa dentro do atual arranjo de poder do Judiciário. Esse fator emocional e político teve papel central no placar apertado.
O recado final do Senado
A recondução de Paulo Gonet deixou lições importantes, e incômodas, para o governo:
• A base aliada é menor do que o Planalto imagina.
• A oposição está mais coordenada do que se supunha.
• Otto Alencar conduziu uma CCJ onde a margem pró-governo foi mínima.
• David Alcolumbre é hoje peça-chave e opera com agenda própria.
• A indicação de Jorge Messias ao STF se tornou muito mais arriscada.
• E a rejeição à influência de Alexandre de Moraes segue forte e mobilizadora.
Se reconduzir um PGR moderado já exigiu esforço máximo e resultou no placar mais apertado desde a redemocratização, o que esperar da batalha por uma cadeira vitalícia no Supremo?
O Senado deu o recado.
Resta saber se o governo vai conseguir ouvir, e reagir, antes da próxima votação decisiva.
Por Júnior Melo