Flordelis durante o julgamento — Foto: Brunno Dantas/TJRJ
A ex-deputada Flordelis disse neste sábado (12), no julgamento em que é ré pela morte de seu marido, o pastor Anderson do Carmo, que abusos que o pastor cometia dentro de casa foram a motivação para que fosse assassinado – inclusive contra ela.
“É muito difícil para mim falar, mas foi a ciência dos abusos que aconteceram dentro da minha casa.”
Flordelis voltou a negar, no entanto, que tenha envolvimento na execução: “Eu só queria dizer e pros jurados que eu não, em momento algum, eu mandei ou pensei em matar o meu marido. Eu estou na cadeia hoje pagando por algo que eu não fiz. Eu amava o meu marido. Está sendo muito difícil a vida para mim.”
A versão dita por ela no Tribunal do Júri destoa da acusação do Ministério Público. Flordelis foi denunciada como a mandante da execução e responde por: homicídio triplamente qualificado (motivo torpe, emprego de meio cruel e de recurso que impossibilitou a defesa da vítima), tentativa de homicídio, uso de documento falso e associação criminosa armada.
A ex-deputada lembrou que dois filhos – Flávio dos Santos Rodrigues e Lucas Cézar dos Santos de Souza – foram condenados pela execução, mas disse que não poderia dizer quem foram os autores porque não estava na cena do crime.
“Eu não posso acusar ninguém, eu não estava presente no local, eu não vi. Eu não posso afirmar. Meu filho Flávio foi sentenciado e meu filho Lucas foi sentenciado.”
Outros quatro réus já foram condenados pelo caso. Desde segunda-feira (7), além de Flordelis, também são julgados quatro filhos dela.
Detalhes de supostas agressões
No depoimento, Flordelis falava, entre soluços e choro, sobre as supostas agressões e abusos cometidos durante o sexo.
“Ele me batia. Alguns filhos entravam na frente. Ele só parou de me bater quando um pastor muito amigo dele me tirou do quarto e se colocou para conversar com ele a sós (…) Depois, ele voltou a ficar agressivo, na área sexual. Ele só sentia prazer se me machucasse – e me machucava. Ele só chegava às vias de fato se me machucasse.”
Apesar dos relatos de abusos por parte de Anderson do Carmo, Flordelis falou que “morreu junto” com o marido.
“Metade da Flordelis morreu junto. Eu morri junto.”
Chorando, disse também que não tem que pagar pelos erros de ninguém e que é inocente: “Eu não tenho que pagar pelos erros de ninguém. Há três anos estou pagando por uma coisa que eu não fiz. Eu estou sendo chamada de mandante do assassinato da pessoa que eu mais amei nessa vida.”
Durante o primeiro dia de julgamento, a promotoria leu o que considera indícios da participação de Flordelis no crime, como um diálogo com um filho adotivo que, para testemunhas como o delegado Alan Duarte, mostra que a pastora preferiu cometer o crime do que se separar, para evitar escândalos na igreja.
O delegado também narrou algumas supostas tentativas de envenenamento malsucedidas e que teriam sido promovidas por Marzy Teixeira, filha adotiva de Flordelis. Contou também que houve uma tentativa de contratação de pistoleiros para executar o pastor.
Neta interrogada
Rayane dos Santos, neta de Flordelis, falou logo depois da pastora e ex-deputada federal.
Ela negou qualquer participação no crime, e disse que os depoimentos que citam que ela teria perguntado a várias pessoas da família sobre pistoleiros para matar Anderson foram combinados.
“Eu nunca entendi. Depois de assistir o depoimento deles aqui, eu cheguei numa conclusão que foi totalmente orquestrado, porque não tinha motivo nenhum para pedir o número de um bandido. Não existiu”, alegou.
Rayane também citou o episódio de abuso contra Kelly, mas afirmou que o episódio deveria ter sido denunciado: “Acho que deveria ter sido feita a coisa certa. Todo mundo se juntado, denunciado, falado”, declarou.
Ela afirmou que contou sobre o episódio para Flordelis. “Ela não acreditou”.
Rayane relatou ter sido vítima de um abuso de Anderson do Carmo no apartamento funcional de Flordelis em Brasília, mas afirmou que nunca denunciou o crime por medo: “No dia seguinte, eu fiquei com aquilo na cabeça, mas o medo de me abrir para alguém e eu perder a chance de estar em Brasília para trabalhar me fez ficar lá”.
Para Rayane, tudo poderia ter sido resolvido se houvesse diálogo.
“Se conversado poderia ter sido resolvido. Não estaria sem meus filhos, não estaria sentada aqui hoje”, emocionou-se ela.
Próximos passos
Depois de cinco dias ouvindo 24 testemunhas – 13 de acusação e 11 de defesa –, o julgamento da pastora Flordelis e outros quatro réus entra em sua reta final neste sábado (12), quando estão previstos os cinco depoimentos.
Os trabalhos no plenário do Tribunal do Júri de Niterói, na Região Metropolitana do Rio, começaram às 10h30 com o interrogatório de André Luiz de Oliveira, filho afetivo de Flordelis.
Flordelis responde por homicídio triplamente qualificado, tentativa de homicídio, uso de documento falso e associação criminosa armada.
Marzy Teixeira da Silva, filha adotiva de Flordelis, responde por homicídio triplamente qualificado, tentativa de homicídio e associação criminosa armada. Marzy teria recebido a quantia de R$ 5 mil de Simone dos Santos Rodrigues para pagar a morte do pastor Anderson do Carmo. Investigação aponta que Marzy fez buscas por matador na internet.
Rayane dos Santos Oliveira, neta biológica de Flordelis e filha de Simone, responde por homicídio triplamente qualificado e associação criminosa armada. Segundo o Ministério Público, Flordelis encomendou a morte de Anderson e pediu à neta que procurasse pessoas para assassiná-lo.
Simone dos Santos Rodrigues, filha biológica de Flordelis, responde por homicídio triplamente qualificado, tentativa de homicídio e associação criminosa armada. Em depoimento, Simone confessou ter pagado R$ 5 mil pela morte do pastor Anderson do Carmo. O motivo seriam as constantes investidas sexuais do pastor.
Interrogatório
Durante o interrogatório, André disse que é inocente, e não teve nada a ver com a morte do pastor. Ele é acusado de homicídio, tentativa de homicídio e associação criminosa armada.
Ele negou ter visto qualquer agressão física de Anderson do Carmo contra Flordelis.
“Agressão física não. Meu pai era rígido ao falar”, disse André, que só respondeu perguntas de advogados de defesa e dos jurados.
Ao ser questionado sobre quem era seu exemplo de caráter, André citou Flordelis: “Minha mãe Flor”.
André também disse que Flordelis era ‘completamente dependente” de Anderson.
“Minha mãe só fazia algo se meu pai a orientasse. Ele dizia o que falar, quando falar, a quem ela deveria se aproximar, de quem ela deveria se afastar”, explicou.
André comentou que, na madrugada em que Anderson do Carmo foi assassinado, achou que pudesse ser um assalto. Ele disse que ficou em choque com aquele momento, inclusive sem conseguir dar instruções ao Samu.
“Não consigo. Ramon pega o telefone da minha mão, ele vê a minha situação e pega o telefone. Eu não consigo ver aquela situação e vou para o meu quarto”, disse ele.
André ainda negou que tenha dado qualquer quantia em dinheiro para contratar um matador para cometer o crime contra Anderson do Carmo. Ele também disse que nunca viu tentativas de envenenamento contra o pastor.
Interrogatório, debate e voto dos jurados
Após o fim do interrogatório, começam os debates entre acusação e defesa. Cada lado terá duas horas e meia para pedir a absolvição ou a condenação dos réus.
Se o Ministério Público achar necessário, ainda poderá haver réplica e tréplica, com mais duas horas para cada.
Depois dos argumentos de defesa e acusação, a juíza pergunta se os jurados estão habilitados a julgar. Em caso positivo, são formuladas as perguntas que serão votadas pelos sete jurados – quatro homens e três mulheres –, para decidir se os réus são culpados ou inocentes.
Em uma sala especial, a magistrada, Ministério Público, defesa e jurados se reúnem para as deliberações, que podem durar por tempo indeterminado.
Após essa fase do processo, todos voltam para a proclamação da sentença pela juíza Nearis Carvalho Arce. A expectativa é que todo o rito seja cumprido até domingo (13).
Créditos: G1.