O programa Bolsa Família é uma das políticas públicas mais conhecidas no Brasil, voltada para a redução da pobreza e desigualdade social. Nos últimos anos, diversas pesquisas avaliaram os efeitos dessa iniciativa, especialmente após sua expansão durante a pandemia da Covid-19. Estudos recentes apontam que essa ampliação pode ter desencorajado a busca por emprego, sobretudo entre segmentos mais vulneráveis.
Daniel Duque, mestre em Ciências Econômicas desde a UFRJ e pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), conduziu um estudo utilizando dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua. O levantamento buscou entender como a expansão das transferências de renda influencia a participação na força de trabalho no Brasil.
Como a expansão do Bolsa Família afeta a busca por emprego?
De acordo com Duque, os programas sociais são importantes, pois fornecem o suporte necessário para que pessoas superem obstáculos como a falta de qualificação ou recursos para buscar emprego. No entanto, o estudo sugere que estes programas também podem desincentivar a busca ativa por trabalho.
Nos anos mais recentes, quando o valor dos benefícios triplicou, houve uma queda na participação no mercado de trabalho. Este efeito se mostrou especialmente forte nas regiões Norte e Nordeste, assim como entre mulheres, jovens e trabalhadores de baixa qualificação, conforme indica a pesquisa da FGV Ibre.
Qual é o papel do custo de oportunidade na decisão dos beneficiários?
Fernando Chertman, professor de Macroeconomia e Economia Matemática da Faculdade Belavista, ressalta que o período estudado é pequeno para conclusões definitivas. No entanto, ele reconhece que, diante das oportunidades oferecidas, beneficiários podem optar por permanecer no programa em vez de buscar emprego formal.
Claudio Shikida, doutor em economia e especialista do Instituto Millenium, concorda. Ele aponta que a substituição do desejo de trabalhar pelo recebimento do benefício pode ocorrer, particularmente entre os mais pobres. A lógica é que, se o valor recebido pelo Bolsa Família é comparável ao potencial salário de um emprego formal, muitos preferem esta estabilidade associada a trabalhos informais.
Quais são as alternativas para atuar nas distorções do Bolsa Família?
Outro estudo da FGV Ibre, desta vez conduzido pelo Centro de Estudos para o Desenvolvimento do Nordeste, destaca que a recente expansão do mercado de trabalho não impediu o aumento da participação dos programas sociais na renda dos domicílios brasileiros. Mesmo com aumento no número de carteiras assinadas, a proporção da renda proveniente do Bolsa Família cresceu.
Shikida sugere que a solução passa por investir em programas que aumentem a produtividade do trabalhador, como cursos técnicos alinhados às demandas do mercado de trabalho e estímulos ao empreendedorismo. “Mais produtividade significa mais crescimento econômico”, argumenta ele.
O Bolsa Família pode ser um trampolim para superação da pobreza?
Para Chertman, o Bolsa Família tem o potencial de funcionar como um trampolim para famílias em situação de vulnerabilidade, desde que articulado com outras políticas públicas de educação e saúde. “A dependência é, em parte, uma questão de como o programa é implementado e das oportunidades oferecidas para o desenvolvimento econômico dos beneficiários”, afirma ele.
Em suma, o Bolsa Família desempenha um papel crucial na redução da pobreza e desigualdade, mas enfrenta desafios em equilibrar o incentivo ao trabalho formal. Investir em políticas que elevem a produtividade dos trabalhadores e promovam o desenvolvimento econômico é essencial para garantir a eficácia a longo prazo deste programa social.