A Meta, empresa controladora do Facebook e do Instagram, planeja utilizar dados dos usuários brasileiros dessas redes sociais para treinar sua ferramenta de inteligência artificial. No entanto, essa iniciativa ocorre em meio a uma encenação que pretende demonstrar respeito à privacidade dos clientes.
De forma discreta, a Meta alterou sua política de privacidade recentemente. Em 16 de junho, incluiu a inteligência artificial como parte desse capítulo legal do Facebook e Instagram, anunciando que passaria a acessar dados dos usuários. O anúncio, quase imperceptível para quem não acompanha as mudanças de política da empresa, levanta questões sobre transparência.
O texto relacionado à privacidade adota um tom solene, apesar de a Meta já ter sido condenada em diversos países por uso não autorizado de dados dos usuários. A empresa afirma: “Na Meta, temos a responsabilidade de proteger a privacidade das pessoas e temos equipes dedicadas a essa tarefa em tudo o que criamos”.
Prossegue o texto: “Temos um robusto processo interno de análise de privacidade, responsável por garantir o uso de dados de forma responsável pela Meta para nossos produtos, incluindo a IA gerativa. Trabalhamos para identificar potenciais riscos de privacidade que envolvem a coleta, o uso e o compartilhamento de informações pessoais e desenvolver formas de reduzir esses riscos à privacidade das pessoas”.
A Meta oferece aos usuários a opção de se opor ao compartilhamento de seus dados, mas o processo não é simples. Em vez de uma caixa de seleção direta para recusar, a empresa exige que o usuário justifique por escrito o motivo pelo qual não deseja que suas informações sejam utilizadas. A Meta analisará esses pedidos e informará se os argumentos são aceitos.
Entretanto, existem dois problemas legais nesse documento. A Meta, ao tentar criar um texto genérico válido globalmente, ignorou a Lei Geral de Proteção de Dados brasileira, em vigor desde setembro de 2020. Segundo essa norma, dados só podem ser usados com autorização expressa do usuário e com explicação clara da finalidade.
A suspensão da coleta de dados na União Europeia ocorreu devido à falta de detalhes sobre o uso futuro dessas informações. A Meta havia planejado iniciar a coleta em 26 de junho de 2024, mas protestos de entidades de proteção à privacidade também levaram à suspensão na Inglaterra, que não faz parte da UE.
A oposição à coleta na UE foi liderada pelo European Center for Digital Rights, uma ONG com sede em Viena. “A nova política de privacidade da Meta basicamente diz que a companhia quer todos os dados públicos e não públicos de usuários que foram coletados desde 2007 e usá-los para algum tipo de corrente e futura tecnologia de inteligência artificial“.
Um ponto controverso é que a Meta afirma preservar apenas mensagens pessoais enviadas a familiares e amigos. No entanto, considerando que o Facebook e o Instagram funcionam como diários públicos da vida dos usuários, essa distinção parece questionável.
É curioso que a entidade utilize como critério de abuso a lei europeia de proteção de dados, da qual a versão brasileira é praticamente uma cópia. A conclusão é bastante óbvia: se há abuso na União Europeia, também o há aqui. A diferença reside no poder de pressão. Lá, a Meta se submete a uma ONG. Aqui, o governo criou a Autoridade Nacional de Proteção de Dados, vinculada ao Ministério da Justiça, e age com uma velocidade que me parece agoniante para uma empresa com o histórico da Meta. No último dia 19, o órgão informou ao site Aos Fatos que estava preparando um questionamento à Meta.
A autoridade considera que não houve comunicação adequada sobre a mudança na política de privacidade. Em nota ao site, a ANPD afirmou: “Considerando os princípios da boa-fé, da transparência e da responsabilização e da prestação de contas, para uma mudança dessas é essencial um claro aviso aos usuários da plataforma, para que possam escolher de maneira livre e informada o que fazer. Não há transparência quando há surpresas”.
De forma indireta, a nota expressa o que todos já sabem: as grandes empresas de tecnologia tratam o Brasil como uma república de bananas. A rede X tem coletado dados de brasileiros para treinamento de IA desde setembro do ano passado, e nada aconteceu até agora.
COMO EVITAR QUE OS SEUS DADOS SEJAM USADOS PELA IA DA META:
- abra o aplicativo do Instagram e vá para a página do seu perfil;
- clique nas 3 barrinhas que aparecem no canto superior direito;
- clique na opção “Sobre”;
- depois, selecione a opção “Política de Privacidade”;
- clique nas 3 barrinhas que aparecem no canto superior direito e role a página;
- depois, clique na opção “Outras políticas e artigos” e selecione “Como a Meta usa informações para recursos e modelos de IA generativa”;
- role até o tópico “IA generativa” e selecione a opção “direito de se opor”;
- selecione o seu país. Informe o seu endereço de e-mail e justifique por que você deseja se opor;
- a Meta irá confirmar o preenchimento do formulário com um código que será enviado para o e-mail informado;
- depois de enviado, o seu formulário será analisado pela Meta, que te dará uma resposta por e-mail.
Com informações de Poder 360