Pesquisadores da Universidade de Utrecht, na Holanda, e da Universidade Sogang, na Coreia do Sul, fizeram uma descoberta revolucionária ao criar um dispositivo que imita as funções neurais do cérebro humano, usando água e sal como componentes principais. Este marco representa uma mudança significativa no campo da inteligência artificial e da computação neuromórfica.
Durante muitos anos, a meta da ciência foi reproduzir as funções complexas do cérebro humano em dispositivos artificiais. Contudo, a maioria das tentativas se concentrava em tecnologias que se distanciavam da biologia, resultando em computadores baseados em métodos convencionais que, apesar de potentes, consomem uma quantidade considerável de energia em comparação com o cérebro humano. Agora, com este novo dispositivo, a ciência está se voltando para a natureza em busca de soluções mais eficientes e sustentáveis.
O dispositivo, chamado memristor iônico, é fruto de uma colaboração entre físicos teóricos e experimentais. Ele tem apenas 150 por 200 micrômetros, aproximadamente a largura de três ou quatro fios de cabelo humanos. Segundo informações da Gazeta Brasil, o design do dispositivo, divulgado na revista Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), é inspirado na sinapse cerebral, o componente essencial do cérebro responsável por transmitir sinais entre os neurônios. Notavelmente, este memristor iônico funciona utilizando água e sal, os mesmos elementos que compõem o meio interno do cérebro.
O funcionamento do dispositivo se baseia em um microcanal em forma de cone preenchido com uma solução de água e sal. Quando recebe impulsos elétricos, os íons presentes no líquido se movem através do canal, alterando a concentração de íons e ajustando a condutividade do canal. Este processo simula o fortalecimento ou enfraquecimento das conexões entre neurônios, replicando assim a plasticidade sináptica do cérebro humano.
O desenvolvimento deste dispositivo foi possível graças a uma combinação de teoria e experimentação. O professor Tim Kamsma, do Instituto de Física Teórica e do Instituto de Matemática da Universidade de Utrecht, desenvolveu a teoria que serviu de base para a criação do memristor iônico. Seu conceito foi acolhido por um grupo de pesquisa na Coreia do Sul, que realizou o trabalho experimental necessário para transformar a ideia em um dispositivo funcional. “A capacidade de adaptar os canais para reter e processar informações por diferentes períodos de tempo é semelhante aos mecanismos sinápticos observados em nosso cérebro”, explica Kamsma.
O que surpreende nesta descoberta é a rapidez com que a teoria se tornou prática. Em apenas três meses, os pesquisadores conseguiram desenvolver um dispositivo que correspondia às previsões teóricas do professor Kamsma.
Este avanço é um passo crucial para a criação de computadores que não apenas imitam os padrões de comunicação do cérebro humano, mas também utilizam o mesmo meio. Os pesquisadores acreditam que esta abordagem poderia resultar em sistemas computacionais significativamente mais eficientes em termos de consumo de energia e capacidade de processamento. Além disso, o memristor iônico poderia ter aplicações em uma ampla variedade de campos, desde inteligência artificial até neurociência e medicina. Por exemplo, poderia ser usado no desenvolvimento de próteses neurais mais avançadas, capazes de se comunicar de maneira mais natural com o cérebro humano. Também poderia abrir novas possibilidades no campo da computação quântica, onde a eficiência energética é um fator crucial para alcançar seu potencial.
“Quem sabe, no final das contas, isso possa abrir o caminho para sistemas computacionais que reproduzam mais fielmente as extraordinárias capacidades do cérebro humano”, afirmou Kamsma.