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Há 50 anos, os primeiros ossos de “Luzia” eram encontrados. O mais antigo fóssil humano já localizado nas Américas estava na Gruta Lapa Vermelha, em Pedro Leopoldo, na Região Metropolitana de Belo Horizonte. A descoberta é considerada um marco da arqueologia e ajuda a contar a história do povoamento das Américas.
O local onde Luzia foi achada virou unidade de conservação estadual, o Monumento Natural Estadual Lapa Vermelha. E, meio século depois, continua atraindo pesquisadores do mundo todo.
Hoje, o fóssil aguarda pelo processo de reconstituição. Isso por que ele foi atingido pelo incêndio que consumiu o Museu Nacional, no Rio de Janeiro, em 2018. Os pesquisadores estimam que, pelo menos, 80% do crânio de “Luzia” foram salvos.
Os fragmentos estão guardados em um espaço provisório após o sinistro do Museu Nacional. De acordo com a instituição, a reconstituição implica no uso de substâncias que podem inviabilizar análises moleculares posteriores. Há a possibilidade de reconstrução virtual. A física não foi descartada, mas ainda deverá ser amplamente discutida.
50 anos da descoberta de ‘Luzia’
Réplica de ‘Luzia’, fóssil mais antigo das Américas e encontrado em Minas — Foto: Carlos Eduardo Alvim/Globo Minas
Os trabalhos que resultaram na descoberta do fóssil começaram em 1971, quando uma pequena turma de pesquisadores, liderada pela arqueóloga francesa Annette Laming-Emperaire, iniciou prospecções em busca de espaços adequados para escavações.
A Lapa Vermelha se destacou e, em 1973, os pesquisadores retornaram, em uma equipe maior, com aproximadamente 25 pessoas, e encontraram as primeiras pinturas rupestres. Em 1974, os primeiros ossos de Luzia começaram a ser localizados.
- A estimativa é de que ela tenha vivido na região entre 11 mil e 12 mil anos atrás.
“Começaram a aparecer várias peças do esqueleto, braços, bacia, pernas, que estavam espalhados no sítio. Ou seja, não era um enterro. Ela podia ter sido enterrada, mas tinha havido uma erosão, e os ossos começaram a descer junto com a terra que vinha dos lados. Portanto, não estava mais no lugar original”, explicou o arqueólogo e professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) André Prous, que integrava a equipe.
Em 1975, os pesquisadores ampliaram a área de escavações – foi quando encontraram o crânio de Luzia. No nível em que ele foi localizado, não havia outros vestígios humanos, apenas restos alimentares e fragmentos de instrumentos de pedra.
Morte de ‘Luzia’ ainda é mistério
As circunstâncias da morte dela ainda são um mistério.
“O que ela estava fazendo no fundo do buraco? Não é um lugar aonde você vai normalmente. […] Era uma mulher jovem, acidente cardíaco provavelmente não teve. Ela pode ter fugido de alguma coisa, se escondido de alguma coisa. Será que ela fugiu de uma fera? Não tem marcas nos ossos que indicam isso. Nós não sabemos e, para nós, isso é irrelevante em termos de reconstituição do povoamento das Américas”, disse Prous.
Como era Luzia
Reconstituição do fóssil de Luzia feita por computador — Foto: Reprodução/TV Globo
Outro mistério envolve a aparência de Luzia, nome dado pelo arqueólogo e antropólogo Walter Neves em homenagem a Lucy, esqueleto de mais de 3 milhões de anos achado na Etiópia, em 1974.
Na década de 1990, estudos indicaram que a América teria sido ocupada por duas “levas” distintas vindas da Ásia: a primeira, de indivíduos com morfologia parecida com a dos africanos e australianos atuais, e a segunda, de indivíduos com características semelhantes aos indígenas atuais.
Segundo essa teoria, “Luzia” seria da primeira leva. Em 1999, o antropólogo forense britânico Richard Neave fez a reconstrução artística do rosto da “primeira brasileira” com base nessa hipótese.
No entanto, estudos mais recentes apontaram que o código genético do povo de Luzia seria, na verdade, semelhante ao dos indígenas da América.
“Pesquisas de arqueogenética publicadas recentemente mostram que o patrimônio genético dos lagoa-santenses é muito mais semelhante ao dos ameríndios do que a grupos negroides, então isso sugere que Luzia e os próprios lagoa-santenses sejam mais parecidos com os indígenas atuais, mas é um mistério ainda”, disse o arqueólogo do IEF Leandro Vieira.
Segundo ele, sobre o modo de vida de “Luzia,” uma hipótese é a de que ela pertencia a grupos nômades, que viviam da caça e da pesca.
Gruta
Lapa Vermelha, região onde o fóssil Luzia foi encontrado — Foto: Governo de Minas Gerais/Divulgação
O Monumento Natural Estadual Lapa Vermelha, localizado dentro de uma fazenda particular em Pedro Leopoldo, não é aberto a visitantes, mas visitas técnicas são permitidas mediante acompanhamento do Instituto Estadual de Florestas (IEF).
O espaço possui ambientes intactos e pinturas e gravuras espalhadas em suportes rochosos.
“O monumento é cercado para que não entre gado, não venham animais aqui dentro, e ele é preservado… Como aqui é cheio de sítios arqueológicos, onde a gente pisa pode ter alguma peça, algum fóssil, que a gente não sabe. É preservado por esse motivo, a gente não pode ficar pisoteando em cima de sítios arqueológicos”, explicou o gerente do monumento, José Roberto da Costa.
Créditos: G1.