O Senado está analisando um relatório preliminar para a atualização do Código Civil, que dedica um capítulo inteiro aos direitos dos animais, sugerindo uma nova perspectiva jurídica para eles. Segundo o relatório, os animais serão legalmente reconhecidos como seres capazes de sentir e possuir direitos. Esta proposta, elaborada por um grupo de juristas, será discutida em uma sessão temática no plenário do Senado na próxima quarta-feira (17).
O Código Civil é a legislação que estabelece os direitos e deveres das pessoas no contexto civil, isto é, nas relações jurídicas que envolvem indivíduos na sociedade. Ele aborda temas como contratos, propriedade, família, sucessões, obrigações e responsabilidade civil, entre outros aspectos do direito privado. O Código Civil brasileiro foi instituído em 1916 e passou por várias reformas ao longo do tempo para se adaptar às mudanças sociais e jurídicas.
Atualmente, a lei considera os animais como bens móveis, ou seja, são tratados como objetos de propriedade, sem personalidade jurídica ou direitos próprios reconhecidos pela lei. No entanto, o capítulo do anteprojeto do novo Código Civil dedicado aos animais estabelece que eles devem ser considerados “seres vivos dotados de sensibilidade e passíveis de proteção jurídica”, e que a relação entre pessoas e animais pode levar a uma disputa pela tutela.
Durante o debate, o juiz federal Vicente de Paula Ataíde Junior, consultor para o tema dos direitos dos animais na Ajufe (Associação dos Juízes Federais do Brasil), apoiou a redação do artigo e destacou que a Constituição coloca o Brasil na vanguarda da defesa dos direitos dos animais. Para ele, essa visão deveria ser expandida no Código Civil.
Segundo informações do R7, o juiz afirmou que “é mais do que evidente que a reforma do Código Civil não pode ficar aquém dos progressos já registrados pelos códigos civis europeus, que há anos já afirmam: ou que animais não são coisas, ou que animais são seres vivos dotados de senciência ou sensibilidade”. Ele mencionou as leis estaduais que reconhecem os direitos dos animais, começando por Santa Catarina e seguido por Rio Grande do Sul, Minas Gerais, Espírito Santo, Goiás, Paraíba, Pernambuco, Roraima e Amazonas.
Ele completou dizendo que “não podemos perder esse acervo jurídico que vem se formando no âmbito da legislação estadual e municipal. Isso significa que a reforma quanto ao status jurídico dos animais, a reforma do Código Civil, não pode ser cosmética ou simbólica, mas deve significar um avanço efetivo na proteção jurídica dos animais pela sua adequada qualificação no ordenamento jurídico”.
Embora o texto represente um avanço nos direitos dos animais, essa nova previsão é apenas o começo em direção à proteção completa dos direitos dos animais. Isso porque, se o texto for aprovado, ainda será necessária a criação de uma lei para regulamentar o tratamento físico e ético adequado aos animais, como explica o jurista Iago Moura.
Ele detalha que “o caminho da proteção dos direitos dos animais continua a ser construído com o auxílio de uma legislação nacional de referência. Enquanto perdurar esse hiato normativo, serão aplicadas aos animais as disposições relativas aos bens, já constantes do Código Civil de 2002, desde que tais normas não sejam incompatíveis com a natureza e a sensibilidade dos animais, conforme preconiza o parágrafo terceiro do artigo 91-A”.
Ele completa dizendo que “tendo em vista que a normatização específica, via lei especial, ainda não é uma realidade, não é possível tirar conclusões sobre a dimensão em que as mudanças irão ocorrer. No entanto, o que se pode afirmar é que o novo Código revela, ainda que timidamente e não sem algum atraso, estar atento a uma tendência verificada internacionalmente, inclusive nos Tribunais, de reconhecimento da senciência dos animais como uma justa razão para que lhes sejam conferidos direitos específicos”.
O conteúdo do Novo Código Civil foi discutido por uma comissão especial de juristas, formada pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), em agosto de 2023. O anteprojeto será posteriormente convertido em um projeto de lei, a ser debatido no Senado e na Câmara dos Deputados.