Sob a administração do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), veículos de comunicação que compartilham uma linha editorial semelhante à do governo começaram a receber fundos de publicidade federal, após um período de quatro anos sem tais repasses durante o mandato do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Em 2023, a revista Carta Capital foi beneficiada com R$ 1,1 milhão em anúncios, um valor superior ao recebido por outros veículos de mídia tradicionais, como O Globo, Estadão ou Folha de S. Paulo. O site Brasil247, que também possui uma linha editorial mais voltada para a esquerda, recebeu R$ 745 mil.
Por outro lado, a Jovem Pan, que tem uma linha editorial mais à direita, sofreu uma redução de 99% na verba de publicidade. Os fundos caíram de R$ 6,6 milhões no último ano de Bolsonaro para R$ 90 mil no primeiro ano de Lula. Durante o governo de Bolsonaro, a emissora havia visto um aumento em seus ganhos.
Os números, ajustados pela inflação, são provenientes de uma pesquisa do Poder360 com o Planejamento de Mídia do Sicom (Sistema de Comunicação de Governo do Poder Executivo Federal), uma base de dados que compila os pagamentos publicitários do Planalto e dos ministérios a partir de 2019.
Na noite de sexta-feira (5.abr), a reportagem solicitou um posicionamento da Secom (Secretaria de Comunicação Social) sobre a alteração no padrão de pagamentos publicitários. No momento da publicação deste texto, ainda não havia recebido uma resposta.
Em uma matéria anterior sobre publicidade federal, a assessoria do órgão emitiu uma nota afirmando que a veiculação segue critérios técnicos e que não faria comparações com o governo anterior.
A nota também mencionava possíveis distorções na base de dados do Sicom, utilizada pela reportagem. Segundo a Secretaria de Comunicação, a interpretação dos dados está equivocada. Quando questionada sobre quais seriam os dados e a interpretação corretos, a Secom não os forneceu ao Poder360.
Jornalistas de veículos com uma linha editorial mais à esquerda também se aproximaram do atual governo e foram convidados para um café da manhã no Palácio do Planalto em fevereiro de 2023.
Nesse evento, o presidente acolheu jornalistas de 41 veículos de mídia, descritos como “independentes” ou “alternativos” pela Presidência da República. A maioria deles se identifica como de esquerda e tem uma linha editorial alinhada às ideias defendidas pelo governo petista.
VEíCULOS TRADICIONAIS
Lula voltou gastar com publicidade estatal para jornais e revistas tradicionais em seu 1º ano de volta ao Palácio do Planalto. Anúncios feitos pela Secom e ministérios a 7 veículos pesquisados pelo Poder360 saíram de R$ 117.000 em 2022, sob Bolsonaro, para R$ 3,2 milhões no 1º ano do petista.
Os valores repassados ainda não superaram os do último ano de Michel Temer. Em 2018, o mesmo conjunto de veículos recebeu R$ 16,4 milhões em publicidade. Naquela época, apenas os pagamentos da Secom foram considerados. Os dados dos ministérios só começaram a ser contabilizados a partir de 2019.
Segundo os dados do Sicom, o jornal O Globo foi o que mais recebeu recursos, com R$ 909 mil em anúncios em 2023. Em seguida, vieram a Folha de S.Paulo (R$ 694 mil) e a Veja (R$ 513 mil).
Esses valores incluem anúncios impressos e online desses veículos, que experimentaram um aumento incomum de assinaturas em 2023 devido a uma nova política que considera assinaturas de valores baixos (menos de R$ 2 por mês). Nesse cenário, a Folha lidera em número de assinaturas digitais pagas (756 mil), seguida pelo O Globo (348 mil).
Em 2023, o IVC (Instituto Verificador de Comunicação, controlado pelos próprios jornais) alterou sua metodologia contábil, permitindo que quem paga pelo menos R$ 1,90 seja considerado assinante. Anteriormente, a regra era diferente: só seria válido se a assinatura fosse 10% do preço total de comprar o veículo na versão impressa por 30 dias. Na prática, não houve um aumento significativo de leitores em 2023, apenas uma nova maneira de contabilizar o número de assinantes.
Metodologia
Os gastos com publicidade da Secretaria de Comunicação e outros ministérios estão incluídos nos dados desta pesquisa. No entanto, os investimentos feitos por empresas estatais não estão contabilizados.
O site Poder360 ajustou todos os valores considerando a inflação. No caso da Jovem Pan, que possui uma rede de rádios parceiras, os anúncios para esses canais também foram levados em conta.
As informações sobre a publicidade das empresas estatais não estão acessíveis. De 1999 (durante o mandato de Fernando Henrique Cardoso) até 2016 (final do governo de Dilma Rousseff), o governo federal proporcionou um maior nível de transparência. No entanto, em 2017, durante o governo de Michel Temer, os dados das empresas estatais deixaram de ser divulgados, representando um retrocesso na transparência. Foi quando o IAP (Instituto para Acompanhamento da Publicidade), responsável por coletar e organizar os dados sobre a publicidade da União, deixou de operar.
O IAP, uma entidade paraestatal localizada em São Paulo, era financiado por uma pequena porcentagem retirada do faturamento das agências de publicidade que tinham contratos com o governo federal e empresas públicas. Naquela época, custava R$ 1,4 milhão por ano (pouco mais de R$ 100 mil por mês).
No entanto, em março de 2017, as agências optaram por cessar o financiamento e o governo de Michel Temer decidiu não intervir.
Com informações e imagens de Poder 360