Neste domingo (11) é celebrada a memória das 2.996 vítimas que morreram durante os atentados terroristas de 11 de Setembro, em 2001. Quatro aviões foram sequestrados por membros da Al-Qaeda, e jogados contra o World Trade Center, em Nova York, o Pentágono, em Washington, além do voo retomado à força por passageiros que viria a cair em campo aberto na Pensilvânia.
A data ficou marcada para sempre na história dos Estados Unidos e nenhum evento como este aconteceu nos 21 anos seguintes. A chamada guerra ao terror implementada pelo governo de George W. Bush após os atentados, porém, teve um marco final em 2021 com a retirada das tropas norte-americanas do Afeganistão, conciliada com a volta do Talibã ao poder.
Junto destes fatores, o assassinato do atual líder da Al-Qaeda, Ayman al-Zawahiri, morto por um drone americano em julho deste ano, no Afeganistão, traz um questionamento: novos ataques terroristas como os de 11 de Setembro podem voltar à realidade dos EUA?
O professor de relações internacionais da Fespsp (Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo) e FMU-SP (Faculdades Metropolitanas) Bernardo Wahl destaca, em entrevista ao R7, conta que Zawahiri não trouxe os holofotes a Al-Qaeda como Osama bin Laden fez e que um novo chefe para o grupo pode revigorar a moral da célula.
“Com o novo dirigente que vier a assumir, a Al-Qaeda poderá se regenerar e se tornar mais dinâmica. Após Osama Bin Laden, Zawahiri conseguiu manter o grupo vivo, embora não tão destacado, em meio à ascensão do Estado Islâmico”, explica Wahl. “O novo líder que vier a assumir o comando da organização poderá revigorá-la”.
Ainda de acordo com o professor, os trilhões de dólares investidos na guerra ao terror dos EUA contra Afeganistão e Iraque não foram suficientes para destruir o grupo que popularizou a jihad — guerra santa para os muçulmanos.
“No mundo jihadista, a Al-Qaeda tem uma importância histórica, no sentido de ter globalizado a jihad e atacado os símbolos do poder norte-americano. Tal organização joga uma partida de longo prazo: reconstruiu-se e se reagrupou silenciosamente enquanto o mundo se concentrava em derrotar o Estado Islâmico e destruir seu califado.”
O novo grande inimigo: o Estado Islâmico
Se a primeira década dos anos 2000 foi marcada pela busca a bin Laden, líder da Al-Qaeda na época, a década seguinte foi focada na destruição do novo grande grupo terrorista: o Estado Islâmico (EI).
Diferente da Al-Qaeda, o EI iniciou uma jornada de conquista de territórios no Oriente Médio. Sob o comando de Abu Bakr al-Baghadi, morto em 2019 pelo governo de Donald Trump, o núcleo terrorista conseguiu dominar 40% das terras do Iraque e 33% da Síria durante o auge da construção do que seria o califado do grupo.
As ações do Estado Islâmico chocaram o Ocidente, com uma dominação agressiva e violenta. O núcleo terrorista tinha a tecnologia como uma das armas para divulgar imagens dos atos de barbárie, com o objetivo de atrair novos membros e mostrar ao mundo o que eram capazes de fazer.
Em entrevista ao R7, o cientista político Leonardo Paz Neves, integrante do Núcleo de Prospecção e Inteligência Internacional da FGV (Fundação Getulio Vargas), conta que apesar da perda de influência e territórios do EI nos dias de hoje, ainda assim o grupo continua em atividade com atentados isolados.
“O [EI] foi duramente combatido. Então, naturalmente eles vão perdendo força e território. Hoje continuam atuando, mas como um grupo muito menor, numa lógica mais de guerrilha, não de ocupação de território como eles tinham antes”, explica Neves ao R7.
Grandes potências militares enfrentaram o Estado Islâmico, como EUA e Rússia, além de outras nações do Oriente Médio, como Irã, Iraque e Síria. Para Neves, a forma como o grupo agia não permitiria que eles vivessem em expansão por muito tempo.
“Me parecia óbvio desde o início [que eles perderiam força] porque não tinham condições de ter acesso a recurso, armamento e tudo que você pode imaginar. Afinal, apesar de controlar parte dos territórios, eles não produziam muita coisa. Dependiam muito de roubos, basicamente de saques.”
Hoje o grupo vive de atentados isolados, como o realizado contra a embaixada da Rússia em Cabul, no Afeganistão. Parte dos participantes no grupo procuram países sem a presença de tropas ocidentais, como o Mali, onde o grupo está em ascensão.
“Vai ser difícil o Estado Islâmico sumir efetivamente, eles continuam obviamente existindo. E como todo grupo terrorista, isso permite que por menor que eles sejam, eles tenham capacidade de fazer atentados contra outros países, inclusive atentados grandes”, ressalta Neves.
Afeganistão pode ser um novo celeiro jihadista?
As tropas dos Estados Unidos deixaram o Afeganistão em agosto de 2021 após permanecer cerca de 20 anos no país. Quando chegaram, o Talibã chefiava o Estado, e quando saíram, o mesmo Talibã retornou ao poder. O enorme esforço de guerra foi visto como um fracasso, coroado com uma saída atrapalhada dos militares norte-americanos em solo afegão.
Após o 11 de Setembro, Bush dizia que o Afeganistão era a sede da Al-Qaeda e usou este discurso como pretexto para invadir o país. Nesta segunda empreitada do Talibã no poder, porém, não há indícios que uma nova célula do grupo terrorista criado por bin Laden possa promover atentados terroristas planejados lá.
“Uma avaliação de inteligência dos EUA preparada depois que Washington matou o líder da Al-Qaeda Ayman al-Zawahiri revelou que o grupo não reconstituiu sua presença no Afeganistão desde que todas as tropas norte-americanas deixaram o país”, explica Wahl.
Ainda segundo o professor de relações internacionais, menos de dez integrantes da Al-Qaeda permanecem no Afeganistão, estes os quais não estariam planejando qualquer tipo de ataque a países do Ocidente ou dentro do próprio território afegão.
Neves ressalta o ponto econômico desfavorável ao Talibã, que possui as reservas financeiras afegãs bloqueadas em bancos americanos. Desta forma, não é interessante para o novo governo que figure na lista de países que patrocinam o terrorismo.
“Hoje o Afeganistão está em uma situação muito dramática porque a maior parte das reservas eram, obviamente, controladas pelos americanos porque o país estava com o governo aliado aos EUA. E na medida que o Talibã retoma o governo, todo esse dinheiro, todas as reservas, foram bloqueadas”, conta Neves.
Atualmente, o Talibã, e consequentemente o Afeganistão, precisam lidar com o a célula terrorista conhecida como Estado Islâmico Khorasan. Entretanto, para Wahl, isto não significa que no futuro o país não possa ajudar outro grupo extremista, como a Al-Qaeda.
“Essa situação pode mudar no futuro, isto é, a Al-Qaeda pode novamente voltar a usar o Afeganistão como um santuário para organizar ataques contra os Estados Unidos”, conta Wahl.
“Do ponto de vista objetivo, o Talibã continua sendo um grupo terrorista. Neste momento, o Afeganistão passa a ser um Estado que patrocina o terrorismo [para os EUA]”, conclui Neves.
Créditos: R7.