A maioria dos norte-coreanos que migraram para a Coreia do Sul nos últimos dez anos relatou não ter recebido alimentos do governo liderado por Kim Jong-un, revelou um levantamento divulgado pelo Ministério da Unificação de Seul nesta terça-feira (6). Em meio a recursos escassos, muitos cidadãos da Coreia do Norte dependiam do mercado informal para garantir sua sobrevivência.
O extenso relatório de 280 páginas sobre a situação econômica e social do país compilou informações provenientes de entrevistas realizadas com mais de 6.300 desertores no período de 2013 a 2022. Esta é a primeira vez que os resultados dessas pesquisas são divulgados.
A Coreia do Norte tem enfrentado carência de alimentos ao longo das últimas décadas, com crises que ocasionalmente foram agravadas por desastres naturais. A economia do país asiático continua sujeita a sanções da comunidade internacional e sofreu os impactos da redução do comércio transfronteiriço durante a pandemia.
Em maio de 2019, Pyongyang diminuiu as rações de alimentos distribuídas à população de 380 para 300 gramas diários, atingindo o nível mais baixo para aquele período do ano, alertando a ONU sobre a situação. Na ocasião, as Nações Unidas destacaram que o governo norte-coreano poderia ser compelido a fazer cortes adicionais caso não recebesse ajuda internacional.
O estudo sul-coreano revela que 72% dos desertores que chegaram à Coreia do Sul entre 2016 e 2020 afirmaram nunca ter recebido alimentos do regime. Antes do ano 2000, esse número era de 62%, conforme apontou Seul. Muitas famílias têm uma ingestão insuficiente de proteínas, subsistindo predominantemente com uma dieta baseada em arroz e kimchi, uma preparação fermentada de vegetais.
Aproximadamente metade dos norte-coreanos também relatou não ter recebido salários ou alimentos de seus empregadores, em comparação com cerca de um terço antes do ano 2000. Por outro lado, quase 94% dos entrevistados afirmaram ter a capacidade de ganhar dinheiro por meio do comércio informal nos mercados.
“Pudemos confirmar que os ambientes habitacional, médico e educacional da população norte-coreana ainda são subdesenvolvidos, e a mercantilização continua em muitos aspectos de seus meios de subsistência”, disse o ministro da Unificação, Kim Yung-ho, mencionado no relatório.
No último mês, durante uma reunião com membros do partido, Kim Jong-un alertou que negligenciar o fornecimento das necessidades básicas da população, incluindo alimentos, constituía uma “questão política grave”, conforme divulgado pela mídia estatal.
De acordo com informações do governo sul-coreano, 41% dos entrevistados afirmaram ter tido uma redução de pelo menos 30% em sua renda desde que Kim Jong-un assumiu o poder no final de 2011. Mais de 54% dos desertores que chegaram à Coreia do Sul admitiram ter subornado funcionários do regime pelo menos uma vez, enquanto esse percentual era de apenas 14% antes de 2000.
No âmbito político, 56% dos entrevistados que fugiram após 2016 expressaram opiniões negativas sobre a ascensão de Kim ao poder, enquanto 26% consideraram legítima a sucessão dinástica. Menos de 30% dos entrevistados apoiaram a sucessão hereditária, em comparação com 57% entre aqueles que fugiram antes de 2000.
O estudo também destacou o aumento da influência da cultura estrangeira, com 83% dos desertores que chegaram após 2016 relatando terem assistido a conteúdo de vídeo estrangeiro, como dramas chineses ou sul-coreanos, em comparação com aproximadamente 8% antes de 2000.
Com informações da Folha de SP/RENAN MARRA