O pedido de recuperação judicial da Gol, a segunda maior companhia aérea do Brasil, em 25 de janeiro, não foi exatamente uma surpresa, mas causou impacto no setor. Naquela quinta-feira, a empresa formalizou na Justiça dos Estados Unidos sua solicitação para ser admitida no Capítulo 11, uma medida legal semelhante à recuperação judicial no Brasil. “Não há previsão de diminuição das operações da Gol, o processo do Capítulo 11 é para proteger a companhia (…), ele dá o tempo e as condições para que a negociação seja feita”, disse o presidente da Gol, Celso Ferrer, após o anúncio. O pedido foi aceito no dia seguinte.
O caminho da Gol pela renegociação já estava no radar dos especialistas. No terceiro trimestre de 2023, sua dívida chegava a 20 bilhões de reais e, com 1 bilhão de reais em caixa, a companhia já não teria condição de honrar contas de curto prazo. “Chega um ponto em que ou a empresa paga os custos de operação, e continua voando, ou paga as dívidas”, diz Ygor Araújo, analista da corretora Genial.
A Gol não enfrenta seus desafios isoladamente. Ela integra um setor que sofreu um desequilíbrio significativo, tanto no Brasil quanto globalmente, devido aos impactos da pandemia em 2020. Até o momento, as principais empresas aéreas brasileiras continuam lidando com os efeitos das crises financeiras, escassez de peças e aeronaves, altos custos de combustível e preços de passagens que continuam desafiando recordes.
Em 2020, a Latam e a Azul iniciaram reestruturações de dívida. “A Latam saiu mais forte desse processo e entra em 2024 otimista, prevendo ampliar de 7% a 9% a sua operação doméstica neste ano”, afirmou a empresa em nota. Procurada, a Azul não comentou. Juntas, as três empresas respondem por 99% das viagens dentro do país. Houve ainda o caso da Avianca, que entrou em recuperação em 2018 e encerrou as atividades no Brasil dois anos depois. E da ITA, inaugurada em maio e fechada em dezembro de 2021. “O número de passageiros foi a quase zero em 2020”, diz André Castellini, sócio da consultoria Bain & Company. “As companhias ficaram sem receita, mas seguiram tendo que pagar leasing, fornecedores, funcionários. A dívida acumulada acabou enorme.”
O leasing, ou arrendamento, é o contrato de aluguel dos aviões e um dos principais custos das aéreas. Muitas dessas cobranças foram renegociadas para pagar depois. Outras tantas foram roladas com novos empréstimos — todos mais caros, conforme os juros subiam. É esse “meteoro” de contas que começou a vencer todo de uma vez e a sugar as receitas.
A crise tomou tal proporção que virou assunto de governo. Desde o ano passado, há tentativas de desenhar programas que baixem os preços das passagens. Nas últimas semanas, frente aos problemas na Gol, as reuniões entre o setor e o ministro de Portos e Aeroportos, Silvio Costa Filho, se intensificaram. Uma proposta na mesa é a criação de um fundo de crédito para as aéreas de até 6 bilhões de reais. Também se buscam maneiras de suavizar os preços do querosene de aviação, um monopólio da Petrobras. “Ninguém está pedindo dinheiro de graça, tudo que o setor receber será pago de volta”, afirma Jurema Monteiro, presidente da Associação Brasileira das Empresas Aéreas.
A possível falência de uma das empresas representaria um desafio significativo. Com a redução da concorrência, existe a possibilidade de aumento nos preços das passagens. É imperativo encontrar uma saída da situação turbulenta.
As informações são da VEJA/JULIANA ELIAS