A linha que separa a cobrança por resultados da humilhação é rompida quando condições neurodivergentes viram motivo de chacota. Um caso recente reafirmou que a indenização por assédio moral é o caminho legal para punir empresas que toleram ou incentivam o bullying contra colaboradores com TDAH.
O “troféu da vergonha” e a institucionalização do bullying
O ambiente de trabalho tornou-se um cenário de tortura psicológica para uma profissional que, devido ao Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), possuía um ritmo de aprendizado singular. Em vez de suporte, ela recebeu apelidos pejorativos como “lerda” e “dorminhoca”, além de ataques à sua fé com o termo “gospel”.
A crueldade atingiu o ápice quando os colegas, com a participação ativa do supervisor, organizaram uma votação para eleger a pessoa “mais lenta do setor”. A entrega de um troféu simbólico e de um certificado com frases ofensivas materializou a perseguição, transformando o assédio em um evento público dentro da empresa.
Quais as provas médicas e materiais confirmam o abalo psicológico?
Diferente de casos onde há apenas testemunhos verbais, a vítima reuniu provas concretas da hostilidade, anexando ao processo o próprio “prêmio” que recebeu. Além do objeto, laudos médicos comprovaram que a exposição contínua desencadeou crises de ansiedade e agravamento do seu estado emocional.
A defesa da empresa, alegando que o ambiente era respeitoso e focado apenas em “melhorar o atendimento”, caiu por terra diante da materialidade dos fatos. A Justiça entendeu que não houve gestão de desempenho, mas sim uma conduta discriminatória que violou a dignidade da trabalhadora.
Veja abaixo as práticas que configuraram o abuso de poder neste caso:
- Exposição ao ridículo: Organizar votações depreciativas entre a equipe.
- Intolerância religiosa: Usar a fé da funcionária como adjetivo pejorativo.
- Omissão da liderança: O supervisor não apenas permitiu, mas participou da zombaria.
- Estigmatização do TDAH: Tratar sintomas de uma condição médica como falha de caráter ou preguiça.
Qual a redução do valor da indenização nos tribunais superiores?
Embora a primeira instância tenha fixado a punição em R$ 50.000,00, o Tribunal Regional do Trabalho (TRT) optou por reduzir o montante. O entendimento foi de que o valor de R$ 20.000,00 seria suficiente para cumprir o caráter pedagógico da pena sem gerar enriquecimento sem causa, decisão mantida posteriormente pelo TST.
A condenação financeira, mesmo reduzida, envia um recado claro às corporações: a omissão diante de preconceitos custa caro. A empresa responde pelos atos de seus gestores (responsabilidade civil), sendo dever do RH e da diretoria intervir imediatamente ao notar sinais de ambiente tóxico.
Neurodivergência exige acolhimento, não piadas
Este julgamento destaca a urgência de políticas de inclusão real para pessoas neurodivergentes. O TDAH não é uma escolha, e as dificuldades executivas decorrentes dele devem ser geridas com adaptação de processos e ferramentas, jamais com isolamento social ou escárnio público.
Se você presencia situações onde “brincadeiras” sistemáticas visam diminuir um colega por suas características pessoais, não seja conivente. Denuncie aos canais de ética ou busque orientação jurídica para frear o ciclo de violência psicológica.
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Limites legais do humor e respeito à diversidade
- O assédio moral se configura pela repetição de condutas humilhantes, sendo agravado quando há participação da chefia.
- Empresas têm o dever legal de proteger a integridade mental de funcionários com TDAH, adaptando o trabalho em vez de punir a condição.
- A prova documental, como o “troféu” ofensivo, é determinante para garantir a reparação judicial em casos de discriminação.