A tirzepatida, conhecida no Brasil principalmente pelo nome comercial Mounjaro, voltou ao centro das discussões em saúde após a atualização das regras de uso pela Anvisa em outubro de 2025, que incluiu a apneia obstrutiva do sono associada à obesidade entre as indicações do medicamento e permitiu que cirurgiões-dentistas o prescrevessem em situações específicas relacionadas a pacientes com apneia acompanhados em consultório odontológico, gerando intenso debate sobre limites de atuação profissional, segurança do paciente e necessidade de abordagem multidisciplinar.
O que é a tirzepatida (Mounjaro) e em quais casos ela é indicada?
A tirzepatida é um fármaco injetável utilizado principalmente para o tratamento da obesidade em adultos e, em alguns contextos, para o controle glicêmico em pessoas com diabetes tipo 2. Atua em receptores hormonais relacionados à saciedade e ao controle da glicemia, favorecendo a perda de peso e a melhora de parâmetros metabólicos, sempre integrada a mudanças de estilo de vida.
Com a inclusão da apneia obstrutiva do sono ligada à obesidade entre as indicações, a Anvisa reconhece a relação entre excesso de peso, acúmulo de gordura cervical e colapso das vias aéreas superiores durante o sono. Nesses casos, o emagrecimento com tirzepatida pode reduzir a gravidade da apneia, melhorar a oxigenação e diminuir o risco cardiovascular, sem substituir outras terapias como CPAP ou dispositivos intraorais.
- Indicação principal – tratamento da obesidade em adultos com índice de massa corporal elevado;
- Indicação associada – manejo da apneia obstrutiva do sono relacionada ao excesso de peso;
- Abordagem complementar – uso em conjunto com alimentação equilibrada, atividade física e acompanhamento regular.
Por que dentistas agora podem prescrever tirzepatida em apneia do sono?
A apneia obstrutiva do sono é frequentemente identificada em consultórios odontológicos, especialmente em pacientes que utilizam dispositivos intraorais para avanço mandibular ou tratam bruxismo e alterações de oclusão. Nessas situações, o cirurgião-dentista acompanha o quadro de forma contínua, observa sinais de ronco, pausas respiratórias relatadas e sonolência diurna, encaminhando para exames como a polissonografia.
Ao incluir essa condição entre as indicações da tirzepatida, a Anvisa considerou que a apneia relacionada à obesidade faz parte da rotina de avaliação de alguns profissionais da odontologia. Assim, reconheceu que o dentista pode, em cenários específicos e de forma compartilhada com médicos, participar do diagnóstico, do acompanhamento e da prescrição, desde que respeitada a legislação profissional e os limites de sua formação clínica.
- Avaliação clínica da apneia em ambiente odontológico;
- Identificação de relação entre obesidade e sintomas respiratórios noturnos;
- Integração com exames e relatórios médicos, quando disponíveis;
- Possibilidade de prescrição da tirzepatida em contexto de acompanhamento compartilhado.
Quais são os principais pontos de divergência entre medicina e odontologia?
Após a atualização das regras, o Conselho Federal de Odontologia manifestou apoio à decisão, alegando que o cirurgião-dentista tem respaldo legal para prescrever medicamentos vinculados às condições que acompanha diretamente. A entidade ressalta, contudo, que a tirzepatida é um fármaco de uso complexo, destinado a pessoas com obesidade e múltiplas comorbidades, o que exige avaliação criteriosa de riscos, efeitos adversos e interações medicamentosas.
Na medicina, conselhos e sociedades adotaram postura mais restritiva, destacando que o Mounjaro interfere em sistemas metabólicos amplos e demanda conhecimento aprofundado em áreas como endocrinologia, cardiologia e nefrologia. Para esses especialistas, o manejo global do paciente com obesidade e apneia inclui controle de pressão arterial, função hepática e perfil glicêmico, elementos tradicionalmente ligados à prática médica, embora ambos os lados concordem na importância da atuação multidisciplinar.
- Odontologia – defende a prescrição em situações diretamente ligadas à apneia acompanhada no consultório;
- Medicina – questiona se o escopo de formação do dentista abrange todo o manejo de um fármaco para obesidade;
- Ponto comum – foco na segurança do paciente e no trabalho em equipe multidisciplinar integrada.
Como deve ser feita a prescrição segura do Mounjaro na apneia obstrutiva do sono?
A recomendação predominante entre entidades de saúde é que a prescrição da tirzepatida, por médicos ou cirurgiões-dentistas, ocorra em ambiente de integração entre especialidades. Isso inclui o compartilhamento de informações, exames e histórico do paciente, bem como a definição clara do papel de cada profissional no plano terapêutico, envolvendo endocrinologistas, pneumologistas, otorrinolaringologistas e dentistas do sono.
Entre os cuidados sugeridos estão a avaliação de contraindicações, a explicação detalhada sobre o modo de uso e o monitoramento contínuo de possíveis reações adversas, como alterações gastrointestinais, perda de peso acelerada e impactos no controle glicêmico. Também é fundamental orientar mudanças de hábitos, ajustar dispositivos intraorais quando utilizados e acompanhar regularmente o padrão de sono e a evolução da apneia com exames objetivos.
- Confirmar a relação entre apneia e obesidade com base em critérios diagnósticos;
- Analisar o histórico clínico completo, incluindo uso de outros medicamentos;
- Definir metas realistas de perda de peso e melhora da qualidade do sono;
- Estabelecer acompanhamento periódico com registro de sinais e sintomas;
- Manter comunicação ativa entre todos os profissionais envolvidos no cuidado.
Com a ampliação das regras de uso da tirzepatida pela Anvisa, a rotina de consultórios médicos e odontológicos tende a passar por ajustes e protocolos mais bem definidos. A expectativa é que discussões técnicas e normativas avancem à medida que novas evidências e experiências clínicas sejam reunidas, mantendo como prioridade o cuidado baseado em ciência, o monitoramento próximo e a divisão clara de responsabilidades entre os profissionais de saúde.
