Nos primeiros anos de existência do real, a moeda brasileira chegou a valer mais que o dólar. Em outubro de 1994, o dólar comercial era cotado a R$ 0,829 na venda, enquanto o turismo estava a R$ 0,831, conforme dados do Banco Central, conforme informações da Folha de S. Paulo.
Essa valorização ocorreu devido à política de paridade cambial adotada como parte do Plano Real, que buscava controlar a inflação sem recorrer ao congelamento de preços, estratégia falida em planos econômicos anteriores. Sob esse regime, a moeda americana deveria manter-se próxima de R$ 1.
“Era um regime intermediário de câmbio [nem livre, nem fixo], de taxas administradas, com uma desvalorização arbitrada pelo governo”, explica Roberto Padovani, economista-chefe do banco BV e ex-assessor do Ministério da Fazenda durante a concepção do plano.
Para sustentar a taxa de câmbio, o governo brasileiro utilizou suas reservas internacionais em momentos de aumento da demanda por dólares. Além disso, as taxas de juros foram mantidas em níveis elevados, acima de 50% ao ano, para atrair investidores estrangeiros e conter o consumo.
Foi assim que nos primeiros anos, o real conseguiu valer mais que o dólar. “Ao mesmo tempo que o câmbio baixo ajuda a controlar a inflação, ele estimula a importação. Foi uma festa, se comprava bolo norueguês e queijo suíço no supermercado”, relembra Padovani.
Desde então, o real enfrentou uma desvalorização significativa. Em 21 de junho, o dólar era cotado a R$ 5,4406 (comercial) e R$ 5,657 (turismo), uma queda de mais de 500% em relação às cotações iniciais.
Essa desvalorização, no entanto, é menor que a inflação acumulada no período. De julho de 1994 a maio de 2024, o IPCA subiu 708% no Brasil, enquanto o CPI nos EUA teve um ganho de 112%. Corrigido pela inflação brasileira, R$ 1 daquela época equivale hoje a R$ 8,08, mostrando que o real tinha oito vezes mais poder de compra. Já o dólar, corrigido pela inflação americana, equivaleria a R$ 2,12 atualmente, contrastando com a cotação atual de R$ 5,44, uma desvalorização real de 42,78%.
Em 1999, o Brasil abandonou a política de paridade cambial e adotou o câmbio flutuante, que prevalece até hoje. Essa transição foi acelerada por reservas esgotadas e uma dívida externa crescente, agravada pelas crises globais asiática e russa.
O momento de maior desvalorização do real ocorreu em 2002, quando o dólar atingiu R$ 4 durante as eleições presidenciais, antes de fechar o dia a R$ 3,99.
Segundo Padovani, a política de paridade cambial foi uma solução temporária enquanto o país não desenvolvia outras ferramentas eficazes contra a inflação, como políticas fiscal e monetária mais robustas. “O grande problema do real que persiste é o controle das contas públicas”, afirma.
Com uma dívida pública crescente e riscos fiscais persistentes, o Brasil enfrenta desafios econômicos significativos. “O câmbio é um reflexo da incerteza fiscal. Para se proteger, os investidores buscam o dólar”, explica Alexandre de Ázara, economista-chefe do UBS no Brasil.
Enquanto o governo não adotar medidas concretas de ajuste fiscal, a tendência é que o dólar continue sua trajetória de alta frente ao real.