A gigante do e-commerce de moda rápida, Shein, está em uma corrida frenética para ocultar afirmações de seu presidente que sugerem que a empresa é, na essência, “americana”. Essa tentativa de desvinculação de suas origens chinesas pode complicar a aprovação de seu IPO no Ocidente.
No mês passado, durante a conferência do Instituto Milken em Los Angeles, o presidente executivo Donald Tang proclamou que os valores corporativos da Shein justificam sua identificação como uma empresa dos EUA. Essa declaração reacendeu discussões sobre as raízes da empresa e motivou os empregados a minimizar o impacto dessas revelações na China, conforme informações da Folha de S. Paulo.
A ambiguidade sobre a nacionalidade da Shein é crucial pois ainda falta um aval formal de Pequim para que a empresa liste suas ações fora da China. A solicitação para o IPO foi feita à Comissão Reguladora de Valores Mobiliários da China em novembro passado.
Segundo fontes próximas ao assunto, o distanciamento da Shein em relação à China surgiu durante consultas governamentais sobre seu pedido de listagem internacional.
A aprovação do IPO seria uma aceitação tácita do modelo de “deschinesamento” adotado pelo fundador Xu Yangtian para prosperar nos negócios. Isso gera um dilema de lealdade para alguns em Pequim.
Apesar das controvérsias, é provável que a Shein consiga permissão para negociar suas ações internacionalmente. A dependência da aprovação chinesa sugere que, aos olhos do governo de Pequim, a Shein ainda é vista como uma companhia chinesa.
Fundada em 2008 por Xu Yangtian, também conhecido como Sky Xu, na cidade oriental de Nanjing, o empresário mudou-se para Singapura no final de 2021, alterando também o domicílio fiscal da empresa. Não se sabe se Xu mantém sua cidadania chinesa.
A estratégia de “lavagem de Singapura” adotada pela Shein não aplacou as preocupações dos legisladores americanos. Marco Rubio, um crítico ferrenho da China, alertou o governo britânico sobre os riscos do IPO londrino da Shein, classificando-a como uma entidade chinesa.
Colunistas chineses relataram ao Financial Times que foram pressionados pela Shein para não publicar sobre o discurso de Tang, temendo mal-entendidos. Segundo eles, funcionários da empresa estavam incomodados com as declarações.
“Se divulgarmos isso, haverá mais debates públicos”, disse um colunista. “A Shein prefere evitar essa situação.”
Outro questionou por que Tang precisava afirmar que a Shein era uma empresa americana em vez de descrevê-la como multinacional com operações dentro e fora da China.
O Instituto Milken retirou um vídeo do painel com Tang de 7 de maio do seu site e do Vimeo. Registros arquivados indicam que o vídeo estava disponível até pelo menos o final de maio.
O Instituto Milken não comentou sobre os pedidos repetidos para esclarecimentos. Vários sites chineses removeram postagens que citavam Tang dizendo que a Shein era “uma empresa americana”, um procedimento comum na China quando há discordância com conteúdos publicados.
Quando questionado sobre a identidade da Shein, Tang respondeu que era complicado definir. A empresa nasceu na China e mantém muitos empregados e parte significativa da cadeia produtiva lá. Por outro lado, sua sede e registro corporativo em Singapura também a caracterizam como singapuriana.
O então Tang observou que seu maior mercado era os EUA e os valores americanos o tornaram bem-sucedido. “Trata-se de inovação, trata-se de liberdade para expressar individualidade. Trata-se de jogo limpo, competição justa, estado de direito, todas essas coisas que defendemos são exatamente o que os Estados Unidos são”, disse ele.
“Então, se você olhar dessa forma, somos uma empresa americana.”
A Shein não respondeu imediatamente a um pedido de comentário.