O presidente Lula (PT) recebeu a primeira dose da vacina contra dengue em 5 de fevereiro, sem divulgação pública e antes do início da campanha de imunização do SUS (Sistema Único de Saúde). O Palácio do Planalto informou que a vacina foi obtida na rede privada, mas se recusou a divulgar o modelo e o custo da vacina, além do nome do laboratório.
A campanha de vacinação contra a dengue pelo SUS começou quatro dias após Lula receber a primeira dose. A escassez de vacinas na rede pública gerou críticas ao governo e forçou o Ministério da Saúde a limitar a vacinação ao grupo de 10 a 14 anos.
Desde o início do seu terceiro mandato, Lula se vacinou publicamente contra a gripe e a Covid-19 para incentivar as campanhas de imunização. No entanto, a Secretaria de Comunicação Social da Presidência (Secom) não explicou por que a vacinação contra a dengue não foi divulgada. A Secom também não informou onde o presidente foi vacinado.
Lula recebeu a segunda dose da vacina contra a dengue em 6 de maio, novamente sem divulgação. As datas de aplicação da vacina foram reveladas pela Presidência da República após um pedido da Folha baseado na Lei de Acesso à Informação (LAI). A reportagem também solicitou informações sobre a imunização de Lula contra a Covid-19.
Inicialmente, a Presidência informou que Lula “recebeu todas as doses de vacinas compatíveis com a sua idade e já disponibilizadas pelo Ministério da Saúde, relativas à Covid-19 e à dengue, conforme orientação de sua equipe médica”. Após recurso, o governo divulgou as datas e locais de imunização, além do modelo de cada dose usada pelo presidente contra a Covid-19. Foram sete doses, sendo a última aplicada em 17 de junho com a vacina da Moderna, adaptada para a variante XBB.
Na segunda resposta, o Planalto também informou as datas em que Lula foi vacinado contra a dengue, mas não revelou o local da aplicação e o modelo da vacina. A Secom confirmou apenas que a vacina foi obtida da rede privada.
O Brasil enfrenta sua pior epidemia de dengue, com dados do Ministério da Saúde indicando 6 milhões de casos prováveis e 4 mil mortes pela doença em 2024, além de outras 2,8 mil mortes em investigação. Os registros até junho superam os do ano passado, que teve 1,6 milhão de casos e 1,1 mil mortes.
As vacinas compradas pelo Ministério da Saúde ainda estavam em análise de controle de qualidade quando Lula se vacinou. Os imunizantes foram liberados em 8 de fevereiro e começaram a ser aplicados no dia seguinte pelo SUS. Já o estoque das clínicas privadas ficou escasso entre fevereiro e março, e a Takeda, que produz a vacina Qdenga, vendeu toda a sua produção ao SUS.
O intervalo de três meses entre as doses indica que Lula recebeu a vacina Qdenga. A outra vacina contra a dengue disponível no Brasil, a Dengvaxia, requer três doses com intervalos de seis meses e não foi incorporada à rede pública. Ela é indicada apenas para pessoas de 6 a 45 anos que já foram infectadas pela dengue. Ambas as vacinas não têm indicações para pessoas de 78 anos, como Lula, sendo seu uso considerado “off-label” (fora das indicações do registro na Anvisa) e por prescrição médica.
No dia em que recebeu a primeira dose, Lula se reuniu com o diretor-geral da OMS, Tedros Adhanom, para discutir a fabricação da vacina contra a dengue. A agenda oficial do presidente, porém, não menciona a vacinação. No dia seguinte, a ministra Nísia Trindade fez um pronunciamento sobre o avanço da dengue, destacando a vacinação progressiva devido ao número limitado de doses.
Um dos planos do governo é produzir a vacina Qdenga na Fiocruz, mas a fundação afirmou que já “trabalha no limite” e depende da construção de uma nova fábrica para atender a demanda do SUS. Para a campanha de 2024, o Ministério da Saúde adquiriu 6,5 milhões de doses da Qdenga, suficientes para imunizar 3,25 milhões de pessoas, e comprou mais 9 milhões de doses para o próximo ano, todas fabricadas no exterior.
Durante o governo Jair Bolsonaro (PL), o Ministério da Saúde usou a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD) para negar acesso aos dados de imunização do então presidente. A Controladoria-Geral da União (CGU) decidiu liberar os dados sobre a Covid-19 no início do governo Lula, motivando uma investigação sobre suposta falsificação do certificado de imunização de Bolsonaro. A CGU considerou que a informação teria “interesse público geral e preponderante”, pois poderia ter influenciado a política pública de imunização durante a pandemia.