Uma investigação sigilosa conduzida pelo Ministério Público de Goiás (MPGO) e pela Corregedoria da PMGO revelou um grave caso de tortura e tentativa de homicídio durante um curso do Batalhão de Operações Especiais (Bope) em Goiás. Os fatos ocorreram em outubro de 2021, mas permaneceram em segredo por mais de dois anos.
Segundo informa o Metrópoles, de acordo com as apurações, o major João (nome fictício) foi submetido a torturas brutais, incluindo varadas, pedaços de madeira e açoites de corda, durante três dias consecutivos no 12º Curso de Operações Especiais do Bope, realizado na Base Aérea de Anápolis.
O episódio ocorreu durante um evento chamado de “Momento Pedagógico”, que, ao contrário do nome, não tinha qualquer caráter pedagógico. O major sofreu lesões tão graves que desmaiou e entrou em coma, permanecendo vários dias intubado em uma unidade de terapia intensiva (UTI).
Para encobrir o crime, os policiais envolvidos tentaram forjar uma causa de morte relacionada à Covid-19, alegando que o oficial tinha 40% do pulmão comprometido. A vítima foi inicialmente transferida para um hospital de confiança dos militares e monitorada por um coronel médico, integrante do curso do Bope.
O curso de operações especiais é destinado aos policiais que desejam servir no Bope, unidade responsável por atender ocorrências de alta complexidade, como situações com reféns. Os formados nesse curso são conhecidos como “caveiras”.
João, o major torturado quase até a morte, tinha o sonho de concluir o curso. Sua persistência e alta patente teriam motivado os instrutores a aumentar o grau de tortura contra ele, em comparação com os colegas de patentes mais baixas.
O major ficou gravemente ferido (foto em destaque). Ele chegou ao Hospital de Urgências de Anápolis (Huana) em coma profundo, com lesão neurológica grave e rabdomiólise, que é a ruptura do tecido muscular liberando proteínas no sangue, prejudicando os rins.
Apesar da gravidade, os policiais decidiram transferir o major para o Hospital Santa Mônica, em Aparecida de Goiânia, a uma hora de distância, sem informar sua família sobre o ocorrido.
Falsa Covid-19
Em um curso do Batalhão de Operações Especiais (Bope) em Goiás, o major passou mal e foi intubado em 16 de outubro. No entanto, os policiais militares responsáveis pelo curso não informaram a família do oficial, mesmo tendo o contato telefônico disponível. A esposa do paciente, que é promotora de Justiça, só soube da internação na manhã seguinte, um domingo, após um amigo pessoal do major alertá-la sobre a suposta internação por Covid-19.
Quando a esposa chegou ao hospital, foi informada de que só poderia obter informações sobre o marido por meio do médico coronel David. O médico militar apareceu no hospital vestindo uniforme completo e armado, alegando que o major estava com Covid-19 e com 40% do pulmão comprometido. No entanto, a tomografia que comprovaria esse comprometimento nunca foi apresentada, conforme a investigação. Além disso, uma tomografia realizada horas antes no Hospital de Urgências de Anápolis (Huana) não indicou sinais de Covid.
A documentação médica posterior também revelou que o major precisava de hemodiálise devido aos rins comprometidos, mas essa necessidade não estava sendo atendida na internação oferecida pelo médico coronel. A esposa percebeu que, apesar da gravidade, o marido não estava sendo assistido por nenhum médico intensivista e estava sozinho em um quarto do hospital. O paciente foi apresentado em uma maca com o corpo coberto por uma manta até o pescoço.
Determinada a transferir o major para um hospital de confiança, a esposa enfrentou obstáculos impostos pelo médico coronel, incluindo a condição da Covid e questões burocráticas. Após muita insistência, ela conseguiu levar o marido para o Hospital Anis Rassi, em Goiânia, onde foram constatadas lesões corporais gravíssimas e o exame de Covid-19 deu negativo.