Bruno Santos/Folhapress
Com a queda do nível do lago Guaíba nos últimos dias, a água nas calçadas de várias ruas do centro de Porto Alegre começou a secar, permitindo que comerciantes reabrissem seus estabelecimentos pela primeira vez em duas semanas após a cheia na capital.
Na Travessa dos Venezianos, uma área boêmia da Cidade Baixa, dezenas de voluntários se reuniram para beber vinho e realizar uma limpeza pesada com lavadoras de alta pressão na noite de sábado (18). Essa rua de casas coloridas, tombada como patrimônio cultural desde 1980, foi invadida pela água por cerca de dez dias, deixando marcas de 1,5 metro de enchente nas paredes dos bares.
Os comerciantes ainda contabilizam os prejuízos, mas estão otimistas com a reabertura, que deve demorar alguns dias devido à limpeza e às reformas necessárias. Eles relatam perdas totais nos estoques e danos em equipamentos como freezers e geladeiras, além de danos em móveis e paredes. “Vai dar para reabrir, com certeza, mas não funcionando a pleno vapor, mas do jeito possível”, diz Pepe Martini, proprietário do bar Milonga. Ele estima que o impacto financeiro de quase um mês fechado ainda não foi totalmente calculado.
Martini também comenta que a Travessa dos Venezianos já enfrentou e sobreviveu à grande enchente de 1941, quando o rio era mais próximo e a cidade não tinha um sistema de proteção com diques e comportas. Ele critica a falta de manutenção no sistema de contenção de cheias da cidade, afirmando que a casa de bombas da região funcionava mesmo com o nível do Guaíba acima de cinco metros, mantendo a rua seca, até que a estrutura foi desligada.
A CEEE (Companhia Estadual de Energia Elétrica), administrada pela Equatorial Energia, desligou a energia das casas de bombas para evitar choques elétricos, o que resultou no alagamento da Cidade Baixa. Parte do sistema só voltou a funcionar nos últimos dias.
No bar Guernica, a sócia Bruna Marcello já organiza um sistema de compras antecipadas, similar ao que empresas adotaram durante a pandemia. “Criamos um esquema de comandas em que as pessoas compram agora e podem consumir em julho”, explica. O bar sofreu danos significativos, incluindo a perda do chão de madeira, geladeiras, freezers e todo o estoque. Bruna relata que encontrou até animais mortos dentro do estabelecimento após a enchente.
Na rua dos Andradas, empresários checaram seus estabelecimentos pela primeira vez no domingo (19). Três comportas foram abertas para escoar a água para o Guaíba. Guilherme Souza, do Poeta Bar, estima prejuízos de R$ 20 mil a R$ 30 mil, sem contar os dias fechados. O bar ainda está sem luz e sem água, o que impede a limpeza profunda.
O espaço de coworking SZ Working ficou 15 dias debaixo d’água, com a água entrando até 60 centímetros no estabelecimento. Agostinho Zucchi, dono do local, lamenta as perdas de matéria-prima, suprimentos e mobiliário, e critica o desleixo da municipalidade.
A prefeitura de Porto Alegre nega que a causa dos alagamentos seja a falta de manutenção do sistema de drenagem. Em nota, afirma que o sistema de proteção contra cheias apresentou fragilidades diante da maior cheia da história registrada no Guaíba desde os anos 1900, afetando 80% dos municípios gaúchos. A gestão municipal afirma ter feito investimentos significativos no sistema de proteção, que evitaram danos ainda maiores.