Dos 39 ministros que compõem o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), 13 têm, em média, ultrapassado o prazo legal para o registro de compromissos em suas agendas oficiais. O decreto 10.889 de 2021 estipula um prazo de 7 dias corridos para o registro de cada compromisso.
Segundo análise do Poder360, foram analisados 33.527 registros de agendas de ministros entre 1º de janeiro de 2023 e 31 de março de 2024. A agenda do advogado-geral da União, Jorge Messias, não foi incluída na análise devido à ausência de dados no sistema e-agendas.
O ministro de Micro e Pequenas Empresas, Márcio França, é o que mais atrasa na divulgação de seus compromissos. Quando ocupava o cargo de ministro de Portos e Aeroportos, levou em média 60 dias para registrá-los. Posteriormente, no Ministério do Empreendedorismo, a média caiu para 19 dias. Sua assessoria justifica os atrasos pela fase de implementação do e-agendas durante a criação do ministério.
O Poder360 entrou em contato com todos os 13 ministérios que não estão em conformidade com a legislação. Até a publicação desta reportagem, apenas 7 ministérios e a CGU responderam.
Quatro ministros registraram mais da metade dos compromissos de suas agendas após o prazo de 7 dias:
- Waldez Góes (Desenvolvimento Regional) – 62% registrados fora do prazo;
- André Fufuca (Esportes) – 61%;
- Márcio França (Empreendedorismo e Portos) – 54%;
- Renan Filho (Transportes) – 50,2%.
O ministro dos Direitos Humanos, Silvio Almeida, é o segundo com a maior média de dias para registrar os compromissos. Em outubro de 2023, o deputado Marcel van Hattem (Novo-RS) afirmou que Silvio havia realizado apenas 5 reuniões com ministros de outros países. No entanto, o ministro realizou mais reuniões, que não estavam na agenda oficial.
Dois dias após a publicação do congressista, a equipe do ministro registrou 145 compromissos atrasados no sistema. Segundo o ministério, houve uma “falha operacional”. Em nota enviada ao Poder360, afirmou que a equipe do ministro revisou todos os registros no final de 2023 e que, desde então, passou a cumprir os prazos. Isso pode ser verificado nos dados.
De novembro de 2023 a março de 2024, a média de tempo para registrar o compromisso caiu para 3 dias, dentro do que estabelece a lei.
Por outro lado, o vice-presidente e ministro da Indústria e Comércio, Geraldo Alckmin, e o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, são os mais pontuais. Eles são os únicos que, em média, publicam seus compromissos antes de serem realizados.
Dos 1.213 compromissos de Haddad, apenas 3 entraram na agenda após o prazo de 7 dias. Com Alckmin, foram 7 de 822 compromissos.
Dos 33.527 compromissos ministeriais, 5.886 foram registrados fora do prazo estabelecido em decreto. Ou seja, pelo menos 18% de todos os compromissos foram registrados fora do que estabelece a lei. É importante ressaltar “pelo menos” porque é provável que mais compromissos de meses anteriores sejam registrados no futuro, o que deve aumentar esse indicador.
Apenas 11% dos compromissos incluídos nas agendas oficiais foram registrados nos dias anteriores à realização do evento.
O sistema e-agendas é a plataforma oficial onde são divulgadas as agendas de compromissos públicos dos agentes públicos do Poder Executivo federal. É vinculado à CGU (Controladoria Geral da União).
Marina Silva (Meio Ambiente) registrou apenas em março deste ano uma viagem ao Rio que havia sido realizada em fevereiro de 2023. Renan Filho (Transportes) e Márcio Macêdo (Secretaria Geral) também tiveram atrasos de mais de 300 dias para registrar compromissos.
A Controladoria Geral da União afirmou que tem monitorado os atrasos, realizado oficinas sobre como usar o sistema e cobrado melhorias dos ministérios. Em resposta ao Poder360, declarou que em março houve queda no percentual de compromissos marcados na agenda com atraso superior a 7 dias.
É difícil saber, no entanto, o quanto isso se deve a uma melhoria efetiva e o quanto os ministérios, cobrados para reduzir suas taxas de demora, estão deixando de publicar compromissos realizados já há muitos dias.
É possível, por exemplo, que compromissos de março e abril ainda sejam incluídos nas agendas, o que aumentaria a taxa de atraso dos meses mais recentes. Ou então que uma parte desses compromissos simplesmente nunca será registrada na plataforma.
O sistema e-agendas, implantado no fim de 2022, é um avanço em termos de transparência. Pela primeira vez, uma plataforma permitiu registrar de modo ordenado os compromissos de todos os ministérios e melhorou a abertura desses dados. Persistem, porém, uma série de problemas, como falta de padronização no preenchimento das agendas, registros incompletos e mudanças retroativas.
Há ainda os compromissos que os ministros simplesmente decidem não registrar. Exemplo: Rui Costa (Casa Civil) almoçou ao menos duas vezes com Arthur Lira em 2024.
Os eventos foram amplamente noticiados, assim como o fato de que o presidente da Câmara tem negociado diretamente com o ministro da Casa Civil. Apesar disso, não há nenhuma referência ao nome de Lira na agenda de Costa deste ano.
Na última semana, o ministro Ricardo Lewandowski (Justiça) jantou com Lula e ministros do STF em Brasília. Também não há registro até agora – mais de 7 dias após o ocorrido.
O Poder360 procurou todos os 13 ministérios que não cumprem a legislação. Leia aqui as íntegras das explicações de todos os 7 ministérios e a CGU – que foram os órgãos que responderam até a publicação desta reportagem. Aos demais, o espaço segue aberto para manifestação.
- André Fufuca (Esportes) – diz que o período analisado pela reportagem coincidiu com uma mudança de equipes no Ministério dos Esportes e que esse fato foi superado “à medida que as senhas e chaves de acesso do ministro e de sua equipe de gabinete foram registradas”;
- André de Paula (Pesca) – nos primeiros 3 meses de ministério, os funcionários estavam sendo nomeados, o que resultou em mais atrasos;
- Cida Gonçalves (Mulheres) – só agendas “pontuais” são registradas depois do prazo legal de 7 dias por culpa de “problemas internos” já solucionados;
- Márcio França (Empreendedorismo) – os atrasos se justificam por causa da fase de implementação do e-agendas durante a criação do ministério;
- Renan Filho (Transportes) – afirma que a agenda está sendo “devidamente publicizada” e que publicou duas portarias para regulamentar os registros. Diz que, depois disso, 100% dos compromissos foram divulgados no prazo;
- Silvio Almeida (Direitos Humanos) – declara que houve uma “falha operacional“, que revisou todos os registros no final de 2023 e que, depois disso, passou a cumprir os prazos;
- Waldez Góes (Integração) – diz que houve “intermitências e instabilidades” no sistema de agendas. Afirma ainda que os atrasos são efeito da diminuição de pessoal e estrutura do ministério.