Em setembro do ano passado, o tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL), foi liberado da prisão após firmar um acordo de delação premiada com a Polícia Federal (PF). O depoimento dele foi fundamental para a deflagração da operação Tempus Veritatis, realizada pela PF em fevereiro deste ano. Contudo, recentes desenvolvimentos nas investigações destacaram novos detalhes que exigem esclarecimentos por parte do delator, se ele pretende manter o acordo que possibilitou sua liberdade. Nesta segunda-feira, 11, Mauro Cid prestará um novo depoimento, e a PF poderá questioná-lo sobre três pontos principais.
O depoimento atual de Mauro Cid vem após a PF ouvir os ex-comandantes do Exército, general Freire Gomes, e da Aeronáutica, tenente-brigadeiro Baptista Júnior. Um dos pontos que a PF espera que Mauro Cid esclareça refere-se ao depoimento do general.
No dia 1º de março, Freire Gomes foi interrogado por quase oito horas na sede da PF em Brasília. De acordo com informações da coluna da jornalista Míriam Leitão no jornal O Globo, Freire Gomes afirmou à PF que Bolsonaro não apenas tinha conhecimento da “minuta do golpe”, mas também lhe apresentou pessoalmente o documento, afirmando que o plano descrito na minuta seria implementado. Bolsonaro nega qualquer envolvimento na elaboração do documento.
A narrativa apresentada por Freire Gomes entra em contradição com a delação de Cid, pelo menos com os trechos já divulgados. Segundo o ex-ajudante de ordens, Bolsonaro teria recebido a minuta do então assessor para assuntos internacionais, Filipe G. Martins, mas não expressou sua opinião sobre o documento, muito menos indicou a intenção de seguir adiante com o plano descrito na minuta. A PF está investigando se essa é a mesma versão do texto encontrado na residência do ex-ministro da Justiça, Anderson Torres. Este é um ponto que precisa ser esclarecido por Mauro Cid.
A “minuta do golpe” era o rascunho de um decreto a ser editado pela Presidência da República instaurando o “estado de defesa” especificamente na sede do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), sob o pretexto de investigar supostos casos de abuso de poder e reestabelecer a “lisura e correição da eleição de 2022”.
Segundo investigadores da PF ouvidos sob anonimato pela CNN Brasil, Mauro Cid pode inclusive ser preso preventivamente caso não colabore com as investigações durante o depoimento desta segunda-feira. O advogado dele, Cezar Bittencourt, afirmou que acredita num depoimento “tranquilo”, e que seu cliente responderá a tudo que for perguntado. “O delegado que conduz o caso é quem sabe as perguntas que vai fazer. De minha parte, o que posso garantir é que tudo o que o Cid souber, tudo o que ele tiver conhecimento, o que conseguir explicar, ele vai fazer. Ele vai falar”, disse Bittencourt ao portal G1.
O segundo ponto que Mauro Cid poderá ter de explicar aos policiais é a reunião ministerial de julho de 2022, na qual Bolsonaro antevê a possibilidade de ser derrotado nas eleições daquele ano e pede a seus ministros que acionem o “plano B”. No encontro no Palácio do Planalto, Bolsonaro diz ao grupo que não pode “deixar chegar as eleições e acontecer o que está pintando”. “Vocês estão vendo agora que… eu acho que chegaram à conclusão. A gente vai ter que fazer alguma coisa antes”, diz ele, insinuando a possibilidade de fraude nas eleições daquele ano.
O vídeo da reunião foi encontrado pela Polícia Federal a partir do computador de Mauro Cid, em um serviço de armazenamento na nuvem. No entanto, a defesa do ex-ajudante de ordens de Bolsonaro disse que ele nem sequer sabia da existência do encontro, e não estava presente. “Ele não teve comando da transmissão, não estava presente na reunião, essa informação não compete ao Cid. Por que ele não estava? Não perguntei, não interessa. Era uma reunião do presidente com quem ele quis convidar”, disse Cezar Bittencourt no dia 9 de fevereiro, em entrevista ao canal de TV à cabo GloboNews. Segundo a CNN Brasil, esse é um dos pontos de interesse dos investigadores no novo depoimento de Cid.
Enfim, Cid poderá ser convocado para esclarecer uma alegada “incompatibilidade” com a interpretação da Polícia Federal sobre seus depoimentos. Conforme a publicação da revista Veja, Cid tem afirmado a pessoas próximas que suas declarações nunca implicaram Bolsonaro em uma suposta tentativa de golpe de Estado. Segundo a revista, o informante persiste na argumentação de que seus depoimentos se limitaram a especulações sobre possíveis ações a serem tomadas caso fosse comprovada a fraude nas eleições de 2022. Além disso, ressalta que, como a alegada “fraude” nunca foi confirmada, nenhuma medida foi adotada.
Com informações de UOL