Crédito: Diogo Zacarias/Ministério da Fazenda
No último dia do ano de 2023, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou uma lei que visa regulamentar as apostas esportivas no Brasil, popularmente conhecidas como “bets”, e outras atividades online. A medida, parte dos esforços do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, para aumentar a arrecadação, traz importantes alterações no cenário das apostas no país.
A nova legislação abrange uma ampla gama de modalidades, regulamentando apostas de quota fixa, apostas virtuais e físicas, eventos esportivos reais, jogos online, incluindo títulos de cassino como roleta, pôquer e caça-níqueis, e eventos virtuais de jogos online.
As empresas interessadas em oferecer serviços dessas naturezas devem agora pagar uma outorga que pode chegar a R$ 30 milhões, e estão sujeitas a uma alíquota de 12% sobre a arrecadação. Os recursos arrecadados serão destinados para áreas como esporte, educação e segurança pública.
Publicidade responsável
O Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar) vai atuar na regulamentação do setor. A organização divulgou um documento que estabelece as regras de autorregulamentação para a publicidade de apostas no Brasil.
O documento destaca a importância da identificação publicitária, veracidade e informação, proteção a crianças e adolescentes, e responsabilidade social e jogo responsável.
Em um folheto virtual, o Conar apresenta regras para a publicidade de apostas, visando o cumprimento da legislação e regulamentação aplicáveis. Entre os princípios relacionados à veracidade e informação, há a proibição de divulgação de ganhos certos, de informações enganosas sobre probabilidade de ganhos e a indução ao enriquecimento.
Além disso, a proteção a crianças e adolescentes é priorizada, com a exigência de símbolo “18+” e restrições etárias em canais e redes sociais.
O princípio da identificação publicitária destaca a necessidade de clareza na natureza comercial, especialmente em anúncios por influenciadores, com a recomendação de expressões como “publicidade” ou “parceria paga”. Quanto à responsabilidade social e jogo responsável, as publicidades devem se abster de associações entre apostas e sucesso, incentivar o exagero na prática de apostas, e promover o jogo como solução para problemas financeiros.
Adicionalmente, são exigidas mensagens de alerta padronizadas, como “jogue com responsabilidade” ou “aposta pode causar dependência”, buscando conscientizar os consumidores sobre os riscos associados às apostas.
As diretrizes enfatizam a importância de transparência, ética e responsabilidade nas campanhas, com foco na prevenção de informações enganosas e na proteção de crianças e adolescentes e outros grupos em situação de vulnerabilidade.
As regras, objeto de discussões desde agosto de 2023, entrarão em vigor a partir do dia 29 deste mês.
Restrições de pagamento
O governo brasileiro está objetivando mitigar riscos associados às apostas esportivas por meio de restrições nos métodos de pagamento. Essa iniciativa visa endereçar preocupações relacionadas ao superendividamento, lavagem de dinheiro e o potencial vício entre os jogadores. A informação é da Folha de S. Paulo.
A restrição proposta prevê apenas o uso do Pix e cartões de débito como métodos de pagamento para apostas esportivas, excluindo o cartão de crédito e boletos bancários. Essa seleção busca garantir que os jogadores utilizem apenas fundos disponíveis em suas contas bancárias, reduzindo o risco de superendividamento.
A eliminação do boleto bancário também contribui para a prevenção da lavagem de dinheiro, já que esse método é frequentemente associado a práticas ilícitas.
A viabilidade jurídica da medida, no entanto, ainda deve ser consultada junto a PGFN (Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional). Depois, cabe ao ministro Fernando Haddad (Fazenda) dar o aval.
Testes e transparência
Em outubro de 2023, o governo federal iniciou uma consulta para empresas interessadas no mercado de apostas brasileiro. Na ocasião, 134 empresas expressaram interesse em participar do setor, incluindo a Caixa.
Na quarta-feira (10), o Ministério da Fazenda realizou uma reunião com essas empresas para apresentar um processo de teste de plataformas para garantir que as companhias operem em um quadro regulatório transparente, com transações eficientes e protegendo os consumidores.
Durante a reunião, foram delineadas diretrizes, visando avaliar a infraestrutura tecnológica necessária para a operação.
Os testes serão conduzidos em colaboração com o Serpro (Serviço Federal de Processamento de Dados). Eles incluirão avaliações de conexão e dados representativos ao longo de um período consistente de apostas.
Testes suplementares terão foco no volume e na capacidade de suportar altas cargas na infraestrutura, visando garantir a robustez da comunicação entre o sistema de gestão do Ministério da Fazenda e os sistemas de apostas.
Essa iniciativa, contudo, não implica em autorização prévia. Durante o período de testes, que terá início em 19 de fevereiro e requer a assinatura de um Termo de Confidencialidade até 19 de janeiro, as empresas se preparam para obter a autorização necessária, facilitando assim sua entrada no mercado de apostas esportivas brasileiro. Os dados coletados durante esse processo serão excluídos até o fim do período, conforme previsto, em 5 de abril.
O Serpro também desenvolve um sistema para monitorar em tempo real todas as apostas online feitas por empresas registradas no Brasil. O programa visa detectar fraudes fiscais e alertar apostadores sobre possíveis vícios.
As empresas serão legalmente obrigadas a fornecer dados detalhados dos jogadores. O sistema integrado, destacado pelo assessor especial da Fazenda, Francisco Manssur, permitirá fiscalizar tributos e identificar possíveis fraudes ou manipulação de resultados. Em entrevista ao Globo, ele comentou:
“É um sistema integrado, que vai mostrar para a gente em tempo real, talvez com alguns minutos de delay, a movimentação das apostas, para que a gente possa não só fiscalizar o recolhimento dos tributos, mas também uma possível fraude, externalidade negativa, ou até mesmo manipulação de resultados.”
A Fazenda pretende, ainda, cruzar dados para analisar o tempo gasto pelos apostadores online, visando identificar casos de patologia e endividamento. A respeito do assunto, ele disse:
“Queremos casar os dados de todas as empresas, por usuário. Se o José da Silva, por exemplo, está passando mais de 10 horas apostando, podemos assim captar um caso de eventual patologia e endividamento.”
O Ministério do Esporte também usará o sistema para monitorar apostas esportivas atípicas, que podem indicar manipulação de resultados.
O governo federal planeja emitir portarias para regulamentar aspectos específicos do mercado de apostas no Brasil. Até fevereiro, o Ministério da Fazenda deve abrir o período de solicitação de autorização para empresas, conforme a legislação vigente.
A janela de inscrições ocorrerá duas vezes ao ano, com prazo limitado, tornando ilegais as empresas que não se inscreverem a tempo ou tiverem seus pedidos negados. A autorização exigirá que as empresas contratem um laboratório credenciado pelo governo para avaliação e emissão de certificado de conformidade com as leis, assemelhando-se a uma auditoria externa.