Foto: Jordi BORRAS / POOL / AFP
Depois de uma decisão de segunda instância, os estrangeiros condenados a penas entre 1 ano e 5 anos na Espanha podem pedir para trocar o cumprimento por uma expulsão do território para o seu país de origem.
Daniel Alves é condenado a 4 anos e 6 meses na Espanha por agressão sexual
Por ser brasileiro na Espanha, Daniel Alves poderá se aproveitar de uma regra para estrangeiros que vivem lá e que são condenados por crimes: eles podem trocar uma parte da pena por uma expulsão do país, afirma o advogado espanhol Agustín Martínez Becerra.
Becerra foi o advogado que defendeu cinco homens condenados por abusar de uma mulher em 2016, em um caso que ficou conhecido como La Manada. Inicialmente, a Justiça os condenou a 9 anos de prisão por abuso sexual e não por estupro, porque o Código Penal espanhol caracterizava estupros apenas em atos com intimidação ou violência.
Porém, no ano seguinte, o tribunal anulou as sentenças de instâncias inferiores e condenou todos a 15 anos de prisão por estupro.
Esse caso motivou o país a mudar a lei sobre abusos. Agora, todos os atos sexuais não consensuais passaram a ser considerados violência. Mas, ao mesmo tempo, as penas para alguns crimes sexuais ficaram mais brandas.
O advogado diz que Daniel Alves só poderá pedir a expulsão depois de uma decisão de segunda instância da Justiça.Alves foi sentenciado a 4 anos e 6 meses de prisão por estupro. A sentença foi anunciada pelo tribunal de Barcelona e diz que foi comprovado que o brasileiro agrediu e abusou da mulher no banheiro da boate Sutton, em 2022.
Essa decisão ainda é de primeira instância, e Becerra chama de “provisória”.
“Na Espanha, uma pessoa estrangeira condenada a menos de 5 anos, pode pedir para ser expulsa imediatamente. Ele (Daniel Alves) tem duas nacionalidades, e pode alegar que é brasileiro“, afirmou ao g1.
De acordo com o site do escritório Ruiz León, a regra geral do Código Penal é que as penas de prisão de mais de um ano e menos de cinco anos podem ser substituídas por expulsão do território.
Caso o condenado já tenha cumprido uma parte da pena – como é o caso de Daniel Alves —, esse tempo não poderá passar de dois terços da sentença para que possa haver a troca do resto da pena pela expulsão.
Daniel Alves também pode sair mais cedo
O ex-jogador da seleção brasileira Daniel Alves pode obter o direito de sair da prisão em abril de 2025, quando tiver ultrapassado metade da pena a que foi condenado.
Pela lei espanhola, condenados a menos de cinco anos podem pedir a progressão para o regime de “semiliberdade”, no qual saem da prisão pela manhã e retornam à noite. A ideia é permitir a reincorporação dos detentos à sociedade.
Durante o dia, podem trabalhar ou ficar com a família, por exemplo.
O tempo de pena começa a contar a partir da prisão do jogador, em janeiro de 2023.
A condenação de Daniel Alves está longe dos 9 anos de prisão solicitados pela Promotoria espanhola e ainda mais distante dos 12 anos pedidos pela vítima.
- Condenação de 4 anos e 6 meses de prisão.
- Indenização de 150 mil euros (cerca de R$ 804 mil) à vítima por danos moral e físico, além de arcar com as custas do processo.
- Pena de liberdade supervisionadapor cinco anos, e nove anos de afastamento da vítima após o tempo na prisão.
- Multa de 9 mil euros (cerca de R$ 48 mil), em 150 euros diários durante dois meses, pelo delito de lesão corporal leve.
- A defesa do ex-jogador pode recorrer da decisão em duas instâncias: no Tribunal Superior de Justiça da Catalunha (TSJC) e no Supremo Tribunal da Espanha. Enquanto recorrer, Daniel segue preso, segundo o tribunal. A advogada de Alves já avisou que vai recorrer.
- Para o tribunal, ficou comprovado que a vítima não consentiu e que existem elementos, além do testemunho da denunciante, para considerar provada a violação.
- Os três elementos que comprovaram a violação são, segundo o tribunal: a existência de lesões nos joelhos da vítima; seu comportamento ao relatar o ocorrido; e a existência de sequelas.
Segundo a sentença, o tribunal aplicou ao jogador de futebol uma circunstância atenuante de reparação do dano ao considerar que “antes do julgamento, a defesa depositou na conta do tribunal a quantia de 150 mil euros (R$ 801,2 mil) para ser entregue à vítima independentemente do resultado do julgamento, e esse fato expressa, segundo o tribunal, ‘uma vontade reparadora'”.
Com isso, a pena do ex-jogador foi reduzida por conta da aplicação dessa atenuante. O pagamento foi feito pela família de Neymar, segundo o jornal O Globo. Ao g1, a assessoria de Neymar optou por não comentar sobre o assunto.
Veja abaixo os principais pontos da sentença de Daniel Alves:
A condenação foi dada pela juíza Isabel Delgado na 21ª Seção de Audiência de Barcelona.A advogada do ex-jogador disse acreditar na inocência do acusado e que vai recorrer da decisão.
A resolução explica que “para a existência de agressão sexual não é necessário que ocorram lesões físicas, nem que haja uma oposição heroica por parte da vítima em manter relações sexuais”.
Além disso, especifica que “no presente caso, encontramo-nos ainda com lesões na vítima, que tornam mais do que evidente a existência de violência para forçar sua vontade, com a subsequente penetração sexual que não é negada pelo acusado”.
Entre outros pontos, a sentença afirma que:
Julgamento de Daniel Alves — Foto: Jordi BORRAS / POOL / AFP
- a denúncia da vítima não tinha interesse econômico.
- o depoimento da vítima foi “coerente e especialmente persistente”.
- não há dúvida de que a penetração vaginal aconteceu com violência.
- por tudo o que foi relatado pela vítima e pelos laudos fornecidos, concluiu-se que “a denúncia, a priori, traria mais problemas ao denunciante do que vantagens”.
- a vítima teve medo de denunciar por causa da repercussão do caso e de o risco de sua identidade ser revelada.
A sentença, de 61 páginas, diz que o tribunal considera provado que “o acusado agarrou bruscamente a denunciante, a derrubou ao chão e, impedindo-a de se mover, penetrou-a vaginalmente, apesar de a denunciante dizer que não, que queria ir embora”. Com isso, entende que “com isso se configura a ausência de consentimento, com o uso de violência, e com acesso carnal”.
O julgamento de Alves durou três dias e terminou no dia 7 de fevereiro, quando o jogador prestou depoimento. Na sessão, ele chorou e negou a agressão sexual. Disse ainda que a relação com a denunciante foi consensual (leia detalhes mais abaixo).
À época, a defesa de Daniel Alves pedia a liberdade condicional e a absolvição dele. Já o Ministério Público local pedia nove anos de prisão, enquanto a defesa da denunciante queria uma sentença de 12 anos de encarceramento.
No total, 28 testemunhas, indicadas pela defesa e pela acusação, foram convocadas pela Justiça espanhola para os depoimentos. A mãe do ex-jogador também participou do julgamento. Lucia Alves, que foi a primeira a chegar ao Tribunal, foi convocada como testemunha.
As versões de Daniel Alves
Antes do começo do julgamento, Daniel Alves apresentou quatro versões sobre o que aconteceu na boate Sutton. Durante o julgamento, ele contou algo diferente: pela primeira vez, afirmou que estava muito embriagado.
Veja abaixo os diferentes relatos que ele já deu sobre o caso.
- No início de janeiro de 2023, em um vídeo enviado ao canal espanhol Antena 3 depois que o caso veio a público, o jogador negou ter ocorrido relação sexual e disse que sequer conhecia a denunciante. “Nunca vi essa senhora na vida”, afirmou.
- Dias depois, em um primeiro depoimento à polícia, Daniel Alves declarou ter entrado no banheiro junto com a espanhola, mas negou ter havido qualquer relação entre os dois.
- Em 20 de janeiro, convocado a um segundo depoimento em uma delegacia de Barcelona, quando foi preso em flagrante, o jogador Alves alegou que a jovem praticou sexo oral nele, porém de forma consensual. O atleta mudou a versão ao ser confrontado pela polícia com imagens da boate.
- Em 17 de abril de 2023, já preso, Daniel Alves declarou à juíza responsável pelo caso que manteve relações sexuais consensuais com penetração (àquela altura, exames periciais haviam encontrado sêmen do jogador na espanhola). O brasileiro, que era casado com modelo espanhola Joanna Sanz quando ocorreu o episódio na boate, argumentou ter mentido, em um primeiro momento, para ocultar uma relação extraconjugal.
- No dia 7 de janeiro de 2024, durante seu julgamento, ele foi interrogado pela própria advogada. Nesse depoimento, ele chorou e afirmou que bebeu excessivamente naquela noite.