O Ibovespa iniciou o ano de 2024 com um desempenho desfavorável, registrando uma queda de 4,79% no acumulado do mês, marcando o pior resultado desde janeiro de 2016.
Por trás dessa tendência de baixa, destaca-se um movimento de realização de lucros por parte dos investidores estrangeiros, que estão retirando os ganhos obtidos com o aumento de 18% do IBOV no final de 2023. Além disso, outras variáveis também influenciaram esse cenário, como o aumento nos rendimentos dos títulos do Tesouro dos EUA. O incremento nas taxas desses papéis atrai investidores globalmente para a renda fixa americana, prejudicando as bolsas internacionais.
No âmbito nacional, o acréscimo nas incertezas fiscais constituiu um terceiro elemento que impactou negativamente o índice. No mês de janeiro, o governo anunciou uma nova política industrial, surpreendendo o mercado ao disponibilizar R$ 300 bilhões em créditos e subsídios até 2026. Essa medida foi recebida de forma desfavorável pelos investidores. No mesmo período, foi divulgado um déficit primário de R$ 230 bilhões em 2023, o segundo maior da história.
Enquanto isso, no nível microeconômico, uma das principais empresas sofreu perdas de 10% no primeiro mês do ano. A Vale (VALE3) foi impactada por questões relacionadas à suposta interferência política, incluindo os esforços do governo de Lula para nomear o ex-ministro Guido Mantega na diretoria da companhia. Além disso, temores em relação à crise imobiliária na China, principal mercado consumidor de minério, também contribuíram para os desafios enfrentados pela empresa.
“Toda essa pauta fiscal do Governo mexeu, sim, com a Bolsa. Não podemos descartar também o que ocorreu com a Vale, que tem um peso bem grande no índice”, destaca Pedro Canto, analista CNPI da CM Capital. A volatilidade do petróleo também gerou incertezas no mercado brasileiro, na esteira de conflitos armados no Oriente Médio e leste europeu, como as guerras do Iêmen, Israel e Hamas e Rússia e Ucrânia.
“Os fatos que mais mexeram com a Bolsa em janeiro foram, principalmente, os temores atrelados às commodities, especialmente o petróleo. A guerra no Iêmen e o fechamento do canal de Suez deixaram o transporte muito mais custoso para os preços do óleo cru”, diz Pedro Marcatto, head de renda variável da B.Side. “Além disso, dados fracos da economia chinesa, que viveu um momento deflacionário ao longo de todo 2023, pressionaram as ações de Vale, ativo de maior peso no Ibovespa.”
Poucas mudanças no curto prazo
Para fevereiro, a expectativa é de que os assuntos fiscais no Brasil, situação econômica da China e o desenrolar das guerras no Oriente Médio e leste europeu continuem no radar dos investidores. A temporada de balanços do 4º trimestre de 2023 também deve ser acompanhada de perto pelo mercado. Entretanto, a aguardada recuperação do Ibov pode não vir tão breve.
“Não vejo grandes mudanças para fevereiro”, afirma Marcelo Boragini, sócio da Davos Investimentos. “Lembrando que a nossa bolsa ainda é muito dependente do fluxo estrangeiro. Enquanto os gringos não voltarem, a tendência é de que o Ibov permaneça lateralizado.”
Na visão de Boragini, para os investidores estrangeiros voltarem à B3, será necessário o avanço dos cortes na taxa básica de juros do país, a Selic, além do início do aperto monetário nos EUA – cenário que deve se consolidar nos próximos meses.
Essa também é a expectativa de Pedro Canto, analista CNPI da CM Capital. O especialista vê um possível endereçamento das incertezas fiscais nos próximos meses. “Acredito que vai ter bastante ruído, volatilidade de curto prazo, mas a ala econômica do Governo parece alinhada em busca de encontrar uma solução adequada para a questão fiscal, pelo menos endereçar da melhor forma possível”, diz.
Marcatto, da B.Side, vê este momento de Ibov lateralizado como oportunidade. “O Ibovespa ainda negocia a um múltiplo preço/lucro muito descontado, nos níveis em que negociava na Crise do Subprime”, diz. “Observamos um desconto elevado no índice, nos dando uma boa expectativa de upside para o futuro. Outro ponto é que queda de juros, como esperado pelo mercado, trará mais atratividade ao risco e tende a aumentar o fluxo de capital entrando na Bolsa.”
A Ágora Investimentos vê um momento oportuno para investimentos. “A combinação de um cenário de queda de juros e valuation descontado em bolsa torna “apostas contra” um risco e a maioria dos setores ainda parece ter preços atraentes, negociando com múltiplos descontados em relação à sua média histórica”, diz a casa, em relatório.
EInvestidor/Estadão