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A Justiça condenou o delegado da Polícia Civil do Rio de Janeiro Maurício Demétrio Afonso Alves a quase dez anos de prisão por crime de obstrução de justiça, em regime fechado, sem possibilidade de recorrer em liberdade.
Com um padrão de vida desproporcional à renda de um policial, Demétrio chegou a debochar do caso em áudio captado pela investigação. O então suspeito disse que estava levando uma “vida de mensaleiro”, em referência ao escândalo de corrupção na política brasileira revelado em 2005.
“Foram colhidas provas de que o Delegado de Polícia Maurício Demétrio Afonso Alves externa um padrão de riqueza altíssimo, inclusive muito superior ao que a remuneração (exclusiva) da sua atividade lícita lhe permitiria. São inúmeros os registros de gastos de altíssimos com o aluguel constante em mansões em Angra, utilização rotineira de lanchas e jet-ski, viagens internacionais constantes (em classe executiva), proprietário de diversos carros blindados de altíssimo padrão, assim como residência fixada em imóvel luxo. Além disso, o acusado possuía altíssimo valor (centenas de milhares de reais) em espécie em sua casa, objeto de apreensão. Vida abastada que o próprio acusado resume como sendo uma ‘vida de mensaleiro’”, justifica o juiz Bruno Monteiro Rulière, da 1ª Vara Especializada em Organização Criminosa do Rio, em trecho da decisão, publicada na última quinta-feira (4), a qual a CNN teve acesso.
O juiz chega a citar áudios obtidos pela investigação, em que Demétrio se orgulhava de levar o que chama de “vida de mensaleiro”.
“Cara, eu recebi sim! Só que eu tava andando de jet-ski na minha vida de ‘mensaleiro’ e não tive tempo de ler”, consta em trecho de transcrição de escuta do acusado.
Condenação
Segundo a decisão, o cargo do réu agrava a situação dele. “O réu cuida-se de um Delegado de Polícia, situação que, por si só, demonstra culpabilidade mais elevada. Cuida-se justamente de profissional incumbido de promover as investigações de crimes, sendo um paradoxo atuar no sentido de embaraça-las. Pessoa em quem a sociedade deposita grande confiança e da qual muito espera em prol da Segurança Pública”, justifica o magistrado.
O réu ainda terá que pagar uma multa de mais de R$ 367 mil reais. Entre as justificativas do juiz para o valor elevado da penalidade está a condição econômica do acusado, não compatível com a renda de delegado de polícia, que hoje está em pouco mais de R$ 18 mil.
A Justiça determinou, também, que o montante de dinheiro apreendido na casa do delegado no dia da prisão (R$ 240 mil) deve ser depositado em uma conta do estado. Na sentença, o juiz ainda determina a imediata perda do cargo de delegado e de qualquer outra função pública que o réu poderia ocupar.
A Secretaria de Estado de Polícia Civil (Sepol) afirmou, em nota, que será aguardado o trânsito em julgado do decreto condenatório.
“A instituição reforça que há Processos Administrativos Disciplinares (PADs) em andamento na Corregedoria-Geral de Polícia Civil (CGPOL) e que todas as medidas cabíveis estão sendo tomadas”, completa o comunicado.
A CNN tenta contato com a defesa de Demétrio.
Relembre o caso
Demétrio foi preso em 2021 por suspeita de comandar um esquema que exigia propina de lojistas para permitir a venda de roupas falsificadas. Na época, ele era titular da Delegacia de Repressão aos Crimes Contra a Propriedade Imaterial (DRCPIM), que deveria combater a pirataria.
Segundo o Ministério Público do Rio, Demétrio também armou um esquema para tentar impedir as investigações da Corregedoria da Polícia Civil. O delegado foi denunciado, ainda, por abuso de autoridade, denunciação caluniosa e fraude processual.
O Ministério Público do Rio também investiga Demétrio, junto com o também delegado Allan Turnowski, que chegou a ser secretário de Polícia Civil, por ligação com o jogo do bicho, em especial com o grupo que foi coordenado por Fernando Iggnácio, morto em novembro de 2020.
Os dois também são investigados por planejarem prejudicar adversários políticos usando informações privilegiadas. “A quebra de dados telemáticos ainda foi possível identificar a prática de atos tendentes à criminalização de autoridades públicas, incluindo um suposto outro flagrante preparado, por tráfico de drogas, de um delegado que teria atuado na Corregedoria da Polícia Civil e, por corrupção, do então candidato a prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (às vésperas das eleições)”, lembrou o juiz na decisão.