A Polícia Civil instaurou inquérito em Taquaritinga (SP) para apurar a morte do policial militar Edno Ferreira Ventura Júnior, de 35 anos. Ele morreu na quarta-feira (13) após receber uma medicação intravenosa de uso controlado, sem prescrição médica, aplicada por uma técnica de enfermagem na casa dela.
O caso é investigado como homicídio. A polícia chegou a prender a técnica de enfermagem, mas ela foi solta após passar por audiência de custódia. Ela também é suspeita de furtar remédios do hospital onde trabalha na cidade.
Nesta reportagem, o g1 mostra o que se sabe sobre o caso e o que a polícia tem a esclarecer. Você vai saber como aconteceu a morte, quais as suspeitas contra a profissional de saúde e quais providências foram adotadas sobre a conduta dela.
1.Quem é o policial militar?
Edno Ferreira Ventura Júnior, de 35 anos, atuava como policial militar em Taquaritinga (SP). Em 2022, ele sofreu um acidente de carro em uma rodovia próximo ao município, quando tentou desviar de um animal na pista. Júnior sofreu fraturas nas costelas e, ficou sequelas. Desde então, tinha dores crônicas.
2.O que aconteceu com o policial?
Segundo o boletim de ocorrência, com base em relatos de familiares, por causa das dores crônicas, Edno Júnior passou a usar morfina. Para fazer a aplicação, ele contratou a técnica de enfermagem Tatiani Cristina Gonçalves, de 41 anos, que também fornecia a medicação mediante pagamento. As aplicações eram frequentes, de acordo com a família.
O delegado Renato Cândido Soares, responsável pela investigação, informou que imagens das câmeras de segurança da casa de Tatiani foram apreendidas. O vídeo não foi divulgado, mas, segundo a polícia, Edno Júnior começou a passar mal segundos após a injeção ser aplicada sem prescrição médica.
“O policial está sentado próximo a uma mesa, com um torniquete no braço. A indiciada se aproxima dele com a seringa, faz a aplicação intravenosa, e logo em seguida ele começa a passar mal, já cai ao chão, onde nós acreditamos que ele tenha vindo a óbito. Em segundos, ele já começa a abaixar a cabeça, passar mal e já cai”, descreve o delegado.
Edno Júnior foi levado à Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Taquaritinga, mas não resistiu.
O corpo foi enterrado na manhã desta sexta-feira (15) em Santana da Ponte Pensa (SP).
3.O que a técnica de enfermagem alega?
Tatiani foi levada à delegacia logo após a morte de Edno Júnior. Segundo consta no boletim de ocorrência, ela afirmou que aquela era a primeira vez que aplicava medicação no policial militar e que ele chegou com a injeção já pronta. A técnica de enfermagem disse que desconhecia o medicamento que constava na seringa.
No entanto, além das imagens das câmeras de segurança, a polícia apreendeu ampolas de cloridrato de tramadol, uma vazia e outra cheia, e frascos de soro fisiológico na casa da profissional.
Segundo o delegado, o material encontrado na casa de Tatiani foi desviado da Santa Casa de Taquaritinga, local onde ela trabalha. O número do lote possibilitou à polícia ter certeza sobre a origem do medicamento.
O cloridrato de tramadol é um potente analgésico da classe dos opioides. Ele é usado para tratar dores de intensidade moderada a grave e age no sistema nervoso central, provocando alívio, por exemplo, em dores nas costas.
É um medicamento de uso controlado, só podendo ser vendido em farmácias perante apresentação de receita médica, que fica retida no estabelecimento.
4.Quais suspeitas pesam sobre a profissional?
Inicialmente, Tatiani foi presa em flagrante por suspeita de homicídio com dolo eventual, assumindo o risco de matar. A suspeita é que ela tenha aplicado o medicamento de uso controlado desviado da Santa Casa no policial militar.
“Por ser profissional da saúde, técnica em enfermagem, tinha conhecimento dos riscos em aplicar o medicamento por via venosa sem prescrição médica e em sua casa, portanto distante de um centro de saúde capaz de reverter qualquer evento causado pela administração de medicamento, sendo ainda mais grave os indícios de que esse medicamento, de uso controlado, tenha vindo ao seu poder por desvio cometido por sua pessoa no seu local de trabalho”, consta no boletim de ocorrência.
De acordo com o delegado, celulares e computadores de Tatiani foram apreendidos e passarão por perícia. O telefone do policial militar também foi recolhido pela polícia.
Nos próximos dias, Soares pretende ouvir testemunhas. Ele aguarda laudos do Instituto Médico Legal (IML) de Araraquara (SP) para esclarecer as causas da morte de Edno Júnior.
“A investigação ainda vai se desenrolar, pessoas serão ouvidas, tem a questão das apreensões de celulares e computadores. Tudo isso vai para perícia e retornar, para a gente entender como foi a dinâmica, todos os detalhes, inclusive se há o envolvimento de outras pessoas”, complementou.
5.Técnica poderia fazer aplicação da injeção?
Segundo o Conselho Regional de Enfermagem de São Paulo (Coren), órgão que fiscaliza e disciplina o exercício profissional da enfermagem, Tatiani tem inscrição ativa.
O órgão informou que não existe restrição quanto ao atendimento realizado pelo profissional de enfermagem na sua própria casa, desde que sejam observados os aspectos éticos e de segurança na assistência.
Sobre as suspeitas, o Coren-SP informou que abriu sindicância para investigar o caso, mas que a apuração será feita sob sigilo.
“Após a averiguação dos fatos, se forem constatados indícios de infração ética, será instaurado um processo ético-profissional. A profissional envolvida poderá ser notificada para manifestar a sua versão do fato, garantido o direito de defesa.”
O Coren-SP explicou que caso sejam compradas as infrações, Tatiani poderá receber as seguintes penalidades conforme legislação: advertência, multa, censura, suspensão temporária do exercício profissional ou cassação do exercício profissional pelo Conselho Federal de Enfermagem.
6.Profissional foi afastada da Santa Casa?
Ao g1, a gerente administrativa da Santa Casa de Taquaritinga, Camila Bellentani Cano, informou que foi instaurada uma sindicância para apurar o caso.
Assim como o inquérito policial, que corre em segredo de Justiça, a investigação interna também é sigilosa.
O Ministério Público acompanha a investigação e recorreu da decisão da Justiça que colocou Tatiani em liberdade provisória.
“Foram apreendias duas ampolas de medicamento. Houve uma testemunha, uma diretora da Santa Casa que disse que esse medicamento é da Santa Casa e estava destinado a outros pacientes. Então isso também precisa ser investigado porque eventual desvio desse medicamento pode configurar o crime de peculato, que é o desvio de um bem público, e também precisa ser investigado se outros pacientes deixaram de receber medicação em razão do desvio da autuada”, afirma a promotora de Justiça Marília Bononi Francisco.
Créditos: G1.