Longe dos holofotes da política nacional desde que Jair Bolsonaro deixou o poder, o empresário Luciano Hang, dono das Lojas Havan, tem dedicado seu tempo e energia para tentar barrar um projeto de lei que regulamenta o grafite em Brusque (SC), sua terra natal.
Aprovado pela Câmara Municipal, o projeto de lei municipal permite que grafiteiros apresentem projetos para muros e paredes em áreas públicas. Após uma eventual aprovação da prefeitura, os artistas são autorizados a fazer os painéis.
Dono de uma fortuna estimada em R$ 16 bilhões (uma das 20 maiores do país, segundo a lista de bilionários Forbes), Hang é investigado no inquérito das milícias digitais no Supremo Tribunal Federal (STF) e foi proibido de usar as redes sociais.
Nas últimas semanas, Hang acionou diversas frentes para combater o projeto. Os vereadores, o prefeito e o vice-prefeito da cidade foram chamados para uma reunião na última quarta-feira (6) na sede administrativa da empresa.
No encontro, em que estavam presentes oito dos quinze vereadores da cidade, foi exibido um PowerPoint produzido pelas Lojas Havan que afirma que o projeto de lei “é o começo do fim da nossa cidade” e é “abrir a porta do inferno”.
Ilustrado com grafite de homens se beijando, um painel sobre Che Guevara e desenhos de pessoas negras, o PowerPoint tem montagens com prédios tradicionais de Brusque cobertos por pinturas — o que o projeto de lei não permite.
A apresentação diz ainda que Brusque tem que “voltar a ser uma cidade de tradições” e que “as lideranças de Brusque não podem aceitar” o projeto.
O prefeito, André Vechi (PL), foi chamado pessoalmente por Hang para o encontro, mas disse que não poderia ir. “Quando puder, me ligue, por favor. Vamos fazer um café hoje às 17 horas com as entidades de Brusque e vereadores, para debater projeto sobre muralismo e grafitismo. Você está convidado. Abraço, Luciano”, escreveu o empresário.
Em outra investida, Hang chamou também os representantes de associações comerciais da cidade, que tem 140 mil habitantes, para assinar uma carta pedindo que o projeto fosse vetado, considerando, entre outros itens, que “há dúvidas em relação à classificação das eventuais obras a serem contempladas”.
Vereadores e representantes do Executivo foram procurados por pessoas ligadas à Havan e por deputados federais próximos de Hang pressionando contra o projeto.
Apesar da pressão, o projeto de lei foi promulgado pela Câmara nesta segunda-feira (11). O texto já não podia ser vetado ou sancionado pela prefeitura, porque o Executivo perdeu o prazo e a proposta havia retornado para o Legislativo.
A Prefeitura de Brusque passou por uma eleição suplementar recentemente. O prefeito anterior, Ari Vequi, foi cassado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por abuso de poder econômico devido à influência das Lojas Havan na sua eleição, em 2020. No mesmo julgamento, Hang, que não é filiado a nenhum partido, também foi tornado inelegível.
O atual prefeito, André Vechi, se elegeu pelo Democracia Cristã (DC) e depois se filiou ao Partido Liberal (PL), sigla a que pertence o ex-presidente Jair Bolsonaro.
Procurada pela reportagem, a prefeitura afirmou que não tem interferência no poder Legislativo e que a proposta foi aprovada por unanimidade pelos vereadores.
O que diz Luciano Hang
O empresário disse ao UOL que é um cidadão brusquense e luta “pelo melhor para toda a população”.
“A lei só diz que é proibido apagar essas obras de ‘arte’. Brusque virará terra de ninguém. Por isso, junto das entidades, capitaneamos esse movimento para que o projeto não fosse para frente. Infelizmente, por meio de uma manobra política, a opinião popular ficou de fora da decisão.”
“As consequências dessa lei virão com o tempo. As próximas gerações, nossos filhos e netos, é quem colherão desse mal. Quem ama, cuida. Por isso, luto por essa cidade que não é minha, é nossa. Brusque é uma cidade admirada por turistas e pessoas que escolheram para viver.”