A Câmara dos Deputados recebeu nesta semana uma exposição patrocinada pelo Instituto InformaCann, Sociedade Brasileira de Estudos da Cannabis e outras entidades pró-maconha “medicinal” para mostrar os “benefícios” da “Cannabis” e os avanços comerciais da indústria do cânhamo, com o objetivo de tentar garantir uma liberação mais ampla da maconha no Brasil.
A exposição coincidiu com uma audiência pública que foi realizada na quarta-feira (29), pela Comissão de Legislação Participativa, que contou apenas com participantes favoráveis ao cultivo da droga no país. Na ocasião, eles cobraram uma regulamentação para as associações produtoras para democratizar o acesso a tratamentos com “cannabis medicinal” no Brasil.
A Gazeta do Povo conversou com alguns parlamentares da oposição que criticaram o fato de o ato financiado pelo dinheiro do contribuinte para valorizar a maconha, principalmente sob os argumentos de supostamente seria benéfica para o tratamento de algumas doenças ou até mesmo para melhorar a economia do país.
“A gente vê com muita preocupação que esse tipo de exposição seja realizado aqui na nossa Casa, sem que tenha, inclusive, o lado adverso. E as pessoas acabam sendo ludibriadas pelo discurso de que determinadas substâncias advindas da maconha poderia beneficiar as pessoas doentes, mas, na verdade, querem dizer que a maconha é algo bom para incentivar o uso recreativo. Um grande perigo para o Brasil”, declarou o deputado Paulo Fernando da Costa (Republicanos-DF).
De acordo com o deputado Dr. Jaziel Pereira (PL-CE), existe um lobby muito forte no Congresso, que tenta vender uma “falsa verdade” sobre a droga para “liberar geral”. “Querem enganar as pessoas numa falsa verdade de que esse principio ativo é bom para tudo. Mas o que existe é uma tentativa de liberação de droga para multiplicar as vendas e as ações da droga no Brasil. É apenas um pretexto para estragar a vida de muitas pessoas”, declarou.
Na avaliação do senador Eduardo Girão (Novo-CE), a exposição foi uma “manobra para abrir a indústria da maconha para tudo”. “O que eles querem é faturar e liberar o uso recreativo no país. Já foi desbaratado isso no Senado e em outras audiências públicas, de que a indústria usa a dor das pessoas”, disse Girão. Ele reforçou também que apresentou um projeto de lei que garante o fornecimento do canabidiol pelo SUS para a família cuja criança tenha epilepsia ou alguma situação necessária.
“O CBD é algo produzido em laboratório e não tem necessidade de fazer plantação de maconha [em casa]. O que eles querem é plantar maconha, porque o objetivo deles é popularizar, glamurizar, fumar, e se quisessem tratar as crianças, me ajudariam a aprovar o meu projeto”, afirmou o senador cearense.
A exposição pró-maconha ocorre em um momento em que membros do atual governo já deram sinais favoráveis para a legalização da maconha, e em que o Supremo Tribunal Federal discute a descriminalização de pequenas quantidades da droga.
Em junho, a secretária nacional de Políticas Sobre Drogas e Gestão de Ativos do Ministério da Justiça, Marta Machado, informou que o governo Lula (PT) pretende regular o plantio de maconha para substituir a importação de princípios ativos da planta para fins terapêuticos. A informação afronta a Lei de Drogas (Lei 11.343 de 2006), que proíbe o cultivo de qualquer variante da maconha em território brasileiro.
Além disso, o ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, Paulo Teixeira (PT), afirmou que é “uma contradição não permitir” o avanço da indústria de medicamentos à base de cannabis no Brasil. Teixeira apontou que é mais barato cultivar a maconha voltada para uso em tratamentos médicos no próprio país. O ministro deu a declaração em setembro, durante uma audiência da Comissão de Legislação Participativa da Câmara dos Deputados.
“Cannabis medicinal”?
Um dos informativos distribuídos na exposição aos visitantes foi produzido pelo deputado federal Luciano Ducci (PSB-RJ), relator da Comissão dos medicamentos à base de cannabis e autor de substitutivo apresentado ao PL 399/15 que libera cultivo de maconha para fins medicinais, industriais, e comerciais.
No informativo, Ducci explica o que são os canabinóides – THC e CBD – e os seus princípios ativos, defende a regulamentação para baratear o custo do medicamento que chega a custar “mais de R$ 3 mil por mês”, mas não apresenta os estudos que comprovam a eficácia para a variedade de doenças mencionadas para o uso da Cannabis – o que contradiz as evidências científicas sobre o uso medicinal da cannabis, com comprovação em casos restritos.
Vários estudos e a própria Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) já apontaram que não existem evidências científicas definitivas sobre os supostos benefícios da substância para a maioria das doenças. Há exceção nos casos citados pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), como para pacientes com crises epiléticas relacionadas às síndromes de Dravet, Doose e Lennox-Gastaut.
O deputado Osmar Terra (MDB-RS), que acompanha há anos esse debate sobre o lobby por trás da “cannabis medicinal”, citou que apenas uma molécula das 400 substâncias da maconha poderia ter efeito medicinal e ainda está em estudo. “Essa molécula já tem na farmácia, e não precisa fumar maconha ou usar óleo para isso, porque o cigarro e o óleo têm todas as outras substâncias da maconha, que podem trazer uma série de danos e doenças incuráveis. Ela não é remédio, não é nada, ela é uma droga que mais causa danos”, explica.
Para o parlamentar gaúcho, a exposição seria “ilegal”. Terra afirma que a real intenção é conseguir a liberação do cultivo da maconha para fins medicinais, o que tem ocorrido pela via judicial. “Existem ONGs que defendem o uso medicinal e que estão sendo usadas de fachada para o tráfico de drogas no Distrito Federal. Dizem que vão vender maconha medicinal, parece até que tem outra maconha, chamam de cannabis para dizer que é outra coisa, mas é tudo lobby”, denunciou.
PL 399/15 aguarda análise no Plenário
O discurso pró-maconha se intensificou no Congresso após a aprovação do PL 399 de 2015. Originalmente, a proposta tinha como objetivo somente autorizar a comercialização de medicamentos com “extratos, substratos, ou partes da planta denominada Cannabis sativa”. Contudo, um substitutivo desse PL, apresentado por Luciano Ducci, acrescentou uma série de dispositivos sobre plantio, processamento, pesquisa, transporte e comercialização da maconha no Brasil, autorizando, entre outras coisas, o cultivo domiciliar da planta.
A oposição conseguiu evitar que o texto fosse encaminhado ao Senado sem a análise do Plenário da Câmara dos Deputados. O texto agora aguarda ser inserido na ordem do dia da Câmara para a votação dos 513 deputados.
Segundo o deputado Osmar Terra, houve uma manobra feita pelo lobby da maconha com os partidos na comissão especial, para que esses tivessem mais deputados favoráveis ao projeto, por isso acabou sendo aprovado por um pequeno desempate na comissão. No entanto, ele reforçou que os deputados contrários conseguiram barrar e apresentar um requerimento de análise da proposta no plenário, na certeza de que o PL 399/15 será rejeitado pela maioria.
“Nós temos maioria hoje para não deixar passar. E já aprovamos duas vezes leis que proíbem o consumo de drogas ilícitas e vamos aprovar de novo, se precisar. É um lobby absurdo, porque é o Congresso que representa o povo brasileiro que não quer a liberação de drogas em nosso país”, disse Terra.
Créditos: Gazeta do Povo.