A advogada e empresária Fernanda Dallagnol, 40, afirma que “entrar na política” não estava nos planos até recentemente.
“Não era algo que eu tinha planejado na minha vida. Mas eu assisti o Deltan, meu marido, ser expulso do Congresso Nacional. Meu sentimento foi de revolta”, discursou ela a uma plateia de filiados do partido Novo, em novembro, em um dos salões do restaurante Madalosso, espaço tradicionalmente usado em Curitiba para eventos desse tipo.
Fernanda nasceu em Londrina, no norte do Paraná, mas morou a vida inteira na capital paranaense, onde casou aos 25 anos com o ex-procurador da República e deputado federal cassado Deltan Dallagnol.
Desde que o casal se filiou ao Novo, há cerca de dois meses, o nome dela tem sido abertamente colocado pelo marido e por correligionários como uma possibilidade para a disputa à Prefeitura de Curitiba nas eleições de 2024.
“Eu tenho a imensa honra de caminhar com a minha esposa não mais apenas no meu lar, mas agora também dentro deste time. E eu quero agradecer a você, Fernanda. Porque, independentemente de você resolver ou não se candidatar, a gente precisa de mais pessoas que façam o mesmo que você fez”, discursou Deltan, ex-coordenador da força-tarefa da Operação Lava Jato, no evento curitibano do Novo.
Ela afirma que, por enquanto, não tem pretensões eleitorais. Procurada via assessoria de imprensa do partido, não quis dar entrevista à Folha.
Em setembro, no 7º Encontro Nacional do Novo, em São Paulo, quando Deltan foi anunciado com pompa como o mais novo integrante do partido, Fernanda também foi chamada ao palco pelo marido e apresentada aos filiados.
“Se vocês acham que eu sou forte, vocês ainda não conheceram esta mulher”, disse o ex-procurador. Dias depois, no evento em Curitiba, Fernanda chegou a discursar por dez minutos.
“A única forma de dar um jeito no Brasil é colocar nos municípios, nos estados, no Congresso Nacional, mais 10, mais 20, mais 50 Deltans. Quem são esses soldados? Somos nós, sou eu, são vocês, que nunca tiveram vontade de participar da política, mas que estão dispostos a fazer o que tiver ao alcance”, disse ela.
Fernanda tem publicado vídeos da sua vida partidária em um perfil no Instagram, recentemente criado. Lá, também mostra fotos dos três filhos.
Desde o final de setembro, Fernanda também é uma das alunas do curso do movimento de renovação política RenovaBR, que mira temas como políticas públicas, comunicação política, organização de campanha e governança.
Já Deltan assumiu na mesma época o cargo de “embaixador nacional do Novo”, e, em caravana por estados brasileiros, tenta atrair novos filiados. Ele recebe da legenda um salário de R$ 41,6 mil, a mesma remuneração de um deputado federal, cargo que ele perdeu há cerca de seis meses.
Embora jogue o nome de Fernanda no cenário pré-eleitoral, Deltan também se coloca como um possível candidato em 2024, apesar da cassação do seu mandato.
Em maio, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) decidiu que, de acordo com a Lei da Ficha Limpa, ele estava inelegível por oito anos quando se inscreveu em 2022 na disputa que o colocou na Câmara. De todo modo, avaliam aliados, se optar por se inscrever em uma nova eleição, o registro precisará novamente ser analisado pela Justiça Eleitoral.
Ele foi o mais votado da bancada do Paraná no ano passado, quando estava filiado ao Podemos.
Até a chegada do casal, o nome mais forte do Novo para a disputa à Prefeitura de Curitiba era o da vereadora Indiara Barbosa, campeã de votos para a Câmara Municipal no pleito de 2020.
À Folha a vereadora diz que não há nada definido ainda. Ela mantém seu nome como uma opção do partido, mas também dá boas-vindas ao casal.
Segundo ela, o partido está acostumado a receber gente de fora do universo político tradicional e menciona a formação acadêmica da Fernanda, ao defender que se trata de um bom quadro para a sigla.
A mulher do ex-deputado é apresentada pela legenda como advogada e empresária com atuação no ramo de softwares, formada em direito pela PUC do Paraná e com mestrado em administração pela Universidade Harvard.
No encontro com os correligionários em Curitiba, Fernanda falou principalmente de Deltan, da Operação Lava Jato e de sua fé –o casal frequenta a Igreja Batista do Bacacheri.
“A operação foi mais longe do que qualquer um poderia imaginar, e isso gerou uma reação do mesmo tamanho. Na nossa família, a gente não tinha medo, por duas razões: primeiro, a nossa força está em Deus. A gente crê num Deus que não perde o controle, que qualquer coisa que aconteça na nossa vida não é capaz de nos tirar do plano que Deus tem para nós”, afirmou.
Também disse: “E, em segundo lugar, porque a gente sempre se sentiu muito apoiado pelas pessoas por onde a gente passava”, continuou.
Em 2019, durante o escândalo que ficou conhecido como Vaza Jato, quando vieram à tona mensagens privadas trocadas entre autoridades da Lava Jato, o nome da Fernanda também acabou aparecendo nos diálogos.
Reportagem da Folha e do site The Intercept Brasil mostrou que, em mensagens trocadas no final de 2018, o então procurador Deltan e um colega de Ministério Público, Roberson Pozzobon, cogitavam criar uma empresa para organizar palestras e aproveitar a repercussão da Lava Jato para ter lucro no negócio.
Mas, para evitar críticas e questionamentos legais, as respectivas esposas apareceriam como as sócias formais.
Na época, Deltan afirmou à reportagem que realizava palestras para promover a cidadania e o combate à corrupção e que era um trabalho compatível com a atuação no Ministério Público.
Também disse que a maior parte delas seria gratuita e, quando remuneradas, declaradas em Imposto de Renda. Acrescentou que haveria doação de parte dos valores para fins beneficentes.
Deltan e Pozzobon também disseram que não abriram empresa em nome deles ou de suas esposas e declararam que não reconheciam “as mensagens que têm sido atribuídas a eles” e que o “material é oriundo de crime cibernético e não pôde ter seu contexto e veracidade comprovado”.
Procurada pela Folha, Fernanda não quis comentar o episódio.
Créditos: Folha de S. Paulo.